quinta-feira, 27 de junho de 2013

Tarso Genro e Slaviero no Tendências/Debates

folha de são paulo
TARSO GENRO
TENDÊNCIAS/DEBATES
Mais um passo da revolução democrática
Um processo constituinte que promova a reforma política é uma chance extraordinária de o sistema avançar por dentro da democracia
A abertura de um processo constituinte para promover uma reforma política é o caminho republicano para repactuar a sociedade brasileira no presente ciclo histórico.
Só assim será possível evitar o caminho da violência, recompor o espaço democrático para resolução dos conflitos de interesse e valorizar os novos movimentos sociais, que exigem novas formas de escuta e de diálogo.
Sustento que a anomia e a violência, que podem ser hoje desatadas por qualquer fagulha, em qualquer país do mundo, são absolutamente nocivas por razões ético-morais e por razões políticas.
A sua síntese só poderá ser uma: mais fechamento do Estado aos clamores da cidadania e não mais liberdades e mais direitos.
A sociedade brasileira não é a mesma de dez anos atrás, não só pelos novos protagonistas em "rede" --com o seu desejo de participação e sua irreverência em relação às instituições clássicas da democracia (aliás, mais ou menos falidas). Mas também porque a inclusão de milhões de famílias no consumo suscitou novas demandas, especialmente nas grandes regiões metropolitanas, cujos serviços públicos de baixa qualidade devem ser completamente remodelados.
É óbvio que momentos como o atual incendeiam avaliações românticas, tanto do esquerdismo como do fascismo, de novas marchas "pós-modernas" sobre Roma ou de tomadas de Palácios de Inverno.
Mas o poder não está mais lá. Nem se tem mais ideia, hoje, do que seria (nas condições da atual estrutura de classes e das novas tecnologias infodigitais) uma revolução dos trabalhadores (quais deles?) ou um "grande irmão" fascista (ou um comitê de "grandes irmãos"?), este que colocaria tudo em ordem para a classe média alta não se incomodar.
De outra parte, não só aqui no Brasil, o partido moderno surgido da experiência das grandes revoluções está totalmente superado e não tem saída.
Não se trata de uma crise por "falta de ética na política", mas pelo fato de que as "redes" promoveram o salto do cidadão anônimo para a esfera pública. Ele agora se exprime na sua pura singularidade, sem a necessidade de compartilhar publicamente para tornar-se influente.
Um processo constituinte atípico para promover uma profunda reforma política, precedido de um plebiscito convocado segundo a Constituição, é uma oportunidade extraordinária para fazer avançar o sistema por dentro da democracia.
Esse processo poderia incorporar a contribuição, por meio das novas tecnologias à disposição do colegiado de representantes constituintes, de milhões de jovens das redes, cujas linguagens, desafios e desejos não foram compreendidos por nenhum partido até o presente.
Todas as agremiações, sem exceção, foram pegas de surpresa e ou tentaram se unir aos movimentos ou tentaram direcioná-los segundo os seus interesses políticos imediatos.
Teríamos daí, no Brasil, uma experiência democrática de vanguarda. A eleição daria origem a uma assembleia de representantes, que incluiria pessoas eleitas sem partido. Combinado a isso, contaríamos com a participação e a colaboração direta de milhões, não só por meio das mobilizações sociais tradicionais, mas igualmente pelos meios virtuais, tanto para receber contribuições como aferir opiniões.
Resta saber se o Congresso Nacional terá a ousadia de vencer sua paralisia burocrática para responder à crise nacional. A questão do país não é uma corrupção em abstrato. A questão do país é a corrupção concreta de um sistema político vencido e é um cansaço da democracia, que não ousa inovar-se.
    DANIEL PIMENTEL SLAVIERO
    TENDÊNCIAS/DEBATES
    Mitos e realidade sobre a mídia brasileira
    A indústria da comunicação brasileira é vigorosa por sua pluralidade. "Regulação democrática" da mídia é um eufemismo para cerceamento
    Não passa de um repisar de falsas premissas o artigo "Uma lei para expressar a liberdade", publicado neste espaço no dia 12, pela secretária nacional de comunicação da CUT e coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC).
    Rosane Bertotti defende uma nova lei que imponha "regulação democrática" dos meios de comunicação e "garanta liberdade de expressão" no Brasil. Mas sua tese é sustentada por mitos.
    O primeiro deles é que há poucos proprietários de veículos de comunicação e que os meios não refletem a "pluralidade e a diversidade da sociedade". Na realidade, a indústria da comunicação é vigorosa, justamente pela pluralidade de empresas e de conteúdos.
    No setor de radiodifusão, existem nada menos do que 521 concessões de TV, sendo 317 comercias (61%) e 204 educativas e públicas (39%). Há 9.600 outorgas de rádio, das quais 4.600 operadas por empresas privadas (48%) e 4.900 (52%) por entidades comunitárias e educativas.
    Quanto à pluralidade de conteúdos na TV aberta, há 14 tipos diferentes de programação, produzidos por distintas empresas, com cobertura nacional, segundo a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). No mercado de mídia impressa, para o qual não há limitação de qualquer ordem, estão à disposição do leitor 4.800 jornais e 1.800 revistas no país.
    O telespectador de Brasília tem acesso a 23 conteúdos diferentes na TV aberta, contra 16 em Washington. O de São Paulo dispõe de 21, somente um a menos que o de Nova York.
    Falar em proibir a propriedade cruzada para rádio, televisão e jornal, em pleno século 21, como propõe o FNDC, enquanto as empresas de telecomunicação oferecem o chamado "quadruple play" (telefonia fixa, móvel, internet e televisão por assinatura), é olhar para o passado.
    O segundo mito é que a legislação está ultrapassada. Mas só o decreto nº 52.795, que aprovou a regulação dos serviços de rádio e TV, passou ao menos por dez atualizações desde 1963. A realidade é que as regras do setor estão em constante atualização por atos da Anatel, do Ministério das Comunicações e do Congresso Nacional.
    O terceiro mito é a proposta de controle social da mídia como forma de garantir a liberdade de expressão. "Controle social da mídia" e "regulação democrática" são eufemismos para o cerceamento.
    Imaginar que um grupo restrito de pessoas possa decidir o que uma sociedade inteira poderá ler, ouvir ou ver beira o absurdo numa época em que a internet e a tecnologia ampliam o acesso à informação.
    A depender da proposta defendida pelo FNDC, em cada cidade haveria um comitê com o poder de monitorar a atividade de jornalistas e veículos de comunicação. Em oposição a esse ímpeto autoritário, concordamos com a presidente Dilma Rousseff, para quem o único controle admitido para a imprensa é o controle remoto.
    O setor de radiodifusão sempre esteve e estará disposto a discutir a atualização das normas vigentes. Mas a discussão deve olhar para frente e valorizar a liberdade de expressão e de imprensa, condição imprescindível para o fortalecimento da cidadania e da democracia no Brasil.

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