quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

É necessário ver a calçada como o espaço mais importante da cidade

FOLHA DE SÃO PAULO

ANÁLISE

FERNANDO SERAPIÃOESPECIAL PARA A FOLHA
O que é mais importante para a cidade: a calçada ou a rua? Desde o tempo em que, por segurança, foi necessário segregar pedestres e veículos, o pódio cabe à calçada.
Trata-se do espaço democrático onde ocorrem as relações humanas públicas. Ali, o cidadão caminha em velocidade civilizada, olha nos olhos do outro, observa árvores e vitrines.
As melhores cidades do mundo são aquelas onde diferentes classes sociais caminham juntas. Isso implica manter ao alcance de quem caminha as principais necessidades e calçadas contínuas, que deem uma ideia de ambiente público uno.
Infelizmente, isso não ocorre em São Paulo. A prioridade é da rua, ou seja, dos veículos -o governo cuida do asfalto e renega a calçada.
A calçada paulistana sempre foi privatizada. A responsabilidade da construção e manutenção é dos proprietários. Arquitetos talentosos estenderam o piso para o ambiente particular -caso exemplar do Conjunto Nacional, na avenida Paulista.
Mas, afinal, o que era valorizado? O espaço público, que invadia o privado, ou o privado, que adentrava o público?
No restante da cidade, reinou o caos: falta de padrão no piso e no mobiliário urbano. Se isso ocorreu entre ricos, a barbárie da periferia leva o caminhar para rua.
Na gestão Serra, um decreto criou o padrão com divisões de faixas para pedestres e vegetação, mas deixou para o proprietário a escolha entre quatro materiais. Se desse certo, essa ideia torta levaria décadas para florescer.
Em paralelo, iniciativas públicas e privadas construíram trechos com padrão regular. Exemplo dos comerciantes das ruas Oscar Freire e Clodomiro Amazonas e do governo, quando reformou as avenidas 9 de Julho e Rebouças (na gestão Marta), a rua Augusta e a avenida Paulista (gestão Kassab).
O governo deve assumir o problema. A questão é chave: enquanto não existir a percepção de que a calçada é o espaço público mais importante da cidade, São Paulo não será um bom lugar para se morar.
FERNANDO SERAPIÃO é crítico de arquitetura e editor da revista "Monolito"

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