quinta-feira, 2 de maio de 2013

O terrorismo e seus caminhos -Flavio F.da Cunha Bierrenbach -[Tendências/Debates]

folha de são paulo

FLAVIO FLORES DA CUNHA BIERRENBACH
TENDÊNCIAS/DEBATES
O terrorismo e seus caminhos
O terrorismo atinge seus objetivos quando detona uma reação em cadeia, que provoca a redução da taxa de liberdades democráticas
O terrorismo é velho e velhaco. Se a história estiver certa, pode-se classificar como terroristas, com critérios atuais, fatos antiquíssimos, massacres de pessoas indiscriminadas que marcaram os prontuários de figuras execrandas, como Nero e Átila; vamos ficar por aqui.
Desde tempos remotos, o terrorismo desencadeia uma avalanche irracional, na lógica da ação e reação, do olho por olho, que leva todos à cegueira. Da Antiguidade clássica à moderna astronomia, "phobos" (medo) e "deimos" (terror) são os satélites de Marte, o deus da guerra.
O conceito de terror --referido por Maquiavel, embora já praticado desde a Roma dos pontífices até as vendetas sicilianas--, entretanto, só entrou para os dicionários como categoria política, conforme autorizada opinião de Norberto Bobbio, depois da Revolução Francesa, no período assim denominado, liderado por Robespierre e Saint-Just.
Depois, com o correr do século das luzes, a ferrugem foi atacando a lâmina da guilhotina.
O adjetivo terrorista, por sua vez, passou a ser corriqueiramente empregado de modo difuso, a partir do século 19, para qualificar autores de atentados de diversos tipos, como o assassinato do arquiduque Ferdinando, em Sarajevo, que precipitou a Primeira Guerra Mundial.
A partir daí adquiriu diversas conotações. O nazifascismo, nos anos 1930, e possivelmente todas as ditaduras desde então não hesitaram em classificar genericamente seus opositores como terroristas. Não faz muito tempo, na Espanha, o regime de Francisco Franco ainda os matava no "garrote vil".
Por outro lado, a experiência mais recente da humanidade permitiu que a ciência política e o senso comum evoluíssem para considerar terrorismo de Estado o regime de violência instituído por um governo para manter o povo submisso.
O mundo atual tem acrescentado novos componentes ao tema. Entretanto não existe definição jurídica para o crime de terrorismo.
Com a queda das Torres Gêmeas, em setembro de 2001, o terrorismo inaugurou a globalização do fanatismo. Com imprevisibilidade, ubiquidade e inclemência, vem demonstrando que o mundo ocidental carece de instrumentos legais eficazes para combater a maior ameaça que paira sobre a civilização neste início de milênio.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 4º, diz que o repúdio ao terrorismo constitui um dos princípios fundamentais que regem as relações internacionais do Brasil. Em 2003, vítima do terrorismo, morreu em Bagdá um eminente brasileiro, o diplomata Sérgio Vieira de Mello, no desempenho da função de mais alto representante das Nações Unidas no Iraque.
O fato é que o terrorismo atinge exatamente seus objetivos quando detona uma reação em cadeia, que provoca a redução da taxa de liberdades democráticas, numa dupla mão de direção, perversa nos dois sentidos, pelo invariável retrocesso na política de direitos humanos.
Hoje, o que caracteriza basicamente o terrorismo é o aleatório de suas vítimas. Constitui grande desafio aos juristas a construção teórica de uma proposta de tipificação homogênea para o crime de terrorismo, antes que a potência hegemônica, contaminada pelas circunstâncias, acabe logrando impor a sua.


JOSÉ AMÉRICO
TENDÊNCIAS/DEBATES
Um Legislativo de mãos atadas
Nossa atuação é restringida pelo chamado vício de iniciativa, o que só nos desestimula a fazer propostas de maior envergadura
É recorrente a desconfiança da sociedade sobre o trabalho do Poder Legislativo. Se levarmos isso para a esfera municipal, em que a ação parlamentar se encontra mais próxima da população, é perceptível a visão do vereador como despachante e mero revisor ou avalista das propostas do Executivo.
Precisamos mudar esse quadro. Mas, por mais esforço que façamos para debater e aprovar propostas que causem impacto no dia a dia, estamos diante de um obstáculo institucional difícil de ser enfrentado.
A Constituição Federal se preocupa excessivamente em preservar o poder dos Executivos, além de ser imprecisa quanto às atribuições das Casas Legislativas. Está aí a origem da prevalência sistemática do poder do presidente da República, dos governadores e prefeitos sobre os seus respectivos Legislativos.
Estimativa da Câmara Municipal de São Paulo aponta, até 2012, uma média anual de 44 projetos que foram aprovados pelos vereadores e vetados pelo Executivo.
A justificativa para a maioria desses vetos é o chamado "vício de iniciativa": o argumento de que o prefeito tem a prerrogativa exclusiva de propor cada projeto. Isso demonstra como nossa atuação está restrita, o que só desestimula a possibilidade de pensarmos propostas de maior envergadura.
Considero urgente o debate sobre o efetivo papel do Legislativo --e o nosso, dos vereadores, em particular. Isso contribuirá para que a população cobre uma atuação mais condizente de seus representantes.
A discussão faz todo o sentido nesse momento em que o Congresso Nacional debate uma proposta de emenda à Constituição que visa criar o orçamento impositivo.
No Brasil, a peça orçamentária é uma lei autorizativa que permite que o Executivo não seja obrigado a aplicar os recursos aprovados pelo Legislativo. O governo pode selecionar as obras que serão executadas e bloquear o repasse de verbas, deixando de implementar as ações previstas pelos parlamentares.
Essa situação acabaria caso o orçamento fosse impositivo, já que haveria obrigatoriedade de o Executivo cumprir o que fosse referendado pelo Legislativo.
Somos impedidos de atuar em assuntos de reorganização administrativa. Isso é um equívoco, pois poderíamos agir nessa área, desde que as propostas feitas por nós não demandem criação de novos cargos.
A ideia de que os Legislativos não podem elaborar projetos que gerem custos extras precisa ser revista. Devemos ter tal direito, já que é possível condicionar tais propostas a uma provisão de receita anterior.
Da mesma forma, por que não permitir que os parlamentares possam legislar sobre certos aspectos da política tributária? O Executivo tem sempre o direito de sancionar ou não os projetos aprovados pelo Legislativo, o que lhe assegura um controle enorme sobre o que for validado pelos parlamentares.
É preciso também que o Ministério Público e o Judiciário sejam mais comedidos e imparciais em suas ações, em vez de barrar, sempre que possível, nossos projetos.
Exemplo disso é o auto de licença de funcionamento condicionado. O projeto de licença provisória aos estabelecimentos em imóveis sem alvará, de origem legislativa e sancionado pelo prefeito Gilberto Kassab, foi suspenso pela Justiça sob o pretexto absurdo de constituir "vício de iniciativa". Situação semelhante é a proposta dos Conselhos de Representantes, aprovada pela prefeita Marta Suplicy e embargada judicialmente.
Tenho feito contato com Casas Legislativas de todo o país para buscar apoio em favor de uma emenda constitucional que restaure minimamente as prerrogativas do Poder Legislativo. Essa articulação é necessária, pois, caso contrário, continuaremos com braços e pernas amarrados, exercendo nossas atividades de forma meramente complementar e secundária.

Nenhum comentário:

Postar um comentário