domingo, 11 de novembro de 2012

ENTREVISTA - BRIZOLA NETO

Cerco às demissões sem justa causa


Vânia Cristino‏



Para combater a alta rotatividade no mercado de emprego, o Ministério do Trabalho quer aumentar a alíquota do PIS de empresa comn índice de troca de mão de obra acima da média de seu setor. A que estiver abaixo da média vai ser beneficiada com redução do imposto 

Vânia Cristino
Estado de Minas: 11/11/2012 

Brasília – O bom desempenho do mercado de trabalho nos últimos anos — a taxa de desemprego caiu para 5,4% em setembro — esconde uma grave mazela: a elevada rotatividade da força de trabalho brasileira. Quase 50% da mão de obra — o correspondente ao estoque de trabalhadores com carteira assinada — troca de emprego a cada ano. Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), em 2011 a economia foi capaz de gerar dois milhões de vagas com carteira assinada. No entanto, o saldo líquido positivo encobre uma triste realidade. Para chegar a esse resultado, 21,9 milhões de trabalhadores foram contratados no ano enquanto outros 19,9 milhões foram demitidos. Por causa da alta rotatividade, o pagamento do seguro-desemprego não para de crescer. Os beneficiários saltaram de 11 milhões para 19 milhões em cinco anos (de 2006 para 2011), enquanto o volume de recursos necessários para o pagamento cresceu, no mesmo período, de R$ 10,9 bilhões para R$ 23,7 bilhões. É uma sangria sem fim no Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que tem a responsabilidade de cobrir essa despesa. Preocupado com essa situação, o ministro do Trabalho, Brizola Neto, já tem na gaveta uma proposta para inibir os saques. Segundo ele, a maior parte das demissões é praticada pelas empresas de forma imotivada, tema tratado pela Constituição de 1988, mas nunca

regulamentado. Brizola Neto quer propor ao Congresso a normatização desse assunto. A proposta em estudo no governo é que as empresas que praticarem taxas de rotatividade superiores à média do setor em que atuam sejam gravadas, o que significa que passariam a pagar uma alíquota adicional de contribuição ao Programa de Integração Social (PIS), fonte de recursos do FAT. Já as empresas que apresentarem um índice inferior à média setorial seriam beneficiadas com a redução do encargo. Brizola Neto assumiu o Ministério do Trabalho há pouco mais de seis meses e lá encontrou uma terra arrasada depois da saída de Carlos Lupi, seguida pela interinidade do secretário-executivo, que durou meses. Durante esse período, as principais confederações representativas do empresariado, como a da indústria (CNI) e a da agricultura (CNA), se afastaram de conselhos tripartites, a exemplo daquele que supervisiona o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat). Até a metade do ano, apenas 9% do orçamento tinham sido executados. No meio da arrumação da casa, e já preparando o caminho para o retorno do que chamou de “diálogo social” com representantes de empresários e trabalhadores, o ministro concedeu entrevista ao Estado de Minas. Veja os principais pontos.

Qual é o maior problema do mercado de trabalho brasileiro?
A instabilidade é o maior problema. E a maioria das demissões é imotivada, ou seja, sem nenhuma razão os empresários colocam seus trabalhadores na rua. Demissões imotivadas dão acesso ao benefício do seguro-desemprego. Não há razão para, num momento como este, de quase pleno emprego, estarmos gastando mais de R$ 23 bilhões por ano de seguro-desemprego. É a rotatividade que explica esse gasto. Para gerar dois milhões de empregos por ano são admitidos 21 milhões de trabalhadores e demitidos outros 19 milhões. Mais de nove milhões são demissões involuntárias.

Quais as razões para que o troca-troca de trabalhadores no mercado de trabalho seja tão elevado?
Em primeiro lugar, as fraudes. Elas são montadas por verdadeiras quadrilhas que criam empresas fantasmas, resgatam empresas falidas e fazem de tudo para conseguir sacar o seguro-desemprego em massa, falsificando documentos e vínculos. Outro motivo é o conluio entre patrões e empregados, que combinam a cessação do vínculo. Por fim, temos também a demissão provocada pelas empresas que veem na substituição de funcionários um instrumento de economia. As empresas demitem empregados mais antigos, com salários mais altos, substituindo-os por nova mão de obra, com salários mais baixos.

Mas as empresas alegam que é alto o custo de demissão...
Se fosse assim tão alto, não teríamos tantas demissões.

Como o ministério pretende combater esse problema?
No caso das fraudes, a fiscalização está em cima. Temos até uma parceria com a Polícia Federal para combater as quadrilhas e ela já está dando resultado. Uma grande quadrilha foi desbaratada dias atrás. No caso do conluio, vamos fazer uma grande campanha educativa, tentar conscientizar patrões e empregados de que essa prática prejudica a todos, especialmente os trabalhadores, pois o dinheiro para o pagamento do seguro-desemprego sai do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Essa é uma fraude difícil de ser combatida, pois é praticada nos pequenos estabelecimentos. Para combater esse vício estamos adotando medidas de controle dentro do próprio Sine (Sistema Nacional de Emprego), como o cruzamento de dados com outros cadastros do governo, a exemplo do Caged, da Rais, da Previdência Social e a da própria Receita Federal. Também pretendemos transformar o pagamento do seguro-desemprego, que é feito na boca do caixa, para crédito em conta-corrente.

Essa nova fórmula, de crédito em conta-corrente, não vai implicar burocracia e demora no recebimento para quem precisa?
Não. Todo o cuidado vai ser tomado quanto a isso. O crédito vai ser feito no mesmo dia na conta- corrente indicada pelo trabalhador. A vantagem é que, sendo em conta-corrente, o banco já tomou os cuidados necessários para identificação do beneficiário.

Como o senhor pretende atacar a demissão imotivada, provocada pelas empresas?
Simplesmente regulamentando o artigo 239 da Constituição (parágrafo 4º). Temos que ter em mente que a rotatividade é uma ameaça ao FAT. Nossa intenção é fazer com que as empresas com rotatividade acima da média do seu setor paguem alíquotas maiores de contribuição ao PIS. O inverso também acontecerá. As empresas que rodam sua mão-de-obra num percentual menor, inferior ao índice setorial, serão beneficiadas com descontos.

Encontra-se em tramitação na Câmara dos Deputados uma proposta para dar ao empregado doméstico a mesma proteção desfrutada pelos demais trabalhadores celetistas, como direito ao seguro-desemprego, adicional noturno, de insalubridade etc. Qual é a posição do Ministério do Trabalho?
Já estamos atrasados nisso. O Brasil liderou na Organização Internacional do Trabalho (OIT) a construção da resolução sobre a equidade de direitos. Agora temos que sair na frente no processo de ratificação da resolução, que é quando ela passa a valer de fato. Não podemos mais permitir que existam no país trabalhadores de segunda classe. Esses direitos estão garantidos aos trabalhadores urbanos desde a década de 30 e devem ser estendidos o quanto antes aos domésticos. Nessa área, ainda sofremos o resquício da escravidão, um servilismo que precisa ser superado.

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