segunda-feira, 22 de abril de 2013

Explosões reais - Ruy Castro


RIO DE JANEIRO - O primeiro filme importante produzido nos EUA foi um faroeste, "O Grande Roubo do Trem" (1903), de Edwin S. Porter. A plateia se crispava quando o ator, sem nenhum motivo, dava um tiro na câmera --um disparo frontal, bem na testa do espectador. O cinema estava na infância, e as pessoas acreditavam em tudo o que viam na tela, inclusive no trem que se aproximava e ameaçava atropelá-las. Imagine um tiro à queima-roupa.
Desde então, o cinema americano nunca dispensou a parceria com a indústria de explosivos. Nos últimos cem anos, explodiu paióis, casas, carros, trens, navios, submarinos, aviões, torres e o que mais pudesse ir pelos ares. Incendiou Chicago, San Francisco e Nova York, soterrou a estátua da Liberdade, arrasou a Casa Branca e não se limitou à autodestruição --em seus filmes, o Cristo Redentor já levou a breca duas ou três vezes, as selvas do Vietnã foram devoradas pelo napalm e não sobrou poeira do planeta Krypton.
Técnicos em efeitos especiais faziam maravilhas nos anos 40 com miniaturas de automóveis despencando pelas ribanceiras, trens descarrilando e aviões se chocando no ar, tudo depois voando em milhões de partículas. Em 1963, o incêndio no posto de gasolina em "Os Pássaros", de Hitchcock, também foi um marco. E vieram os filmes-catástrofe dos anos 70, que não deixaram nada de pé. Desde então, com a facilidade dos recursos eletrônicos, Hollywood é um tiroteio sem fim.
A prova de que o cinema não induz ninguém a copiá-lo é a de que, apesar dessa intimidade com o terror, os americanos nunca tiveram de conviver com ele em casa. Todas as suas batalhas, até o 11/9, se deram na casa dos outros. De repente, as explosões estão em suas ruas e cidades, e são dolorosamente reais.
Quem sabe, agora, deixam de achar tanta graça nesses filmes cada vez mais estúpidos.
    Folha de são paulo

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