sábado, 4 de maio de 2013

USP tem só 4 negros nos dez cursos mais disputados

folha de são paulo

Dentre 774 matriculados em carreiras mais concorridas, só 0,5% diz ser preta
Dados explicitam a discrepância de perfil entre estudantes e população paulista, que tem 5,5% de pretos
JAIRO MARQUESDE SÃO PAULOApenas quatro alunos se declaram pretos entre os 774 matriculados nos dez cursos mais concorridos da USP (Universidade de São Paulo) do vestibular de 2012.
Para as três carreiras mais disputadas (medicina, engenharia civil de São Carlos e publicidade e propaganda) nenhum matriculado se define dessa maneira no questionário aplicado pela Fuvest.
Os dados explicitam a discrepância de perfil entre os candidatos que vão estudar na principal universidade pública do país e os habitantes.
Se nos dez cursos mais concorridos da USP os que se declararam pretos se limitam a 0,5% do total de matriculados, na população paulista esse índice atinge 5,5%.
Pelo Censo 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), outros 63,9% dos paulistas se dizem brancos, 29,1% pardos, 1,4% amarelos e 0,1% indígenas.
O número de pretos matriculados nas carreiras mais concorridas da USP recuou em relação ao vestibular de 2011, quando dez pessoas que se declararam pretas fizeram matrículas nos dez cursos.
Naquele concurso, cinco pessoas que se inscreveram como pretas estavam nos três cursos mais concorridos.
No questionário respondido pelos alunos, a USP usa a palavra preto, conforme classificação usada pelo IBGE.
Pelos dados é possível constatar que menos de um terço dos cursos da USP terá estudantes declaradamente pretos. Em geral, estão em cursos com baixa concorrência.
O curso com a maior quantidade absoluta de negros é o de licenciatura em matemática/física, com 17 pessoas. As carreiras de exatas, porém, são as que têm a menor proporção do grupo: 1,9%.
A USP hoje dá bônus no vestibular para estudantes de escolas públicas, mas não existe um benefício específico para pretos, pardos ou indígenas. Uma ampliação da política está em estudo.
David Raimundo dos Santos, diretor-executivo da ONG Educafro, afirma que há planos de ocupar a reitoria da universidade se não houver alterações no quadro para aumentar a inclusão de pretos.
"Vamos dar à USP a última chance de ela levar a sério o pobre e o negro. Ela tem de pôr em prática o projeto para que todos os cursos, em todos os turnos, tenham, em três anos, 50% de alunos da rede pública, com renda per capita familiar de um salário mínimo e meio e cotas para pretos, pardos e indígenas."
O perfil dos calouros da USP aponta também que a maioria estudou em escolas particulares.

    ANÁLISE
    Sob pressão, USP debate acesso a aluno da rede pública
    Faculdades divergem sobre o impacto das medidas na qualidade do ensino
    FÁBIO TAKAHASHIDE SÃO PAULOOs dados recém-divulgados do vestibular da USP pressionam a universidade a intensificar suas políticas de acesso a estudantes formados em escolas públicas.
    Atualmente, uma da principais ações é a concessão de bônus de até 15% na nota desses alunos na Fuvest.
    A própria reitoria reconhece que alterações são necessárias. Mas a intensidade das mudanças dependerá do embate de forças internas.
    A pressão começou há mais de uma década. Movimentos sociais apontavam que a USP era elitista, por ter menos de 30% de alunos de escolas públicas entre seus calouros, sendo que 85% do ensino médio era público.
    Parte dos acadêmicos começou a ficar convencida de que dar oportunidade a aluno desfavorecido poderia, além de representar justiça social, melhorar a qualidade do corpo discente, pois os beneficiados teriam mais motivação no curso.
    Por outro lado, surgiu o temor de que mudar o perfil do alunato da instituição poderia prejudicar a qualidade da universidade --considerada em diversos rankings a melhor da América Latina.
    Em 2006, a universidade implementou a bonificação no vestibular, que conseguiu reverter a queda no número de alunos de escolas públicas entre os aprovados. A proporção, porém, agora ficou estagnada na casa de 28%. E em 2013 nenhum negro entrou em cursos como medicina.
    A pressão cresceu ano passado, quando o Congresso aprovou lei que determina que as universidades federais destinem 50% de suas vagas a alunos da rede pública, com cota especial para pretos, pardos e indígenas.
    Em resposta, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) e os reitores de USP, Unesp e Unicamp desenharam proposta que estabelece meta de ter, até 2016, 50% de alunos de escolas públicas, sendo 35% deles pretos, pardos e indígenas --em cada curso.
    A proposta, porém, precisa ser aprovada internamente nas universidades. As primeiras avaliações das faculdades da USP foram contrárias, com argumentos diversos e, em alguns casos, opostos.
    A FFLCH (área de humanas) entende que a proposta é tímida. Avalia que poderiam ser instituídas cotas, não metas. Já a direção da Faculdade de Medicina entende que a proposta pode prejudicar a qualidade dos cursos.
    Na semana passada, a pró-reitoria de graduação afirmou que estuda a ampliação da bonificação no vestibular, sem necessariamente vinculá-la à obrigação de alcançar a meta de 50%. Todas essas forças deverão entrar em acordo até junho, quando a Fuvest precisa fechar o edital para o próximo vestibular.

      Nenhum comentário:

      Postar um comentário