segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

As grandes cidades e a pobreza das favelas - ALDO PAVIANI

Correio Braziliense - 06/01/2014

Há muitos parâmetros para avaliarmos o grau de desigualdade social em determinado contexto geográfico, mormente nas metrópoles. As grandes cidades são hospedeiras de massas de empobrecidos, no Brasil e nos países emergentes. As favelas possuem velocidade de espacialização muito superior à capacidade de os governantes tomarem providências para minorar as condições adversas desses fragmentos desprotegidos das grandes cidades, por isso são o território dos desvalidos.

Existem notórias e decantadas favelas no Rio, em São Paulo, Salvador e Brasília. No caso do Rio de Janeiro, são referidas Rocinha, Santa Marta, Morro do Alemão e tantas outras. No caso de São Paulo, a favela marginal do Tietê; em Salvador os arredores da Baía de Todos os Santos; em Brasília, as geminadas favelas do Sol Nascente/Pôr do Sol, o Varjão, a Estrutural (as duas últimas elevadas à condição de Regiões Administrativas).

O que esses conjuntos pobres têm em comum? Em todas: habitações “subnormais”, ruas estreitas, becos, falta de esgotamento sanitário, coleta de lixo, de locais de trabalho na proporção dos habitantes. Há carências múltiplas e complexidade social e ambiental. Por isso, as favelas apresentam a crueza da vida nas “comunidades” mesmo sendo objeto de intervenções “pacificadoras”. Com isso, as crianças podem ir à escola, e as pessoas circulam pelo comércio local, deslocam-se para o trabalho, pois a vida continua.

Na questão ambiental, há enorme passivo, pois as favelas estão enquistadas em morros, sujeitas a riscos ecológicos. A cada ano, ocorrem deslizamentos com mortes, destruição de moradias e seus pertences, levados pelas chuvas torrenciais. Nesses episódios, a natureza agredida mostra a fúria devastadora. E as providências tardam, para desgosto dos favelados. Por todas essas agruras, as favelas deixaram de ter o glamour de 60 anos atrás, como na poética, melodiosa e memorável Chão de estrelas, de Sílvio Caldas.

No caso das favelas de Brasília, a matéria publicada na Carta Capital, edição de 18/12/13, com a manchete “Favela federal”, a respeito do Sol Nascente, merece complementação. Indica-se que, em revista semanal, a pressa deveria ser menor para que o jornalista fosse às fontes e apresentasse cobertura mais próxima da realidade. A respeito da matéria, o texto se fixa na observação factual da favela em questão. Descreve, em pormenor, aspectos da ruas sem asfalto, capta algumas imagens e os depoimentos de moradores.

Com mais cuidado, a busca por estatísticas recentes revelaria também dados positivos, o que agrada aos moradores e o que mudou para melhor. Sabe-se que a favela é lugar de carências e dificuldades, que exige maior presença do poder público, com a atuação mais constante do Estado, pelo ente executivo, no caso, o Governo do Distrito Federal. Há medidas em curso para superar, mesmo em parte, as premências acumuladas em mais de dezena de anos. Registre-se que está em curso a regularização fundiária, implantação da rede de esgoto e asfaltamento de ruas. Mas, sobretudo, ações para reduzir a pobreza.

Por fim, anote-se que a favela Pôr do Sol/Sol Nascente, anexada à Região Administrativa de Ceilândia, foi objeto de levantamento da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), com a Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (Pdad/2013). Nessa enquete, a estimativa aponta que ambas possuem 78.912 habitantes (15,8% a mais que em 2011) e que há, apenas, 2,25% de analfabetos (abaixo da média – 2,56% – das cidades-satélites); 1,79% da população possui curso superior; apenas 0,11% das crianças de 6 a 14 anos não foram alfabetizadas.

No Pôr do Sol/Sol Nascente, há múltiplas dificuldades em razão da rápida ocupação de terras antes devotadas à agricultura por sitiantes. Mas, ao lado das carências, há dados que amenizam a vida dos moradores, como: em 98,59% das moradias, há abastecimento de água. O esgoto está por ser implantado, pois apenas 6,10% dos domicílios estão ligados à rede geral. A coleta de lixo é feita em 55,85% das moradias, mas avançou em relação a 2011, quando apenas havia coleta em 13,39%.

A Pdad indica que a renda domiciliar média mensal equivale à de outros núcleos pobres, o Varjão, com 2,70 salários mínimos e a Fercal, com 3,09 SM. Sabe-se que a renda da maior cidade do DF (Ceilândia) é de apenas 3,70 SM. Em resumo, há núcleos empobrecidos, fruto de décadas de descaso com a distribuição de renda — tarefa do setor público e do empresariado, no DF. Mas o problema é do Brasil, não apenas de Brasília, isto é, tarefa mais ampla, de todos nós.

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