segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo


A ameaça dos juros
Alta da taxa básica ainda em 2013, antes descartada, volta a assombrar o Planalto; mercado já aposta em sinal de alerta do BC em março
A escalada da inflação parece ter surpreendido o governo, a julgar por alguns sinais de desconforto. O acumulado em 12 meses atingiu 6,15% em janeiro, taxa incomodamente vizinha do limite superior da meta adotada pelo Planalto (cujo alvo é de 4,5%, mas com tolerância de dois pontos percentuais).
Esse comportamento dos preços não está em desacordo com a previsão do Banco Central de alta no primeiro semestre, seguida no entanto de um recuo para cerca de 5% no final de 2013 -mas essa expectativa já é posta em dúvida.
Analistas privados vinham trabalhando com inflação anual de 5,7% em 2013, bem acima da esperada em Brasília. Agora o governo também começa a mudar de tom.
O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, avisara no final de janeiro que estava preocupado e atento. Foi secundado tardiamente pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, que descartou a valorização do real para conter preços (ao estimular a concorrência de produtos importados) e admitiu que a taxa de juros é o instrumento adequado para fazê-lo.
Tradução: a alta dos juros neste ano não é mais descartada pelo governo. O mercado financeiro reagiu rapidamente, elevando a taxa de juros futura em seus negócios.
A aposta é que o BC dará um passo nessa direção na próxima reunião do Copom, em duas semanas, talvez omitindo do comunicado a indicação de que a taxa básica ficará em 7,25% por longo período.
Arrefece, assim, o otimismo artificial com o desempenho da economia. O governo, que já parecia resignado com um crescimento do PIB de 3%, agora se dá conta de que a inflação não cairá por si mesma para 5%, ou menos.
O problema não será resolvido com reduções de impostos na energia ou na cesta básica. Intervenções pontuais não têm o poder de desfazer a nociva associação de crescimento baixo (média de 1,8% no biênio) e inflação alta (6,15%).
Será muito positivo se o BC conseguir convencer o Planalto de que está perdendo a batalha das expectativas e que mais um ano de inflação tendendo para 6% (em 2012 foram 5,84%) traria efeitos graves na antevéspera de uma eleição.
O pior cenário para o governo seria ter de explicar à população por que seria imperativo elevar os juros numa economia que, segundo o próprio governo, ia tão bem.
Não há mais espaço para voluntarismo na política econômica. Desvalorização da moeda, relaxamento nos gastos públicos e busca de crescimento a qualquer custo desandam em inflação. Corrói-se o ânimo empresarial e o investimento. O aumento modesto da produção não aliviará tão cedo as pressões sobre os preços.
Não é certeza ainda que os juros subirão, mas esse risco agora cresceu -inclusive para o projeto eleitoral de Dilma Rousseff em 2014.


EDITORIAIS
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Injustiça nas férias
A cúpula do Judiciário ensaia reduzir as férias dos magistrados dos atuais 60 dias para 30. Mais uma vez, pode-se antecipar forte reação corporativa contra o projeto. Pelo menos desde a Constituição de 1988 fala-se em acabar com o privilégio, mas há 25 anos os juízes resistem às investidas.
A benesse é difícil de sustentar, em termos econômicos como de igualdade republicana. Às férias dobradas se somam regalias como 12 dias de recesso no fim do ano e alguns feriados exclusivos -os dias da Justiça, do Advogado e do Servidor Público.
Resultado, nas contas de Joaquim Falcão, professor de direito constitucional da Fundação Getúlio Vargas (RJ): o magistrado trabalha, em geral, cerca de 20% a menos que um servidor público e cerca de 30% a menos que um trabalhador de carteira assinada na iniciativa privada.
O fim dos 30 dias sobressalentes produziria 2 milhões de sentenças adicionais por ano -incremento de quase 10% no total de decisões.
As associações de classe que vêm a público defender a vantagem costumam justificá-la afirmando que a categoria lida com questões complexas e de grande impacto na vida dos jurisdicionados, o que produz muito estresse. Dizem ainda que, frequentemente, levam trabalho para casa, o que torna suas jornadas reais muito maiores que as previstas em lei.
São argumentos pouco convincentes. Magistrados não são a única categoria profissional que toma decisões graves. Neurocirurgiões, por exemplo, também executam operações complexas e com enorme potencial de dano, mas nem por isso fazem jus a férias em dobro. Raciocínio análogo vale para a extensão doméstica da jornada. No mundo contemporâneo, marcado pela hiperconcorrência e por novas tecnologias que levam o escritório à casa das pessoas, muitos dos que exercem cargos de comando ou executam tarefas criativas estão imersos no trabalho por períodos bem mais extensos do que está previsto na legislação.
É claro que apenas reduzir as férias dos magistrados não vai resolver o problema da morosidade e da ineficiência do Poder Judiciário, mas não há dúvida de que traria algum avanço.
Seria, além disso, uma demonstração importante de que a Justiça brasileira conseguiu superar o corporativismo e foi capaz de pôr fim a uma sinecura cara e antirrepublicana que a beneficiava.

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