sábado, 22 de dezembro de 2012

Joaquim Barbosa deixou voz da instituição falar mais alto

FOLHA DE SÃO PAULO

ANÁLISE
Presidente deixou voz da instituição falar mais alto
FERNANDO LEALESPECIAL PARA A FOLHAA decisão do ministro Joaquim Barbosa negando o pedido de prisão imediata dos réus condenados feito pelo Ministério Público revela quatro aspectos interessantes.
Primeiro, que há limites para se insistir na tese de que o mensalão é diferente dos outros processos envolvendo questões penais que chegam ao Supremo. É diferente, mas até certo ponto.
A orientação tradicional do tribunal, firmada a partir do julgamento de diversos habeas corpus, é a de que não se pode prender alguém até que haja uma decisão definitiva -ou seja, contra a qual não cabe mais nenhum tipo de recurso.
Ontem Barbosa mostrou que mesmo uma ação penal que começa e termina na mais alta corte do país não escapa da regra. No caso do mensalão, recursos ainda podem ser interpostos. E, por isso, decisões podem ser mudadas.
Barbosa deixou claro, em segundo lugar, que o cabimento de embargos infringentes ainda será analisado pelo plenário. Se esses recursos forem admitidos pela corte nos casos de condenação em que houver pelo menos quatro votos favoráveis à absolvição, diversas decisões poderão ser revistas.
E antes que se afirme algo em contrário, a possibilidade não é desprezível. Do julgamento desses recursos poderão participar tanto o ministro Teori Zavascki, recentemente empossado, como, se for nomeado a tempo, o ministro que ocupará a vaga de Ayres Britto.
Em terceiro lugar, a decisão mostrou-se politicamente sábia. Ao não determinar a prisão dos réus, entre os quais há parlamentares, Barbosa impediu novos conflitos com o Legislativo.
Finalmente, Barbosa deu exemplo de colegialidade ao deixar possíveis convicções pessoais de lado e fazer a voz da instituição falar mais alto. O tema enfrentado ontem não era inédito no tribunal e sobre ele Barbosa já se manifestara.
No julgamento do habeas corpus 84.078, por exemplo, o ministro entendeu ser possível a prisão de réus condenados antes da decisão final. Mas foi vencido em plenário. Ontem, como presidente, poderia ter decidido diferente, seguindo sua orientação. Mas não o fez. Exerceu sua função pensando também na integridade da instituição e das suas decisões.


    Barbosa rejeita pedido de prisão dos réus do mensalão
    STF já definiu que execução da pena só ocorre após fase dos recursos, diz ministro
    Presidente do Supremo afirma que cenário pode mudar caso recursos sejam usados para fins de protelação
    DE BRASÍLIAO presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, negou ontem o pedido de prisão imediata dos condenados no mensalão, garantindo a eles o direito de ficar em liberdade até que todos os recursos possíveis sejam julgados.
    Segundo Barbosa, o plenário do STF já decidiu, na análise de um habeas corpus, e contra seu voto, ser "incabível o início da execução penal antes do trânsito em julgado [após esgotados os recursos] de condenação".
    A decisão de Barbosa garante aos condenados um bom tempo antes do início do cumprimento de suas penas.
    Isso porque para que sejam aplicadas, o tribunal ainda precisa publicar o acórdão (oficialização da decisão) e, depois disso, julgar recursos que deverão ser propostos.
    Ao todo, após quase cinco meses do maior julgamento da história do tribunal, 25 pessoas foram condenados. Destes, 11 terão de cumprir a pena em regime inicialmente fechado, entre eles o ex-ministro da Casa Civil do primeiro governo Lula, José Dirceu.
    O pedido de prisão imediata foi feito pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no início do julgamento. Ao final, no entanto, ele retirou o pedido e o reapresentou quando o tribunal já estava em recesso.
    A atitude foi vista por ministros do Supremo como uma manobra para deixar o caso nas mãos do presidente do STF, plantonista durante o recesso, supostamente o mais suscetível ao pedido, já que plenário do tribunal dificilmente acataria a proposta.
    O plantão de Barbosa vai até meados de janeiro, quando ele será substituído pelo vice-presidente, Ricardo Lewandowski. O recesso do STF acaba em 1º de fevereiro.
    Gurgel disse, por meio da assessoria, que a negativa de prisão imediata reforça "o temor de que se passe muito tempo até o efetivo cumprimento das condenações".
    O procurador fez o pedido argumentando que ação do mensalão não está sujeita a uma "instância revisora". Também disse que os recursos devem ocorrer "em cascata" com o objetivo de adiar o cumprimento das penas.
    Em sua decisão, no entanto, Barbosa disse que, "embora atípicos e excepcionalíssimos", ainda existem recursos que, se bem sucedidos, podem mudar o resultado.
    O ministro afirmou que a única possibilidade de mandar os réus para prisão seria por algum motivo urgente e temporário, como a tentativa de fugir, o que ele considera não ser o caso.
    "Até agora, não há dados concretos que permitam apontar a necessidade de custódia cautelar dos réus, os quais, aliás, responderam ao processo em liberdade", disse, lembrando já ter proferido uma decisão proibindo os condenados a se ausentarem do país sem autorização.
    RECURSOS
    Já em relação ao número excessivo de recursos, Barbosa respondeu que o STF já vem decidindo impor o cumprimento das penas quando verifica propostas de recursos "manifestamente protelatórios". Para ele, porém, não se pode presumir desde já que isso vá acontecer no processo do mensalão.
    "É necessário examinar a quantidade e o teor dos recursos a serem eventualmente interpostos para concluir-se pelo seu caráter protelatório."
    No Rio Grande do Sul, o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), afirmou que a decisão "garante" o Estado de Direito.
    O petista entrou em conflito com o STF nos últimos dias por defender a tese de que cabe ao Congresso a palavra final sobre a cassação de mandatos dos deputados condenados, o que difere da decisão do tribunal.
    Além disso, ele cogitava dar abrigo na Câmara a deputados se Barbosa decretasse a prisão antes da fase dos recursos. Maia rebateu a declaração de Barbosa de que lhe falta conhecimento jurídico. "Quem fez a Constituição fomos nós. (...) Então, conhecemos a Constituição de cor e salteado." (FELIPE SELIGMAN)

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