Maria Amélia Bracks Duarte
Procuradora do Trabalho em Minas Gerais
Estado de MInas: 04/09/2014
Precisamos resgatar a
 dimensão afetiva da família. As cenas chocantes  gravadas pelo próprio 
pai do menino Bernardo, morto no Rio Grande do Sul  por uma injeção 
letal aplicada pela madrasta, demonstram, no mínimo, a  ausência de 
afeto que deveria permear as relações familiares e a  desestrutura do 
núcleo familiar. As gravações revelam requintes de  crueldade e 
humilhação impostos à criança, com palavras, atos e  omissões. Se, 
ancestralmente, o pai era o respeitado e autoritário  provedor, que, com
 um estalar de dedos ou com um olhar severo, mantinha a  família num 
regramento de valores estabelecidos e cumpridos, hoje, o  esgarçamento 
da hierarquia e a liberdade incondicional entre pais e  filhos levou a 
um abandono decorrente do individualismo, da culpa e da  total ausência 
de limites: permissividade sob o manto da desproteção.  Embora o pai 
seja mais próximo, mais lúdico, menos prepotente, a vida é  mais 
confortável, mas, na maioria dos lares, muito mais triste. Os  exemplos 
de agressividade no âmbito familiar são inacreditáveis: a mãe,  em 
Ibirité, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, joga o filho bebê  
na parede e esconde o corpinho morto num forro de sofá, alegando que a  
criança mexera no seu celular. Filhos são abandonados em latas de lixo, 
 vendidos na internet, esquecidos no carro fechado até a morte, enquanto
  os seus responsáveis dançam no baile funk; padrastos engravidam suas  
enteadas sob os olhos complascentes das mães. Vê-se um exacerbado  
consumismo, acumulação de bens materiais vendidos em luzes de  
propaganda, e faltam alma, solidariedade e amor nas relações  
interpessoais. Misericórdia, talvez. A violência também se manifesta no 
 assédio moral no trabalho, no bullying das escolas, no desrespeito às  
pessoas mais velhas e nos diferentes de cor, de peso, de situação  
social, de opção sexual; a violência grita com ódio nas injúrias  
raciais, como a ocorrida recentemente por torcedores do Grêmio contra o 
 goleiro Aranha, do clube santista; a violência é cruel na homofobia, na
  difamação no anonimato das redes sociais, na hostilidade de alunos  
contra professores em salas de aula, na morte de policiais e repórteres,
  nas caras escondidas dos black blocs. A notícia de que um pai impediu a
  sanha do filho atirando bombas em passeatas e usando o vandalismo na  
destruição de bens particulares e da sociedade surpreendeu as pessoas,  
como se o pátrio poder já não mais existisse. 
São demais os perigos desta vida, dizia Vinicius de Moraes; nenhum bandido nos roubará a chama renovada de um beijo e ninguém vai levar a nossa alegria ao fundo dos porões, canta Tadeu Franco. Para isso, no entanto, o enfrentamento, a repressão e a punição severa da Justiça devem ser a resposta para os desvarios que mantém a violência em todas as suas formas. No filme Nossa Senhora dos assassinos, sobre o pânico ocasionado por traficantes, há uma frase simbólica escrita numa placa fincada num lote de terreno e que nos serve de metáfora: aqui é proibido jogar cadáveres. Ou, citando os músicos da banda Paralamas do Sucesso: “No beco escuro explode a violência; no meio da madrugada, com amor, ódio, urgência. Ou como se não fosse nada”.
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