domingo, 5 de maio de 2013

Realpolitik - Raul Juste Lores

folha de são paulo

Seriados de TV nos Estados Unidos colocam seus personagens na Casa Branca e nos bastidores da política em Washington, com diferentes graus de veracidade
RAUL JUSTE LORESDE WASHINGTONO garoto-prodígio que escreveu a maior parte dos discursos de Barack Obama nos últimos oito anos acaba de deixar o governo para virar roteirista na TV americana.
Jon Favreau, 31, prepara uma série sobre os bastidores da Casa Branca. O que no passado renderia um fracasso de ibope, hoje é um dos filões em alta na TV americana: o dos seriados ambientados em Washington.
Uma das maiores audiências do momento é "Scandal" [escândalo], sobre uma poderosa relações públicas que gerencia crises e é amante do presidente, vivida por Kerri Washington, atriz que fez a escrava de "Django Livre", de Quentin Tarantino.
"House of Cards" virou sensação instantânea com os golpes do líder democrata na Câmara, vivido por Kevin Spacey. A comédia "1600 Penn" leva uma família disfuncional para habitar a Casa Branca; "Veep", com a ex-"Seinfeld" Julia Louis-Dreyfus, buscou inspiração nas gafes repetidas de Sarah Palin e do vice-presidente, Joe Biden.
Duas séries adoradas pela crítica, "The Americans" e "Homeland", mergulham no submundo da espionagem e mostram agentes do FBI, da KGB e da CIA atuando pelas ruas da cidade.
Quase todas são escritas ou produzidas por iniciados na capital. "The Americans" foi criada por um ex-agente do FBI; "Scandal" é produzida pela ex-chefe de imprensa do presidente George Bush (1989-1992), que teve como cliente Monica Lewinsky, a estagiária que encantou (e enrascou) Bill Clinton (1993-2001).
E "1600 Penn" é escrita por um ex-colaborador do presidente Barack Obama.
TORCIDA PARA OS RUSSOS
O compromisso com a realidade dessas séries varia muito. "Scandal" ousa ao colocar o presidente transando com sua amante no Salão Oval da Casa Branca e faz o chefe de Estado cometer assassinato. Depois de um começo morno, a audiência reagiu com reviravoltas.
Já "The Americans" narra a vida de um casal de espiões russos da KGB que vive como americanos durante o governo Reagan, em 1981. Do casamento aos nomes, tudo foi arquitetado como uma missão de Estado.
Seguindo o megasucesso "Mad Men", "The Americans" tem personagens sombrios e cheios de segredos e a fetichização de uma época recente, com figurinos milimetricamente pesquisados, laquê nos penteados, óculos de armações enormes e músicas de Peter Gabriel.
No episódio final da primeira temporada, exibido na última quarta-feira nos Estados Unidos, uma perseguição entre agentes do FBI e os protagonistas da KGB fez muitos americanos brincarem no Twitter: "Estamos torcendo para os russos".
Por razões de segurança, logística e orçamento, quase todas as séries são filmadas em outros locais, de Charlotte e Baltimore a Filadélfia e subúrbios de Nova York.
BRASÍLIA AMERICANA
"Por muitos anos, só The West Wing' [exibida entre 1999 e 2006] conseguiu fazer sucesso com uma trama política. A maioria dos seriados políticos não chegava à segunda temporada e o telespectador parecia odiar Washington e seus personagens", escreveu Brian Stelter, colunista de mídia e TV do "New York Times".
Para parte da crítica americana, os anos Obama atraíram mais atenção (e mais glamour) para Washington e um batalhão de gente jovem que foi trabalhar com o democrata, como o próprio Jon Favreau.
A ficção também se beneficiou dos crescentes conflitos mais acirrados entre democratas e republicanos.
"Desde o 11 de Setembro, os americanos olham com mais atenção para a capital, mesmo que Obama tenha uma família tão perfeita, o que dramaticamente é chato", diz o roteirista carioca Mauricio Zacharias, que estudou cinema em Berkeley e trabalha há 15 anos nos EUA.
Ele acha que há um desperdício do filão no Brasil. "Com os parlamentares e os escândalos que temos, certamente Brasília renderia ótimas séries", diz. "Mas não sei se a TV do Brasil teria coragem de colocar esses personagens no ar."

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