quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Capas de disco ganham status de obra de arte no livro Onda infinita‏

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Capas de disco ganham status de obra de arte no livro Onda infinita, que reúne projetos gráficos de CDs lançados pela gravadora Dubas. Identidade visual e música se completam 
 
Ana Clara Brant
Estado de Minas: 01/01/2014


 Ronaldo Bastos é quem imprime visão de bom gosto pela criação gráfica. Os CDs de sua gravadora, a Dubas Música, são prova disso.  (Dubas/Divulgação)
Ronaldo Bastos é quem imprime visão de bom gosto pela criação gráfica. Os CDs de sua gravadora, a Dubas Música, são prova disso.

Ronaldo Bastos é um dos principais letristas do país. Compositor do Clube da Esquina, ele sabe fazer música tão bem quanto capa de disco, apesar de não ser fotógrafo ou designer. Ao longo de sua trajetória, ele conviveu com talentos dessas áreas: Cafi, Kélio Rodrigues, Noguchi e Rico Lins, entre outros. Todos apuraram a visão e o gosto de Ronaldo pela criação gráfica. Os CDs de sua gravadora, a Dubas Música, são prova disso.

Um apanhado dessa produção pode ser conferido em Onda infinita (Editora Zahar). Além de reproduzir o material iconográfico de cerca de 70 CDs – capas, contracapas, encartes, ilustrações, fotografias –, o livro celebra os 10 anos de parceria entre a Dubas e a casa de criação e design 6D.

“Esse trabalho é o resultado do encontro feliz entre um cara que sempre gostou de fazer capas de disco, que sou eu, o Beto Martins, designer talentosíssimo, Leonel Pereda, produtor recém-chegado ao Brasil e encantado pelo que viu e ouviu, e Marcela Boechat, uma grande facilitadora de todos os processos”, conta Ronaldo.

Em 2001, foram lançados dois dos principais títulos do catálogo da Dubas: Juventude/ Slow motion bossa nova e Bossa nova lounge/ Look to the sky. “Muito bem-sucedidos, eles influenciaram a indústria fonográfica brasileira, de artistas a produtores e executivos. Esses discos traziam, além da música de qualidade indiscutível, forte identidade visual que contribuiu decisivamente para estabelecer uma nova linguagem. De lá para cá, foram muitas capas em parceria entre a Dubas e a 6D”, explica o compositor.

Chama a atenção o formato de Onda infinita, semelhante a um vinil de 10 polegadas. Beto Martins, sócio da 6D, conta que a transposição do material para as páginas o surpreendeu: “A gente não sabia como as capas iriam reagir, se perderiam algum detalhe. Mas elas se adaptaram superbem, como se tivessem sido desenhadas para aquele tamanho”.

De cerca de 120 discos, foram escolhidos 70, gravados por artistas como Sylvinha Telles, Jorge Ben Jor, Caetano Veloso, Torquato Neto, Fernando Brant, Celso Fonseca, Alaíde Costa e Gilberto Gil, entre outros. Ronaldo Bastos classifica a seleção como feliz e importante, lembrando que capas de LPs antológicos tiveram de ser reformuladas para o formato CD. O repertório desses álbuns traz de bossa nova e samba jazz a MPB e Clube da Esquina.

“Capa de disco pode ser obra de arte. Nem todas o são. A produção industrial não impede o objeto de ser apreciado dessa forma. Assim como gravuras fazem parte de séries numeradas, o CD ou o vinil têm tiragem limitada, com valor artístico para além dos critérios de produção”, acredita Ronaldo. “A diferença entre um Picasso e um grande disco é que um custa US$ 10 milhões e o outro US$ 10”, compara o dono da Dubas.

O multicolorido Onda infinita conta com textos dos jornalistas Arthur Dapieve e Antonio Carlos Miguel e do designer Rico Lins. A edição traz também CD comemorativo com gravações importantes para a MPB. Beto Martins, que enveredou pelo design sob a influência da música – é neto de compositor e filho de jornalista especializado no tema –, lembra que o livro foi produzido em tempo recorde. A ideia, adianta ele, é dar prosseguimento ao projeto.

“Com certeza, a gente quer desdobrar a marca Onda infinita em outros produtos – um novo livro ou disco, não sabemos ainda. Encontramos um caminho legal. E as pessoas reconhecem a importância desse projeto”, conclui Lins.


TRÊS PERGUNTAS PARA...
. Ronaldo Bastos
. compositor e produtor

Por que o título Onda infinita?
Sempre disse, quando perguntado, que a linha da Dubas era a linha do horizonte. Mas que isso seja bem entendido: o diferencial da Dubas é a direção artística. A gente lançou e lança artistas de estilos diversos, mas com uma visão estética que faz com que todos ocupem harmoniosamente o mesmo ambiente. Quando começou o processo, as primeiras ideias eram frases relativas à relação entre ouvir e ver, mas falar algo como “sons para ouvir” ou “cores para ver” parecia ideia banal. Onda infinita se contrapõe a toda essa propaganda do fim das coisas: o fim do CD, o fim da música, o fim dos direitos, etc. Isso é pouco inteligente. A gente pode viver num mundo em que vários suportes coexistem e os direitos de todos são respeitados. Isso é ser moderno.

Qual é o segredo de uma capa de disco? Há casos em que a embalagem supera a música que está lá dentro?
Se a capa for melhor do que o disco, nem a capa é boa nem o disco é bom. O segredo é a alma do negócio... A capa precisa sugar o olho e o coração da pessoa, além de sugerir mistérios por trás daquela imagem. A boa capa faz você querer ter aquilo imediatamente, pois sabe que não vai se decepcionar.

Os vinis estão de volta. Eles vão segurar a onda da indústria fonográfica no Brasil?
Acho ótimo. O LP nunca deveria ter saído de cena. Há lugar para quase tudo neste mundo. O vinil é um formato importante para a música, não se trata de simples saudosismo ou do fato de contar com proporções que facilitam o deleite visual, o que também acho importante. O som do vinil talvez não seja “perfeito” como o formato digital, mas é mais quente. Emociona – e isso conta muito na música. Quanto a segurar a onda da indústria fonográfica, minha contribuição é muito trabalho para sintonizar a onda infinita.

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