domingo, 25 de novembro de 2012

Editoriais


Decadência na Argentina
A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, caminha a passo rápido para indispor-se com boa parte da população, que sente na pele a deterioração da economia.
Inflação fora de controle, contas públicas em desarranjo e estagnação econômica, após uma década de crescimento acelerado, cobram o preço do intervencionismo do governo na vida dos cidadãos e das empresas.
A aprovação da presidente caiu de 67%, em setembro de 2011, para 37%; 62% dos argentinos desaprovam a política econômica.
Com a falta de recursos, os sindicatos -tradicionais redutos do peronismo e sempre cooptados para defender agressivamente os interesses da Presidência- levaram seu descontentamento às ruas. A greve geral que tomou as principais cidades na quarta-feira foi obra desses sindicalistas dissidentes.
A perda de espaço político também contribuiu para fomentar oposição sindical. A presidente se esteia hoje quase que exclusivamente na juventude peronista do grupo La Cámpora, que tem seu filho Máximo como protagonista.
No dia da greve, a decisão de um tribunal americano de exigir que o país pague US$ 1,3 bilhão a credores que não aderiram à última renegociação da dívida externa, em 2010, trouxe um novo revés, recebido pelo governo como um insulto. Segundo o ministro da Economia, Hernán Lorenzino, só falta o juiz mobilizar a Quinta Frota dos EUA para cobrar a dívida.
A decisão, da qual ainda cabe recurso, contraria a tese de que um Estado soberano é imune a credores e não pode sofrer arresto de bens. Além da questão doutrinária, há problemas práticos envolvidos.
Se a decisão for confirmada, abre-se um precedente perigoso. Na maioria dos casos, o não pagamento de dívidas públicas decorre mais de incapacidade financeira do Estado que de falta de vontade. A renegociação da dívida grega, por exemplo, seria impossível sob ameaça de processos judiciais.
Cristina Kirchner tem respondido à perda de apoio com mais radicalização, reação típica do governante populista quando suas políticas dão num beco sem saída. Faltando três anos para terminar seu segundo mandato, a popularidade em queda vertiginosa é um alerta que a presidente argentina não deveria ignorar.
    Poderes independentes

Deputados condenados pelo mensalão não podem preservar mandatos, mas decisão de cassação deve ser da Câmara, não do Supremo
Aguerrido relator do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa, agora presidente do Supremo Tribunal Federal, precisará guiar a corte com grande destreza para evitar um indesejável atrito entre o Legislativo e o Judiciário nos últimos passos da ação penal 470.
A polêmica já está em curso. Trata-se de saber se o STF determinará a perda de mandato dos deputados condenados no julgamento do mensalão ou se os ministros reconhecerão que essa decisão é de competência da própria Câmara.
O debate resulta do aparente conflito entre dois dispositivos da Constituição. O artigo 15 prescreve a perda dos direitos políticos como decorrência da condenação criminal transitada em julgado. O artigo 55, no entanto, especifica que a cassação de mandato de deputado ou senador condenado será decidida pela respectiva Casa.
Em outros termos, o que os ministros do STF precisarão dizer é se a perda do mandato dos deputados condenados será automática ou se eles deverão ser cassados por seus pares na Câmara. Estão nessa situação João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT), além de José Genoino (PT-SP), que poderá assumir uma cadeira em janeiro.
À primeira vista, a proteção dada aos legisladores federais pode parecer um privilégio descabido e até paradoxal. Por que mereceriam tratamento especial? Ademais, como aceitar que um parlamentar mantenha seu cargo quando a Justiça determinou sua prisão?
A prerrogativa, todavia, tem razão de ser. Sua função é assegurar o equilíbrio entre os Poderes, preservando o Legislativo de abusos do Judiciário. Se hoje a hipótese soa exagerada, não o foi num passado recente -e poderia voltar a ocorrer no futuro.
O constituinte foi zeloso ao delimitar a independência dos Poderes. Sem tais mecanismos, como evitar que, algum dia, um STF enviesado e arbitrário -diferente do atual, portanto- venha a cassar oposicionistas?
Longe dos clamores do mensalão, diversos ministros do Supremo já se pronunciaram a favor dessa prerrogativa exclusiva do Congresso. A última vez que o fizeram foi em setembro do ano passado. Mais que puro casuísmo, mudar o entendimento agora seria uma interferência indevida do Judiciário.
Atendo-se a tais limites, o STF transferirá a responsabilidade para os parlamentares -como quer a Constituição. Caberá aos deputados o ônus de decidir se manterão na Casa os apenados pela Justiça.
Preservar os colegas seria um escárnio tão impensável que, mesmo em votação secreta -o que deveria ser alterado-, os deputados sentirão o peso da opinião pública.
É inconteste que os condenados pelo mensalão não têm condições -políticas e morais- de permanecer na Câmara dos Deputados. Devem, não há dúvida, ser cassados sem delongas. Mas que se respeitem, como o STF tem feito, os ditames constitucionais.

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