quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Tendências/Debates

FOLHA DE SÃO PAULO

áLVARO RODRIGUES DOS SANTOS
O prefeito Haddad e as enchentes
Não venhamos a acreditar que aquecimento global e lixo urbano são os causadores de alagamentos. As cidades estão impermeáveis
Em seu primeiro dia de governo, o prefeito Fenando Haddad anunciou um pacote de 16 medidas emergenciais para a redução dos danos das enchentes na capital paulista durante o atual período chuvoso. No âmbito de um caráter nitidamente emergencial, poder-se-ia sugerir isso ou aquilo para melhorar os efeitos reais desse pacote, mas não muito mais do anunciado pelo prefeito.
Acertadíssima, aliás, a contratação do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) para o monitoramento das áreas de risco já mapeadas, um qualificadíssimo reforço às ações de Defesa Civil.
Vale lembrar, ainda dentro desse caráter emergencial voltado a salvar vidas, a importância prioritária que deva se dar nesse momento à remoção e reassentamento de famílias que hoje ocupam trechos críticos de margens dos córregos urbanos, situação em que suas precárias moradias ficam sujeitas ao fatal solapamento por consequência de águas torrenciais.
Entretanto, ainda que indispensáveis, as medidas emergenciais sabidamente são de curto alcance e de restrita eficácia. A questão fundamental não está aí. Estará, sim, na abordagem com que a gestão tratará um indispensável plano maior de combate às enchentes, situação em que, em vez das consequências, serão as causas reais do fenômeno que deverão ser enfrentadas.
Para tanto, é de início imperativo que a nova administração tenha o destemor e a clarividência de perceber e assumir que os sucessivos planos de combate às enchentes elaborados e executados pelos governos estadual e municipais da Região Metropolitana de São Paulo redundaram em um fragoroso fracasso.
As enchentes urbanas na metrópole estão acontecendo a cada ano com maior frequência, com maior intensidade e com maior distribuição geográfica. Estamos, no que diz respeito às enchentes, em uma situação crítica e trágica. E, por favor, não venhamos a acreditar que esse infortúnio se deva a fatores como o aquecimento global ou mesmo, simploriamente, ao lixo urbano.
Concisamente, as enchentes urbanas são explicadas pelo incrível aumento do volume de águas de chuva que aflui, em tempos sucessivamente menores, para um sistema de drenagem -córregos, rios, bueiros, galerias, canais- progressivamente incapaz de lhe dar a devida vazão.
A extensiva impermeabilização do espaço urbano, a exagerada canalização de córregos e o rápido assoreamento das drenagens por enormes volumes de sedimentos oriundos dos processos erosivos incidentes nas zonas periféricas de expansão urbana são os fatores causais essenciais a serem batidos. E tecnologicamente, como nos ensinam várias cidades do mundo, vencer essa batalha é plenamente possível.
Registre-se que, em nosso caso, e agravantemente, não somente não vêm combatendo essas causas, mas, pior, nossas cidades continuam a crescer reproduzindo-as, multiplicando-as e potencializando seus maléficos efeitos.
Senhor prefeito, está em suas mãos a oportunidade áurea de corrigir esses maus rumos e liderar a metrópole para um competente e resolutivo enfrentamento das enchentes, incluindo uma inteligente divisão de responsabilidades. Ao Estado, caberiam as medidas estruturais, voltadas a dotar nossos maiores rios de maior capacidade de vazão; aos municípios, as medidas não estruturais, voltadas a recuperar a capacidade do espaço urbano em reter águas de chuva e a combater o perverso binômio erosão/assoreamento.
Para tanto, passo inicial, é preciso romper com a lógica dos atuais planos, antes que eles consigam afogar de vez a metrópole em enchentes e nos pútridos e deletérios piscinões, esse atentado urbanístico e sanitário que vem sendo irresponsavelmente adotado como a panaceia para todos os males.
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Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


RUBEM NOVAES
É a psicologia, estúpido!
Na ânsia de culpar as elites, governantes tratam empresários como mal necessário; assim, caem investimento e produção
No momento em que são fechados os números da economia brasileira relativos a 2012, nossos governantes mostram decepção com os resultados econômicos obtidos.
Nesse quadro de surpresa, devem estar se perguntando: como colhemos resultados tão fracos, se baixamos fortemente os juros; se desvalorizamos o câmbio e elevamos tarifas para melhorar a competitividade internacional de nossa indústria; se, generosamente, abrimos os cofres das instituições governamentais de crédito; se promovemos várias desonerações fiscais para setores importantes e se, ainda, prometemos substancial redução no custo da energia para o futuro próximo? Onde está o "espírito animal" dos empresários?
Dá para desconfiar que a resposta só será encontrada em outras esferas, fora do campo das variáveis habitualmente objeto de atenção no mundo econômico-financeiro. Afinal, a insegurança jurídica e o "fator ideológico" são elementos críticos na formação de expectativas empresariais pessimistas.
A verdade é que há, no governo atual, um ativismo descoordenado, que, ao impor mudanças bruscas nas regras do jogo, assusta e inibe o empresariado privado.
Este está disposto e sabe enfrentar o "risco mercado", mas, para quem não tem padrinhos políticos, não há como bem lidar com o "risco governo", implícito nas gritantes alterações no marco regulatório de setores fundamentais. Sem falar que está sendo minado o tripé: responsabilidade fiscal, metas de inflação e câmbio flexível, de tão bons serviços prestados ao país.
Na esfera jurídica, o que vemos é a tradicional colisão entre "direitos sociais" e o direito de propriedade, sendo o confronto quase sempre desempatado de forma contrária aos interesses do empresariado, notadamente quando a questão está afeta à Justiça do Trabalho.
Mas é na "pele e cheiro", tão decantada por sexólogos ao explicar o tesão, que reside o maior problema de relacionamento entre as partes. Com atos e palavras, nossos atuais governantes têm fustigado a classe empresarial tratando-a apenas como um mal necessário. Na ânsia de culpar as elites, seguidamente nossos homens de negócio são apresentados como sonegadores de impostos, exploradores da mão de obra e enganadores do consumidor.
Em manifestações culturais, cada vez mais influenciadas por dinheiros públicos, empresários são sempre mostrados como vilões, picaretas malvados. A sociedade, com isso, perde a noção da importância que os empreendedores têm como geradores de progresso e bem-estar e de que, de seu esforço produtivo, em última análise, é que são pagas as gordas contas governamentais.
Para completar o quadro, jovens, deslocando-se em multidões atrás de concursos públicos, parecem antever futuro promissor apenas na burocracia estatal, desprezando o risco empresarial.
Nesse clima de insegurança e rejeição, o empresário se retrai. E caem o investimento e a produção. Podemos e devemos ter um ano melhor em 2013. Mas, nada de espetacular será visto, enquanto permanecer o ambiente hostil para quem, ao investir e inovar, correndo riscos, é o verdadeiro motor do desenvolvimento.
Nos EUA, a assessoria de Bill Clinton cunhou a frase: "É a economia, estúpido!", para explicar o que realmente pesava nas decisões do eleitorado. Para aqueles que ainda estão intrigados com o nosso fraco desempenho econômico, podemos clamar em resposta: "É a psicologia (empresarial), estúpido!".
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Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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