terça-feira, 28 de maio de 2013

Clovis Rossi

folha de são paulo
Terror, rendição e resistência
Não há razão para não rotular de terrorismo a criminalidade que aterroriza São Paulo
Por que o ataque a um soldado britânico numa rua de Londres é considerado um ato de terrorismo e a penca de ataques que ocorrem todos os dias em São Paulo e demais cidades brasileiras não é?
O intuito pode ser diferente (não roubaram nada do soldado), mas o resultado final é idêntico ao que o terrorismo busca: aterrorizar uma determinada comunidade.
São Paulo está visivelmente aterrorizada, faz muitos anos. E só faz ficar mais e mais em pânico, à medida que o tempo passa e nada se faz para enfrentar o terrorismo.
Até a incubadeira de criminosos tem certo grau de parentesco. No Reino Unido, são pregadores fanatizados do islã que distorcem a religião para armar de jovens inadaptados. No Brasil, é, acima de tudo, a inadaptação de jovens à vida se não tiverem a muleta da droga, para cuja obtenção fazem de tudo.
No resto do mundo, o consumo de drogas está inexoravelmente ligado à criminalidade, quando ela não é rotulada de terrorismo.
A grande diferença entre um terror e outro é o comportamento do cidadão comum. São Paulo rendeu-se. Rendição tornada oficial pela orientação da polícia para que ninguém reaja quando assaltado. Entregue o que tem, para tentar salvar a vida. O pior da rendição é que já não impede o fuzilamento sumário da vítima, como visto recentemente.
O Reino Unido, ao contrário, não se rendeu ao terrorismo. Ao contrário. Cobri para aFolha os atentados ao metrô e a um ônibus, oito anos atrás, e encontrei uma cidade disposta a não se dobrar. Não que houvesse um espírito de heroísmo latente em cada cidadão. Havia estoicismo. Todos pareciam dizer: se temos que passar por isso, que o seja da melhor maneira possível.
É sintomático desse tipo de atitude a que tomou Ingrid Loyau-Kenneth, professora aposentada, que se atreveu a dialogar com Michael Adebolajo, o jovem de origem nigeriana que aparece em vídeo amador com as mãos ensanguentadas, segurando uma faca e um cutelo.
Quem no Brasil se atreveria a chegar perto de alguém armado?
Ingrid chegou e travou com ele um diálogo mais ou menos assim:
--Estamos em guerra com vocês, disse Michael.
--Vai perder, você está sozinho e nós somos muitos, retrucou Ingrid.
No Brasil, o diálogo seria ao contrário. O bandido é que diria "perdeu, tio (ou tia)", o habitual grito de guerra com que assaltantes se apossam de algum bem alheio.
Não sei se trocar a rendição pela resistência é bom caminho no Brasil. Talvez só aumente a cota de cadáveres de inocentes. Talvez.
Mas a resistência em Londres é acompanhada de uma sensação de segurança desconhecida em São Paulo e talvez no resto do Brasil. Nunca me esqueci de uma caminhada pelas ruas de Londres, anos atrás, com minha filha que então morava lá e, a horas tantas, soltou: "Pai, você não sabe como é bom poder caminhar pela rua sem precisar olhar para trás."
Não é que não haja criminalidade em Londres ou no resto da Europa. É que nem as autoridades nem a sociedade se renderam.

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