sábado, 21 de setembro de 2013

EDUARDO ALMEIDA REIS - Autógrafos‏

Brasileiro adora fila, nem que seja para passar pelos distraídos ou furar acintosamente na condição de famoso, de celebridade


Estado de Minas: 21/09/2013


Chamada de primeira página para crônica de Cora Rónai: “Alternativas para acabar com as longas filas em noites de autógrafos”. Antes de ler a crônica da Corinha, que é craque, me lembrei do dia em que escrevi sobre as diversas alternativas de que dispunha para solucionar determinado problema e quase fui morto a tiros por um amigo, engenheiro e professor de português: “Se é alternativa, você só tem uma. Caso contrário, tem opções”. Nunca mais escrevi alternativas em lugar de opções, mesmo sabendo que, hoje, o pessoal aceita: “sucessão de coisas reciprocamente exclusivas que se repetem com alternância” ou “uma de duas ou mais possibilidades pelas quais se pode optar”. O engenheiro não aceitava e não me apraz contrariar amigos. Quanto às noites de autógrafos, acho que são ótimas para mentiras promocionais: “Fulano autografou 780 livros na livraria tal”. Philosophemos. Autografar, no caso, não é só assinar: Fulano precisa escrever algumas linhas, cumprimentar a vítima que fez fila para comprar o livro e merecer seu autógrafo, não raras vezes deixar-se fotografar com a vítima que estava na fila – essas coisas. Para início de conversa, fila nunca foi problema. Brasileiro adora fila, nem que seja para passar pelos distraídos ou furar acintosamente na condição de famoso, de celebridade. Noites de autógrafos é que têm problemas insolúveis. Cada “autógrafo”, uns pelos outros, não dura menos que um minuto. Portanto, 780 livros exigem 13 horas ininterruptas de autógrafos e preparo físico de maratonista. Sem falar do “branco” a que estão sujeitos os autores incapazes de se lembrar dos nomes de parentes e de amigos de longa data. Pensou-se resolver o problema do “branco” anexando um cartão com o nome de comprador do livro. Acontece que muita gente, mas muita gente mesmo, faz a gracinha de esconder o cartão só para perguntar ao fulano que autografa: “Você não se lembra de mim?” Essa pergunta idiota obriga o escritor, antes de autografar, a pedir licença para ir ao banheiro. Na excursão ao toalete imundo – no Brasil, banheiro público é sinônimo de imundície –, o escritor procura lembrar-se do nome do engraçadinho que escondeu o cartão. Donde se conclui que, infelizmente, as noites de autógrafos não devem acabar enquanto existirem os livros de papel.

Nem Deus espicha

Noticiam os jornais que a presidente Dilma Rousseff saiu do palácio para passear de motocicleta e conhecer as ruas de Brasília, com o seguinte pormenor: não tem carteira de motociclista. Há quem diga que passeou na garupa, sem dizer o nome da vítima que pilotava o veículo motorizado de duas rodas. O general João Figueiredo, na Presidência, era contumaz nas fugas de moto para namorar determinada senhora, cujo nome não posso dizer. Fernando Affonso, hoje senador, quando na Presidência encantava o planeta pilotando uma Kawasaki a 160 km/h. Temos, agora, dona Dilma a motocar, o que suscita o problema do gênero. Veículo de duas rodas, substantivo feminino, moto é redução de motocicleta. Como regionalismo português também é substantivo feminino: mota. guacuri (Attalea phalerata), palmeira com estirpe de até oito metros, é geralmente conhecida por motacu, de etimologia obscura. Contudo, se a pessoa sair de moto ou de mota, de moto próprio, isto é, sem conselho ou constrangimento alheio, ainda que sem habilitação, recorrerá ao substantivo masculino moto, do latim motus,us “movimento, agitação”, do supino motum, do verbo latino movere “mover”. Mesmo que não passe diante de uma Attalea phalerata pilotando bela moto, vosso philosopho pensará no sinônimo da palmeira guacuri, porque não ignora um ditado latino que não pode transcrever aqui, mas em português termina em “tem medo”. Na falta dele, ditado, vejamos cor contritum et humiliatum Deus non despices, qualquer coisa como “Deus não despreza um coração contrito e humilhado”. Na admirável tradução do aluno de um amigo meu: “Couro curtido e molhado nem Deus espicha”.

O mundo é uma bola

21 de setembro de 1621: James I, rei da Inglaterra, cede o Canadá a sir Alexander Stirling. Em 1776, o grande incêndio de Nova York, que deve ter destruído 25% das construções da cidade. Em 1778, fundação da cidade de Corumbá, hoje no Mato Grosso do Sul. Conheço bem. É das cidades mais quentes do mundo, o que não impede que durante poucos dias, todos os anos, com o tal do Vento Sul, se transforme numa Sibéria tropical. Em 1792, é declarada a Primeira República da França. Em 1863, a Espanha reconhece a independência da Argentina. Em 1893, é dirigido pela primeira vez um automóvel movido a gasolina, mas o leitor não deve acreditar na data, porque a história do automóvel é confusa e cita outras datas. Em 1915, Stonehenge, na Inglaterra, é vendido em leilão por 6,6 mil libras. Oba, acertei no teclado o símbolo de libra! Stonehenge, sabemos todos, é uma estrutura formada por círculos concêntricos de pedras que chegam a ter cinco metros e altura e pesar quase 50 toneladas, em que se identificam três períodos de construção, o mais antigo dos quais deve datar de 3100 a.C. Hoje é o Dia da Árvore.

Ruminanças

“Se lhe procuras o monumento, olha em redor” (Epitáfio de Sir Christopher Wren, 1632–1732)

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