sábado, 3 de novembro de 2012

CIÊNCIA » Na tripulação, água, madeira e bolinhas de tênis - Paula Carolina‏

Competição de aerodesign entre estudantes de cursos ligados à mobilidade vai até amanhã. Mudança no regulamento exigiu adaptações nos aeromodelos 


Paula Carolina
ESTADO DE MINAS : 03/11/2012 

Uma importante mudança no regulamento, que altera o tipo de carga a ser transportada, modificou bastante a construção das aeronaves projetadas por estudantes de engenharia e outros cursos ligados à mobilidade para a Competição SAE Brasil Aerodesign, a ser realizada em sua 14ª edição, de quinta a domingo, no Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), em São José dos Campos (SP). A disputa é realizada com aeromodelos, enquadrados em três categorias: regular, micro e avançada. Até a edição passada, todos deveriam transportar barras de chumbo ou aço. Este ano, aeromodelos da categoria regular deverão carregar madeira; aviões da classe micro, bolinhas de tênis; e aeronaves da avançada, água. 
A mudança influi diretamente no tamanho e no tipo do compartimento de carga e consequentemente em diversos outros aspectos do projeto da aeronave, já que em todos os casos o material a ser transportado é mais leve e, como levantar o maior peso possível influencia na pontuação seria preciso aumentar o compartimento para manter uma possibilidade de peso equivalente ao carregado em outros anos. Com isso, os estudantes tiveram que pensar e estudar mais para chegar, entre outros aspectos, à melhor relação entre o peso da carga a ser transportada e o tamanho do aeromodelo, que também não pode pesar muito, o que implica a escolha dos materiais a serem empregados. 
“O chumbo ou o metal, em geral, fazem pouco volume; enquanto o volume da madeira é maior. Com isso, nossa fuselagem ficou muito grande. Tivemos que estudar muito a configuração para caber cerca de 14 quilos de madeira. E consequentemente, precisamos de um motor com mais força para reduzir o arrasto”, explica o estudante do oitavo período de engenharia aeroespacial da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Bruno Arruda Alves, capitão da equipe Uai Sô Fly, atualmente campeã nacional e mundial na classe regular. “A fuselagem ficou maior e o avião, mais alto. Foi a melhor solução que encontramos”, afirma, contando que, apesar disso, o uso de fibra de carbono na fuselagem e de kevlar (material que absorve impacto usado, por exemplo, em coletes à prova de bala) no trem de pouso reduziu em 2.250 quilos o peso da aeronave em relação ao projeto anterior. 
"A mudança da carga influencia bastante no volume do compartimento, o que faz ter que mudar o corpo do avião. Consequentemente é preciso mexer nas asas e mudar a as empenagens. Ou seja, há influência em todo o avião", completa o estudante do 7º período de engenharia mecânica da Universidade de Brasília (UnB) Ian Brasil Reis, capitão da equipe Draco Volan, também da classe regular. Para manter o peso imaginado para a aeronave, a solução foi também investir em materiais leves, no caso o divinycell (espuma de PVC). 
BUSCA POR MATERIAIS A pesquisa de uma madeira de densidade maior (para aumentar o peso a ser carregado) foi um dos pontos de partida do estudo da equipe AeroFEG, da Universidade Estadual de São Paulo, em Guaratinguetá, atual vice-campeã nacional e terceiro lugar no último mundial na classe regular. “Procuramos um material de densidade mais ou menos próxima da do material que usamos no ano passado e conseguimos encontrar uma madeira com densidade mais elevada”, conta o estudante do sexto ano de engenharia mecânica Thiago Barbetta, capitão, projetista e piloto da equipe. Graças ao uso de muita fibra de carbono e honey comb, especialmente na fuselagem, o avião acabou ficando mais leve do que o usado em 2011. 
“A cada ano, o regulamento aperta com relação às dificuldades para levantar um maior peso. Isso inclusive força o desenvolvimento de um projeto novo. Este ano, acredito que os projetos tenderão a privilegiar a eficiência estrutural, que é a relação do peso carregado, por exemplo, 10 quilos; pelo peso vazio, dois quilos. Ou seja, nesse caso o avião estaria carregando cinco vezes o próprio peso. Quanto mais eficiente for, mais pontos se ganham. E é nisso que estamos apostando este ano”, resume. 
Buscar uma maior eficiência estrutural foi também uma das prioridades da equipe EESC USP Bravo, da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo. Para reduzir o peso do avião, a equipe investiu em materiais leves como honey comb, fibra de carbono e madeira balsa e, em contrapartida, buscou uma madeira de maior densidade. A equipe inova no próprio formato do aeromodelo. “Algumas informações ainda são confidenciais, mas posso dizer que não é um avião convencional. Não é o que estamos acostumados a ver. Não tem todas as partes que um avião tem. Nossa maior mudança foi na concepção”, afirma, fazendo suspense, o estudante do 1º ano de engenharia aeronáutica João Paulo Costa Antunes de Macedo, capitão da equipe. De maneira geral, na categoria regular, os aviões pesam entre dois e três quilos, e o atual recorde mundial de carga levantada são 17 quilos. 

Equilíbrio da ‘carga’ interfere na estabilidade

Apesar de ser a classe regular a com maior número de inscritos, é a avançada, em que os aviões são maiores (pesam mais ou menos o dobro dos da classe regular, levando até 30 quilos de carga), que tem maior proximidade com projetos de verdadeiras aeronaves. Por isso o regulamento é mais exigente e os projetos mais complexos. Este ano, o desafio de transportar água aumentou a complexidade. “Nossa maior dificuldade foi vedar o compartimento de carga, pois qualquer vazamento desclassifica o voo. Não vou dizer como, mas nós conseguimos”, garante o estudante do 7º período de engenharia de controle e automação da PUC Rio Lucas Maciel Monteiro, capitão da equipe Aerorio Advanced, que também compete na categoria micro. Outro ponto importante foi driblar o efeito slosh (água se movimentando em espaços vazios do compartimento), o que faz variar o centro de gravidade, comprometendo a estabilidade do avião. A solução foi fazer subdivisões no compartimento de carga, todas preenchidas por completo. 
De um extremo ao outro, a equipe criou um subgrupo, composto apenas por estudantes iniciantes no aerodesign, para competir na categoria micro, classe em que o avião é ultraleve, pesando em torno de 500 gramas. Os materiais usados foram fibra de carbono, dininycell de alta densidade (como o usado em veleiros de competição), compósitos de carbono, madeira compensada, laminados com fibra de carbono, madeira balsa, varetas de carbono e varetas de tubos de fenolite (espécie de papelão prensado). O objetivo é conseguir carregar 17 bolinhas de tênis, pesando 58 gramas cada, ou seja, pouco menos de 1 quilo cada uma (986 gramas) no total. "A ideia foi otimizar a aeronave para obter a melhor pontuação, pois quanto maior fosse, mais bolinhas poderíamos carregar, e consequentemente, fazer mais pontos. Só que essas bolinhas não podem ser amarradas e precisam caber em uma caixa trapezoidal e, quanto menor a caixa, mais pontos. Então fizemos uma otimização, ponderando os dois aspectos", acrescenta Lucas.
COM A MÃO Outra exigência para a categoria micro é que a aeronave não pode decolar do solo, mas tem que ser arremessada com a mão. Mudança que, para a estudante do 6º período de engenharia mecânica da Universidade Federal de Uberlândia Lara Cristina Sousa Lopes, capitã da equipe Tucano Micro, apesar de gerar alterações no projeto, não deve comprometer o voo. "O arremessador tem que se adaptar, segurar bem e ter um bom controle para o lançamento. Mas não foi tão difícil para nossa equipe. A Tucano Micro, que em 2010 ganhou menção honrosa pelo recorde de levantamento de carga, com 1.760 quilos, chega na prova almejando o pódio. 

Aerodesign

A competição é organizada pela Sociedade de Engenheiros da Mobilidade (SAE) e realizada todos os anos em âmbito nacional e internacional. A prova nacional, em São José dos Campos (SP), dura quatro dias, com avaliação de projeto e competição de voo. As duas equipes melhor classificadas na categoria regular e a campeã das classes micro e avançada ganham o direito de representar o Brasil na SAE Aerodesign East Competition, competição mundial, realizada nos EUA. Para esta etapa nacional estão inscritas 92 equipes brasileiras. 
Mas há abertura para estrangeiras, havendo seis vindas do Canadá, EUA, México e Venezuela.

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