sexta-feira, 5 de abril de 2013

Mostra paralela ganha impulso em Curitiba

folha de são paulo

Formação de curadorias independentes no Fringe reforça a programação do festival de teatro da capital paranaense
Espetáculos baianos, selecionados por Wagner Moura, levam visceralidade e atores talentosos ao evento
GUSTAVO FIORATTIENVIADO ESPECIAL A CURITIBAFenômeno facilmente identificável nesta edição do Festival de Curitiba, o Fringe está amadurecendo.
A formação de curadorias independentes dentro da mostra paralela, algo que vem crescendo nas últimas edições do evento, impulsionou o circuito. Mesmo com pouco incentivo financeiro, núcleos artísticos são capazes de elaborar programações com mais qualidade.
Nesta edição do festival, uma mostra em especial chamou a atenção do público e conseguiu formar grandes filas na porta do teatro HSBC, no centro da capital paranaense. Trata-se da Novos Repertórios, que chegou a sua sexta edição com uma seleção de trabalhos frescos, em geral concebidos há menos de um ano.
A mostra nasceu com a intenção de colocar na vitrine trabalho de jovens companhias de Curitiba. Mas hoje essas companhias "já não estão mais tão jovens assim", diz Pablito Kucarz, um dos curadores da mostra.
Segundo o ator, esse formato possibilita ainda garantir mais recursos técnicos junto aos teatros e à organização do festival. "Trabalhamos com mais ou menos 80% dos recursos que precisamos", diz Kucarz.
O amadurecimento determinou também delimitações curatoriais interessantes.
O ator prefere deixar a palavra "curadoria" de lado, mas em texto de apresentação da mostra o diretor Márcio Mattana fala em "um corte que se preocupa pouco com as semelhanças superficiais e aposta antes numa seleção de divergências significativas".
As mostras organizadas dentro do Fringe já começam a ser vistas também como ponto estratégico por quem vem de fora da cidade.
A possibilidade de se apresentar na mostra paralela foi percebida pela Funceb (Fundação Cultural do Estado da Bahia). Neste ano, a instituição resolveu reservar um dos melhores teatros da capital paranaense, o José Maria dos Santos, para mostrar trabalhos de Salvador especialmente, em seleção assinada pelo ator Wagner Moura, que confirmou sua presença no festival neste domingo.
Para o público, criou-se, assim, a chance de conhecer ao menos uma parte da cena soteropolitana, representada aqui principalmente por um teatro que se beneficia de atores talentosos.
Visceralidade parecia uma qualidade em desuso nas mãos de artistas do Sul e do Sudeste. Mas espetáculos como "Pólvora e Poesia", do diretor Fernando Guerreiro, e "Seu Bomfim", com o ator Fábio Vidal, reafirmam que o sangue ainda ferve pelos lados do Nordeste. E com bons resultados.

    Roberto Alvim inspira nova geração do teatro
    Peças com iluminação baixa e minimalismo de gestos guiam-se por ideias do diretor
    DO ENVIADO A CURITIBAO impacto do trabalho do diretor e dramaturgo Roberto Alvim, tanto no campo da produção quanto em sua proposição de repensar as delimitações linguísticas e filosóficas do teatro, começa a aparecer numa geração de artistas posterior à sua.
    Especialmente em Curitiba, onde o artista deu cursos de dramaturgia e direção desde 2009, traços da identidade criada por ele reverberam em jovens criadores.
    Peças com iluminação bem baixas, muitas vezes elaboradas para revelar silhuetas (caso de "Melhor Ir Mais Cedo Pular da Janela", de Léo Moita), e também o minimalismo radical no gesto, como em "Espasmo" (espetáculo de Marcos Damasceno, com texto de Gabriela Mellão, colaboradora da Folha), guiam-se em parte pelo pensamento artístico batizado pelo diretor como Transumano.
    "Transumano", diz Alvim, "é um conceito ligado a problematizações radicais do sujeito, é dramaturgia de invenção de outros mundos linguísticos, habitados por outras formas de vida".
    Para o ator Pablito Kucarz, um dos curadores da mostra Novos Repertórios, que reúne trabalho de companhias curitibanas, a influência de Alvim "fomenta a produção dramatúrgica da cidade".
    "Essa influência se desdobra de forma interessante e traz atenção especial à palavra", diz. "Eu não entendo o porquê de muitos trabalhos terem de ser escuros; apenas em alguns isso se justifica."
    Para a crítica Luciana Romagnolli, "em Curitiba, a presença de Alvim significou um impulso renovador, colocando uma jovem geração em contato com questionamentos sobre o texto e a cena".
    Paradoxalmente, diz Romagnolli, "isso levou à formação de replicadores" que repetem procedimentos de luz, atuação e dramaturgia. "Se o Transumano amplia o pensamento sobre teatro num elogio à singularidade, ele também desencadeia um fechamento em práticas teatrais com poucas variações entre si."

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