sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Carlos Herculano Lopes - Os três baobás‏

Os três baobás 

"Fiquei sabendo que se trata de espécie nativa da África, onde é sagrada para algumas tribos" 
 
Carlos Herculano Lopes
Estado de Minas: 17/01/2014


Foi em Cataguases, na Zona da Mata mineira, há coisa de cinco anos, durante uma feira literária, que voltei a me encontrar com o poeta brasiliense Nicolas Behr. Conhecia-o desde o fim da década de 1970, quando nós mesmos fazíamos e vendíamos os nossos livros na rua. Iogurte com farinha, de sua autoria, se tornou um dos clássicos da chamada literatura marginal. Participavam também do evento em Cataguases, entre outros, os escritores Marcelino Freire, Alexei Bueno, Joaquim Branco e Ronaldo Werneck. Foi uma festa de celebração às letras e à amizade, como deve ser.

Num dos três dias em que durou aquele encontro, estávamos em um bar tomando chope, à tarde, quando de repente o assunto, sabe-se lá por que, voltou-se para fauna e flora. Além de excelente poeta, que como nenhum outro sabe falar sobre as belezas e mazelas da capital federal, Nicolas Behr também é especialista em plantas. Tanto que, lá em Brasília, já há um bom tempo, é dono de uma floricultura.

Em algum momento da conversa, já não consigo me lembrar qual, Nicolas me disse: “Vou te dar uma muda de baobá, para você plantar na sua fazenda”. “Baobá? Aquela árvore de O pequeno príncipe?”, perguntei ingenuamente, ao que ele, que tantas vezes já devia ter ouvido essa cantilena, apenas sorriu. No dia seguinte, pela manhã, nos despedimos e não se falou mais no assunto.

Há uns três meses, quando estava aqui na redação do Estado de Minas, de repente, para minha surpresa, recebo um telefonema do amigo: “Vou a Belo Horizonte semana que vem ministrar uma oficina de literatura e levarei sua muda de baobá. Você vai estar aí?”, quis saber o poeta.

Qual não foi minha surpresa quando, ao reencontrá-lo, Nicolas trazia, dentro de uma sacola de pano, umedecidas com folhas de jornais e húmus, não uma, mas três mudas da planta. Como havia pesquisado, fiquei sabendo que se trata de espécie nativa da África, onde é sagrada para algumas tribos. Aqui no Brasil, arrisco-me a dizer, seria prima-irmã da paineira e do embiruçu, tão comuns nestas terras.

No caso dos baobás, como a pesquisa também me ensinou, eles chegam a viver 4 mil anos e ficam tão grossos que, em alguns casos, as pessoas fazem casas dentro dos seus troncos ou os carros passam através deles. É impressionante.

Nem Nicolas Behr nem este modesto cronista iremos durar o suficiente para ver alguém morando dentro de algum dos três baobás que, há pouco mais de dois meses, foram plantados por mim na Chácara São Joaquim, em Coluna, onde voltei na semana passada. Dá gosto ver como as mudas estão bonitas e crescendo.

Ao dar a notícia ao amigo, que fora suas andanças pelo Brasil falando de seus livros continua com a floricultura em Brasília, recebo a seguinte carta: “Se existe vida após a morte? Existe sim... os baobás que plantamos, somos nós, mais vivos do que nunca... Tenho certeza de que os seus estão felizes, pois agora suas raízes podem explorar até o fim do mundo... Saíram da prisão do saquinho e ganharam a terra”. 

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