quinta-feira, 6 de junho de 2013

Pasquale Cipro Neto

folha de são paulo
'A cidade de Oklahoma City'
Foi um tal de ouvir bobagens como 'a cidade de Oklahoma City', que é algo como pedir ou oferecer 'frango chicken'
Parece que, quando chegam aos Estados Unidos, os tornados não assolam apenas algumas regiões do país governado por Obama; assolam também a nossa língua.
Divirto-me com o contorcionismo de alguns apresentadores do rádio e da TV para pronunciarem "Connecticut" do jeito que acham que se pronuncia no inglês americano (algo como "conéricât"). Nessas horas, vem-me à lembrança o que dizia o grande Eça (algo como "Tenho obrigação de falar mal qualquer língua que não seja o português").
Antes que algum chato de plantão venha dizer que Eça isso ou aquilo, vou logo lembrando que é preciso levar em conta o importante papel da figura da hipérbole (exagero) na expressão de algumas ideias. Devagar com o andor!
Se a preocupação com a pronúncia correta não se desse só com palavras inglesas, seria até admirável o esforço da turma do rádio e da TV para pronunciar termos estrangeiros, mas, quando ouço um deles dizer "Djuve" para referir-se à "Vecchia Signora", ou seja, à Juventus italiana, vejo que há muita estrada a ser percorrida. No italiano moderno, o "j" só é usado em alguns nomes de lugares e em alguns nomes e sobrenomes. Sabe como se chama o "j" em italiano? Chama-se "i longo".
Oriunda do alfabeto latino medieval, essa letra, em italiano, é lida como "i" mesmo. Moral da história: "Juventus" não se lê "Djuventus"; lê-se "Iuventus" (com o "e" aberto). Na Itália, o nome desse time costuma ser reduzido para "Juve" ("la Juve", que, pelo amor de Deus, não se lê "la Djuve").
O caso da Juventus italiana é só um de uma série interminável. O estádio do Napoli, outro time da Itália, vive sendo chamado de "San Paôlo". É "San Paolo", que se lê "Sán Páolo". O presidente do Chile (Sebastián Piñera) volta e meia vira "Sebástian"; a cidade espanhola (basca) de San Sebastián também vive virando "San Sebástian", como se fosse inglesa ou estadunidense. E isso porque há um baita acento agudo no "a" da última sílaba. Imagine se não o houvesse...
Nas últimas semanas, quando inclementes tornados varreram parte do centro dos EUA, foi um tal de ouvir bobagens como "a cidade de Oklahoma City", que é algo como pedir ou oferecer um sanduíche de frango chicken. Ora, "chicken" é frango, e "city" é cidade, de modo que "a cidade de Oklahoma City"...
Outra bobagem invencível é o emprego do artigo definido antes de Filadélfia e de Basileia, que são cidades (dos EUA e da Suíça, respectivamente). É um tal de dizer que tal coisa aconteceu "na Filadélfia" ou que o jogo será "na Basileia", como se se tratasse do nome de estados, regiões ou até países. Nada de "na" nesses casos: isso ocorreu "em" Filadélfia; o jogo foi "em" Basileia.
Outra pérola que anda na moda é o tal do "molho ao sugo", presente no cardápio de alguns restaurantes "italianos" Brasil afora. Ora, o "sugo" nada mais é do que o próprio molho, feito em geral com tomates e alguns temperos. Em italiano, "sugo" significa "o suco contido nas frutas ou nas verduras" ou "o caldo que se obtém com o cozimento de alguns alimentos (o caldo de um assado, por exemplo)" ou ainda "o molho que se põe no macarrão e que geralmente se prepara com tomate etc.". Enfim, caro leitor, "molho ao sugo" não passa de "molho ao molho".
Bem, a salada com os termos estrangeiros mal usados e, sobretudo, mal compreendidos e mal estudados é imensa. Quando isso tudo vem temperado com uma boa dose de preguiça ou de falta de curiosidade para investigar, o resultado é um desastre. A gente chega até a achar que o velho Eça tinha razão. É isso.

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