terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Tragédia anunciada


EDITORIAIS Folha de São Paulo
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Tragédia anunciada
Baixa execução de verbas destinadas a prevenir desastres naturais é um sinal de intolerável descaso e omissão do poder público
Entraves burocráticos, incompetência administrativa, conveniências políticas e contingenciamento indiscriminado de gastos estão na raiz de um dos graves males da administração pública brasileira, que é a dificuldade do Estado de transformar recursos previstos no Orçamento em investimentos reais.
Exemplo dessa inépcia político-administrativa é a baixa execução de verbas destinadas a obras de prevenção de desastres naturais -como controle de cheias, contenção de encostas e combate à erosão.
As previsões para os próximos meses são de chuvas fortes, como se repete a cada verão, mas, até o fim de novembro, o governo federal só havia se comprometido a pagar 48% dos R$ 4,4 bilhões reservados aos programas preventivos. Pior: apenas 25% desse valor tinha sido, de fato, liberado.
As responsabilidades não se limitam à esfera federal. Para ter acesso ao dinheiro, Estados e municípios precisam apresentar projetos específicos, com detalhamento do plano de trabalho e da contrapartida financeira.
Uma vez encaminhados, os pleitos são submetidos ao parecer dos ministérios. Sintoma de irracionalidade gerencial, nada menos do que sete pastas estão envolvidas na aprovação dos programas.
Parte dos repasses, ademais, depende de emendas apresentadas por deputados e senadores para seus Estados. São recursos que, não raro, o Executivo bloqueia, a título de contenção de gastos.
As dificuldades para planejar e realizar as obras de prevenção terminam por onerar o governo. Acaba saindo mais caro para os cofres públicos remediar ocorrências que poderiam ter sido evitadas.
Outros aspectos perniciosos são o favorecimento político e os desvios criminosos de recursos.
No primeiro tópico, dois casos exemplares vieram a tona em anos recentes. Em 2009, 90% das verbas liberadas para prevenção de desastres pelo Ministério da Integração Nacional foram para a Bahia, Estado do então ministro Geddel Vieira Lima (PMDB). Em 2011, o roteiro repetiu-se, tendo como protagonista o ministro Fernando Bezerra (PSB), de Pernambuco.
Já na região serrana do Rio de Janeiro, palco da maior tragédia causada por desastres naturais no país, com 900 mortos, em 2011, autoridades foram afastadas sob suspeita de desvio de verbas.
A nota positiva é que o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad) foi inaugurado em agosto pela presidente Dilma Rousseff.
O órgão já emitiu alertas a mais de 400 municípios e prepara-se para aperfeiçoar seu sistema de monitoramento. De pouco valerão esses esforços se o descaso e a omissão continuarem a contribuir para a sinistra contabilidade de vítimas que se repete a cada ano.


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Veto equilibrado
Nem bem saiu de uma queda de braço com o Congresso por causa do Código Florestal, a presidente Dilma Rousseff já se vê em meio a novo embate. Desta vez, a pauta é a distribuição da riqueza gerada pela exploração do petróleo.
No começo de novembro, o Legislativo aprovou projeto para alterar o rateio de royalties e participações especiais entre União, Estados e municípios. O texto estabelecia novas regras tanto para campos de petróleo já licitados como para futuras áreas de exploração.
Com base no princípio do direito adquirido, Dilma vetou os trechos que se referiam a campos já licitados -e parlamentares já se articulam para derrubar o veto.
Atualmente, unidades produtoras ou afetadas pela atividade petrolífera, como é o caso do Rio, têm direito a um percentual bem maior de royalties do que os demais Estados e municípios.
Faz sentido que seja assim. Royalties e participações especiais são compensações pagas pela exploração de um recurso natural finito. A ideia é contrabalançar não só impactos ambientais mas também eventuais desequilíbrios sociais (por causa de afluxos migratórios) e econômicos (como sobrecarga na infraestrutura regional).
Ocorre que o bolo gerado pela exploração do petróleo tem crescido. Em 2000, o total repartido foi de R$ 2,8 bilhões. No ano passado, o montante chegou a R$ 25,4 bilhões. Ao final da década, deverá ultrapassar R$ 60 bilhões.
É razoável supor, como fez o Congresso, que os percentuais destinados às unidades produtoras de petróleo não precisem mais ser tão elevados. Hoje, uma fatia proporcionalmente menor representa, em termos absolutos, valores maiores que há dez anos.
Estados e municípios produtores, contudo, baseados numa expectativa legítima, contam com os royalties das áreas já licitadas. Em que pese o aumento dos valores, bloquear tais receitas equivaleria a uma quebra contratual.
O veto da presidente, portanto, é oportuno. Mudanças para melhor aproveitar os recursos do pré-sal devem incidir apenas sobre contratos futuros -e sua destinação prioritária deveriam ser áreas estratégicas, como educação e inovação.
Embora deputados e senadores representem suas bases eleitorais, trata-se de reconhecer o que é melhor para o país. Será um desserviço se os parlamentares insistirem em promover ampla distribuição de regalias entre entes federativos.

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