domingo, 6 de janeiro de 2013

EDITORIAIS FOLHASP

FOLHA DE SÃO PAULO

Ilha da fantasia
Enquanto se omitem em temas como lei orçamentária e royalties do petróleo, parlamentares refutam determinações do STF
O recente comentário do ministro Marco Aurélio Mello, apontando o "faz de conta" em que vive o Congresso Nacional, foge certamente ao comportamento de altitude e discrição que se espera de um magistrado do STF. Não poderia ser mais verdadeiro, contudo -e o Legislativo brasileiro parece multiplicar, a cada dia, exemplos que confirmam essa avaliação.
Vê-se, em primeiro lugar, a posse solene e sob aplausos, na Câmara dos Deputados, de alguém condenado a quase sete anos de prisão. O Supremo Tribunal Federal já decidiu, por maioria de votos, pela perda de mandato imediata dos deputados comprovadamente envolvidos no mensalão.
Afirmando não desejar um confronto direto com o Judiciário, José Genoino (PT-SP) mesmo assim assumiu o posto de deputado federal -e nada corresponderia melhor ao "mundo do faz de conta" do que a cena que protagonizou.
O "faz de conta" se transforma em "não faz conta nenhuma" quando o Legislativo brasileiro, em outro comportamento lamentável, simplesmente se omite de votar a lei orçamentária de 2013, adiando a deliberação para o mês de fevereiro.
O Executivo terminou por fim editando uma medida provisória, sob o argumento de que o próprio funcionamento da máquina federal ameaçava parar devido à omissão dos parlamentares.
Não passará de "faz de conta", numa situação dessas, a habitual reclamação de líderes congressuais diante do excesso de medidas provisórias editadas pelo Planalto.
O maior sintoma da incapacidade do Congresso de reivindicar mais espaço frente ao predomínio do Executivo está no fato de que mais de 3.000 vetos presidenciais às deliberações legislativas deixaram de ser examinados pelos representantes da população.
Com isso, travou-se mais uma vez a discussão sobre os royalties da exploração de petróleo no pré-sal. O veto de Dilma Rousseff à lei que aumentava a fatia desses recursos a ser paga aos Estados não produtores não poderia ser examinado pelo Congresso enquanto este não analisasse os outros milhares de casos pendentes -foi essa a decisão do ministro Luiz Fux, do STF.
Mas as preocupações da "ilha da fantasia" se voltam para outro assunto. A saber, a eleição dos próximos presidentes do Senado e da Câmara. No Senado, é favorito ninguém menos do que o peemedebista Renan Calheiros (AL), apesar da nuvem de escândalos que cerca o seu nome. Na Câmara, o candidato Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) já se afirma disposto a resistir à cassação dos deputados mensaleiros.
Faz de conta, naturalmente, que ninguém foi condenado. Faz de conta que o Legislativo ainda guarda algum tipo de autoridade moral, frente ao lastimável prontuário que, em pouco mais de uma semana, acaba de exibir.

    EDITORIAIS
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    Caminho pedregoso
    Depois de evitar o chamado abismo fiscal do início de 2013, os Estados Unidos terão até março um caminho acidentado na economia.
    O presidente Barack Obama e o Partido Democrata conseguiram arrancar da oposição republicana um acordo que evitou um grande aumento de impostos e um corte imediato de gastos, previsto pela legislação até então em vigor.
    Caso fossem levadas a cabo na íntegra e de súbito, as reduções da despesa pública e do consumo privado, decorrente da alta de impostos, levariam a economia americana de volta à estagnação.
    Mas foi adiada para março a decisão a respeito de expressivo corte de gastos sociais e militares. Em fevereiro, a dívida do governo federal deve chegar de novo ao teto autorizado pelo Congresso.
    Em 2011, o Partido Republicano ameaçou negar nova expansão da dívida. Em tese, o governo americano ficaria sem meios para pagar seus débitos.
    O tumulto político abalou a confiança de consumidores e empresários, complicando outra vez a retomada econômica nos Estados Unidos; foi o motivo também do rebaixamento da nota de crédito do governo americano, degradação porém ignorada pelos investidores, que continuaram a emprestar-lhe dinheiro a custo historicamente baixo.
    A ameaça do abismo fiscal afetou os ânimos econômicos, e o aumento de impostos afinal aprovado vai reduzir a capacidade de consumo dos americanos.
    O Partido Republicano, muito agastado por ter aceito tributos mais elevados, tende a exigir mais cortes de gastos nas negociações de fevereiro e março. A tensão que deve derivar do debate do novo teto da dívida contribui para deteriorar um tanto mais o ambiente político-econômico.
    Mais importante, para o futuro dos americanos, é que tanto Obama quanto a oposição republicana parecem incapazes de elaborar um plano que combine estímulos fiscais (despesa do governo) de curto prazo com um programa de controle do aumento das despesas previdenciárias e de saúde, que explodem, e de redução do caríssimo aparato militar do país.
    De interesse mais imediato para o restante do mundo há o fato de que, embora já não se espere um desastre, o empate político nos Estados Unidos deve outra vez retardar a recuperação mundial.

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