segunda-feira, 24 de junho de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo
Protesto e contrato
Insatisfação nas ruas aponta limites da política econômica brasileira, que exigem novo pacto para recompor poder de investimento do Estado
O grande tema ausente do pronunciamento da presidente Dilma Rousseff na TV, sexta-feira, é também aquele que mais deverá dificultar qualquer pacto com governadores e prefeitos pela recuperação dos serviços estatais: nem ela nem eles se acham em situação de aumentar o investimento público.
Dilma enfrenta pressões crescentes em duas frentes contraditórias. De um lado, precisa restaurar a abalada credibilidade de sua política econômica; de outro, deslanchar ações convincentes para responder às demandas que emergem dos protestos de rua.
No centro da dificuldade está a piora do ambiente econômico. A barreira estrutural ao crescimento do PIB, a renitência da inflação e a disparada do dólar exigem medidas para restaurar a confiança.
O Banco Central age com mais firmeza, subindo juros e intervindo nos mercados de câmbio para conter a desvalorização do real, mas parece estar sozinho em campo.
Sem uma contrapartida convincente do lado da despesa federal, as ações do BC serão incapazes de melhorar o humor de empresários e consumidores. Cumpre que o governo suspenda a maquiagem das contas públicas e se comprometa com a gestão austera dos gastos.
A limitação maior --intransponível, no curto prazo-- está na composição das despesas. Segundo o economista Mansueto Almeida, do total dos dispêndios não financeiros do governo federal (uma fatia de 18,2% do PIB, em 2012), 63% correspondem a três rubricas mandatórias: INSS, programas sociais e custeio de saúde e educação.
Outros 30% são consumidos com pessoal e gastos administrativos, também difíceis de comprimir. A conta do ajuste acaba recaindo sobre os parcos investimentos federais (meros 7% das despesas).
Para manter o ritmo anual de expansão dos gastos sociais das últimas duas décadas --8% a 10% em termos reais--, será inescapável elevar mais os impostos, algo também rechaçado pela sociedade.
A carga tributária brasileira já está próxima de 36% do PIB, enquanto os gastos beiram 39%. Para fechar as contas, o governo emite dívida, cujos juros custam 5% do PIB, o dobro da média mundial.
Fica claro que os frutos ao alcance da mão, sobretudo aqueles derrubados pelo vento favorável no mercado global (hoje em calmaria), já foram todos colhidos.
Para fugir dos recorrentes ajustes improvisados na boca do caixa e chegar um dia a um Estado eficaz no provimento de serviços sociais, será preciso aceitar, num primeiro momento, uma reversão de prioridades. É inescapável cortar gastos para então recuperar a capacidade de investimento, roteiro impopular e muito difícil de negociar quando a tensão ganha a rua.
Após a paralisia dos últimos anos, o novo contrato exigirá que se retomem as reformas administrativa, tributária e previdenciária. Compatibilizar tal imperativo com a satisfação das demandas em desdobramento na praça é o desafio para o qual a presidente ainda tem de demonstrar envergadura.
    EDITORIAIS
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    Modernizar os cartórios
    Pródigo em decisões contra o interesse público, o Congresso se prepara para reexaminar uma proposta de emenda constitucional de 2005 para dar titularidade a donos de cartórios que não cumprem a exigência de concurso público.
    De tempos em tempos, algum político tenta reavivá-la, como fez recentemente o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB). O deputado potiguar justificou a decisão de pôr o assunto em pauta com um suposto "desgaste" após as idas e vindas do projeto.
    A aprovação da PEC, contudo, geraria desgaste muito maior --para toda a sociedade, refém de um arcaico sistema notarial.
    Antes da Constituição de 1988, os titulares de cartórios eram indicados por apadrinhamento político. Depois dela, tornou-se obrigatório preencher os cargos por concursos. Só em 1994 uma lei federal regulamentou os serviços notariais e de registro civil.
    A PEC dos Cartórios propõe que aqueles à frente do serviço por cinco anos ininterruptos ganhem a titularidade, mesmo sem concurso.
    Em maio de 2012, entrou em pauta na Câmara, sem que a votação tenha sido concluída, um texto similar, mas que acrescentava uma condição: a manobra só beneficiaria quem tivesse assumido um cartório até o final de 1994.
    A cláusula extra não basta para salvar a proposta. Os deputados agiriam melhor se, em vez de sacramentar privilégios, buscassem modernizar as regras de serviços cartorários no país.
    Conforme a legislação atual, os cargos, regiamente remunerados, são vitalícios. Além disso, há pouco incentivo para que o tabelião melhore a qualidade dos serviços, já que a concorrência é limitada.
    Uma reforma poderia começar pela simplificação das inúmeras exigências documentais feitas pelos três níveis de governo. Muitas dessas exigências burocráticas são desnecessárias e só servem para empatar a vida dos cidadãos.
    A criação de um regime de concorrência livre nos serviços de registros de caráter privado, como no caso de contratos, também beneficiaria a sociedade. Não há necessidade de submetê-los a um monopólio de concessões, sendo suficiente a formulação de regras para qualquer firma atuar no setor.

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