quarta-feira, 10 de abril de 2013

Eduardo Almeida Reis-Incroyable‏

Sou o único brasileiro ou um dos raros a telefonar pedindo que recalculem as faturas 


Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 10/04/2013 

Adj. (fin XVe) Qui n’est pas croyable; qu’il est impossible ou très difficile de croire. Como também é muito difícil copiar um verbete do Petit Robert com o corretor de textos do Word 7, que transforma très em três. O fato é que continuo achando a Cemig étonnant, étrange, surprenant, incroyable, mesmo reconhecendo que o seu serviço é dos melhores que existem por aí. Fui comprador de energia rural mineira e aprendi o que é bom para a tosse: perdi a conta das cargas do freezer horizontal deitadas fora ao cabo de três e quatro dias sem luz. Em janeiro, instalado no apartamento juiz-forano, liguei para a Cemig dando nome, CPF, identidade, título de eleitor, certificado de ótimos antecedentes, nomes dos pais, avós e bisavós, pedindo que as contas de luz passassem a vir em meu nome. Primeira curiosidade: havia luz, sem que houvesse consumidor.

Aí, chega a primeira conta em meu nome: R$ 26,50, que mandei pagar supondo que se referisse a meia dúzia de dias de fornecimento de energia. Mês seguinte, a segunda conta: R$ 17,52. Epa, que aí tem coisa, philosophei. Não é possível que 30 dias de energia custem somente R$ 17,52. O apê tem lavadora e ferro elétricos, geladeira, máquina de caffè espresso, liquidificador, até batedeira elétrica a comadre comprou. Três chuveiros elétricos. Dezenas de lâmpadas fortíssimas, daquelas que lumeiam, como dizia um comerciante trirriense capaz de vender a mãe e entregar em domicílio. Computador imenso ligado 16 horas por dia e o mais que o leitor possa imaginar por R$ 17,52 mensais, cerca de R$ 0,58 por dia. Mandei pagar e telefonei para a Cemig. Sou o único brasileiro ou um dos raros a telefonar pedindo que recalculem as faturas. Foi assim que me ensinaram e ainda não desaprendi. Depois de vários cliques atendeu o Alexandre e fiquei sabendo que, para “minha segurança”, a ligação estava sendo gravada. Dei todas as informações pedidas pelo operador da Cemig, endereço, nome do consumidor e aquele número imenso da instalação, que vem num retângulo amarelo. O operador foi admirável: “Sua luz não está ligada”.

Pausa para respirar fundo, antes de ponderar: “Sejamos inteligentes, Alexandre. Se está desligada, como explicar que esteja ligada? Estou telefonando de um aparelho elétrico Panasonic sem fio”. E ele: “O sistema informa que está desligada”. Insisto via Panasonic: “Se está desligada, portanto não está fornecendo energia, como explicar as duas faturas mensais e consecutivas, uma de R$ 26, outra de R$ 17?”. Treinado para acreditar no sistema e desprezar o bom senso – faturas mensais sem fornecer energia – o rapaz fincou pé: “Está desligada. Vou mandar ligar dentro de 24 horas, tem uma taxa de R$ 10”, além de explicar outras coisas que obviamente não anotei, mas tenho o número do protocolo. Exatas duas horas depois chegou o funcionário uniformizado, localizou o relógio, policiado de perto pela comadre, desligou e tornou a ligar uma chave, explicando: “Estava desligada”. A comadre, que é admirável cozinheira e boa amiga, mas não se formou em engenharia elétrica, protestou: “Se estava desligada, como é que o senhor desligou e ligou a mesma chave?”. O funcionário não lhe deu atenção e foi-se embora na mesma velocidade com que pintou no pedaço. Aguardo as próximas faturas. Sei que a Cemig pertence ao governo e aos acionistas. Não tenho ações, a não ser a boa ação de avisar quando a fatura é ridícula, porque desconfio de que, se todos pagarmos faturas ridículas, ficaremos sem luz e a comadre não terá batedeira elétrica para o meu suflê de queijo, servido no dia da religação da luz que estava ligada.

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