segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Marcos Augusto Gonçalves

folha de são mpaulo

Bancos com encosto
Assento irregular para evitar que mendigos se deitem é só um aspecto perverso do desconforto público da cidade
Bancos ondulados de concreto, como os que vemos muitas vezes em São Paulo, são bastante funcionais quando se trata de desfavorecer mendigos, sem-teto, bêbados e desocupados em geral. Não servem para dormir, então deixam de ser convidativos para essa população errante que as cidades brasileiras não sabem onde pôr.
Eles são da mesma família de outros dispositivos públicos e privados feitos para manter a "segurança" de casas e edifícios. Grades, lanças, cercas elétricas, rolos de arame farpado, câmeras e holofotes. Afinal, são residências ou presídios?
Recentemente, um amigo europeu assustou-se com o patético trâmite da rua à porta de entrada de um prédio nos Jardins. Interfone, espera, portão gradeado que abre, espera, portão que fecha, espera, portão que abre... Sentiu-se num posto militar em Israel.
Esse aparato todo, feio e perverso, custa dinheiro e alimenta uma indústria que prospera à sombra da divisão social, da educação indigente, da ineficácia da segurança pública e do despreparo de nossas cidades.
Pensando nisso tudo, a reivindicação por bancos mais confortáveis em áreas públicas de São Paulo, que poderia parecer supérflua, torna-se, na realidade, politicamente desconfortável. Expõe o constrangimento que cerca o assunto e nos leva de volta à desigualdade socioeconômica na metrópole -tema central, aliás, da campanha de Fernando Haddad. Não podemos ter bancos agradáveis em praças públicas senão os pobres tomam conta?! É deprimente.
Esse papo tem aparecido numa página criada no Facebook, cuja "causa" é justamente esta: "Bancos com encosto para São Paulo". Criada pelo jornalista Ricardo Porto, é tocada por ele e pela assessora de imprensa Sofia Carvalhosa. Tem atraído interessados, que postam fotos de bancos de vários lugares do mundo e conversam sobre outros problemas da cidade.
"É uma causa aparentemente boba, mas que levanta muitas outras", diz Sofia. "Os ricos não querem bancos nas praças porque têm medo de mendigos. A praça Morungaba poderia ser um lugar gostoso para quem trabalha na Faria Lima descansar. É uma praça triste. No parque do Povo, que é gradeado, não há nenhum banco com encosto nem na praça Roosevelt. Os lugares onde eles ainda existem são nostálgicos: parque da Água Branca ou do Trianon", diz ela.
O tema é mais oportuno neste momento em que São Paulo, depois de anos de espera, está por receber novo mobiliário urbano, conforme contrato firmado na gestão Kassab. Como previsto na formulação da Lei Cidade Limpa, a publicidade indiscriminada ia sumir do espaço urbano e depois voltar, disciplinada e explorada pela prefeitura em troca de equipamentos públicos.
Novos abrigos de ônibus e relógios estão a caminho. No primeiro caso, já passou da hora de oferecer mais conforto a quem espera transporte público -além de informações e respeito quanto a horários. No segundo, como bem questionou nesta Folha o arquiteto Fernando Serapião, é de perguntar se na era da difusão em massa de mostradores digitais precisamos mesmo encher a cidade de anúncios em troca de hora certa e temperatura. A prefeitura, como também sugeriu Serapião, poderia ao menos usar os recursos arrecadados para ir um pouco além e melhorar o entorno dessas novas peças -reformando as calçadas, por exemplo. Ou -acrescento eu- providenciando a instalação de bancos com encosto em São Paulo.
marcos.augusto@grupofolha.com.br

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