segunda-feira, 24 de junho de 2013

Dilma trava novas unidades ambientais

folha de são paulo
Política foi congelada e apenas duas áreas federais protegidas foram criadas, número mais baixo em 20 anos
ONG aponta predileção por exploração mineral e hidrelétrica como razão da paralisação de ao menos 14 processos
JOÃO CARLOS MAGALHÃESDE BRASÍLIAO governo Dilma Rousseff travou a criação de UCs (Unidades de Conservação), uma das principais ferramentas públicas para a proteção do meio ambiente do país.
Em dois anos e meio de gestão, Dilma congelou uma política largamente usada por Fernando Henrique Cardoso e Lula e criou só duas áreas federais protegidas, o número mais baixo em cerca de 20 anos.
Desde a redemocratização, só um presidente decretou menos áreas do que ela --Itamar Franco, responsável por uma unidade. É uma situação similar à que ocorre na atual gestão em relação à expansão da reforma agrária e à homologação de terras indígenas.
Segundo levantamento inédito da ONG ISA (Instituto Socioambiental), há ao menos 14 processos montados pelo Instituto Chico Mendes, órgão federal responsável pelas unidades.
Metade desses processos se refere à mata atlântica, o bioma mais destruído e um dos menos protegidos do país, afirma o ISA.
Integrantes do instituto federal ouvidos pela Folha afirmam que processos como esses estão parados no Ministério do Meio Ambiente e na Casa Civil. Eles não são levados adiante por decisão política, e não técnica, dizem.
Esses funcionários afirmam que faltam força política à ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e interesse pelo tema à presidente, que desde sua passagem pelo Ministério de Minas e Energia vê nas UCs barreiras à exploração hidrelétrica e mineral do interior do país.
Há 12 categorias de unidades, com variados graus de proteção, e nem todas proíbem a construção de usinas ou o uso do subsolo. No entanto, o licenciamento ambiental de qualquer projeto em áreas de conservação é mais complexo e lento.
As UCs têm sido, junto da fiscalização, uma maneira efetiva de o governo barrar a destruição de biomas.
Um estudo de pesquisadores brasileiros e norte-americanos, por exemplo, afirma que a expansão de áreas protegidas foi responsável por 37% da queda do desmatamento da Amazônia entre 2004 e 2006.
Mas, como um relatório ainda inédito da ONG Imazon mostra, essas unidades continuam vulneráveis.
Citando dados produzidos pelo governo, o relatório diz que entre 2011 e 2012 houve um aumento total de 23% no desmatamento das dez áreas protegidas mais desmatadas.
Paulo Barreto, pesquisador do Imazon, diz que "além de não criar unidades Dilma não está cuidando das que foram criadas, ela de fato as está reduzindo", em referência à diminuição de UCs na Amazônia para criar hidrelétricas. "Ao fazer isso, ela manda uma sinalização para quem está ocupando ou tentando ocupar a área: a pressão pode levar a outras reduções."
    OUTRO LADO
    Ministério nega se opor a novas áreas e defende procedimento
    DE BRASÍLIAO Ministério do Meio Ambiente negou que o governo tenha travado a criação de UCs e defendeu o procedimento adotado pelo governo.
    "Não existe trava. O ministério e o ICMBio [Instituto Chico Mendes] vêm revendo as práticas adotadas no passado. Esses procedimentos visam basicamente ao aprimoramento das informações técnicas e legais que fundamentam a proposição das áreas protegidas", informou.
    "A criação de unidades de conservação é um processo complexo e a superação de conflitos antes da criação contribui para garantir o sucesso e a efetividade das áreas criadas."
    Segundo o ministério, não há UCs "paradas" no órgão ou na Casa Civil.
    Antes de ser enviada à presidente Dilma, a proposta passa por "análises técnicas que envolvem, além do próprio ICMBio, o Ministério do Meio Ambiente, outras pastas, os Estados, municípios e setores da sociedade envolvidos", informou a pasta.
    O ministério negou que Dilma tenha determinado suspender a criação de unidades.
    "O governo está atuando no sentido de expandir a área protegida no país, e não apenas na Amazônia. Além de dar continuidade à criação de novas áreas naquele bioma, com um trabalho integrado com o Ministério do Desenvolvimento Agrário que visa avaliar a situação e definir a destinação de mais de 50 milhões de hectares de glebas da União, o ministério está também desenvolvendo esforços e estabelecendo parcerias para viabilizar a criação de novas áreas na mata atlântica, no pantanal, na caatinga, no cerrado, no litoral e mar territorial brasileiros."
      Índios obtêm suspensão de estudo de usinas
      Decisão foi tomada após pesquisadores serem detidos por indígenas mundurucus
      DE SÃO PAULO
      O governo federal suspendeu todos os estudos para a construção de usinas hidrelétricas na bacia do rio Tapajós, na Amazônia, e vai se reunir com indígenas, em data ainda indefinida, para deliberar os parâmetros da consulta que será feita com eles sobre o assunto.
      Duas funcionárias da Funai foram enviadas para apresentar a proposta aos índios da etnia mundurucu em Jacareacanga, cidade paraense na divisa com Amazonas e Mato Grosso, após três biólogos serem capturados pelos índios na sexta-feira.
      Os pesquisadores foram soltos ontem à noite. Djalma Nóbrega, Luiz Peixoto e José Guimarães realizavam estudos de impacto ambiental na área para a construção da usina de Jatobá --os índios temem que suas terras sejam afetadas pela implantação dessa e outras hidrelétricas.
      O trio é funcionário da Concremat, empresa subcontratada pelo Grupo de Estudo Tapajós, que analisa a construção de usinas na região.
      Procurado, o grupo --formado por empresas como Camargo Corrêa, Eletrobras e GDF Suez, entre outras-- informou que vai cumprir a determinação do governo.
      Os mundurucus se recusaram a devolver os equipamentos apreendidos com os biólogos e ameaçaram quem não cumprir a decisão.
      "Vai ser responsabilidade do governo o que acontecer com qualquer pesquisador que aparecer na região", disse Valdenir Munduruku, porta-voz da etnia, por telefone.
      Ele não considerou o recuo do governo uma vitória. "Seria se eles parassem de construir as usinas. Mas sabemos que eles vão querer construí-las e continuar fazendo os estudos."

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