terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Clovis Rossi

FOLHA DE SÃO PAULO

Cuba, hora de apagar a luz?
Liberdade para que os cubanos possam viajar representa o maior desafio para o regime
A revolução cubana começou ontem a enfrentar o que tende a ser o seu maior desafio desde o fim de sua patrocinadora, a União Soviética, faz já 20 anos.
Foi eliminada a infame "tarjeta blanca", a autorização que todo cidadão cubano tinha que solicitar para deixar o país, uma clara violação a um clássico dos direitos humanos, que é o de ir e vir.
Se já houve um considerável êxodo durante a vigência da "tarjeta blanca", a sabedoria convencional manda dizer que a diáspora só tende a aumentar agora.
Reforça essa dedução lógica o fato de os Estados Unidos, claramente o destino preferido pelos cubanos, estarem jogando para até três anos à frente o prazo para as entrevistas indispensáveis para a obtenção do visto de entrada. Um raro acordo entre Washington e Havana prevê a concessão de 20 mil vistos de não imigrantes por ano, um número elevado se se considera que a população cubana é de só 11,8 milhões de habitantes, mais ou menos a mesma da cidade de São Paulo.
Por mais que os paulistanos reclamem da lentidão na concessão de vistos pelos EUA, nunca é preciso esperar três anos para a entrevista. Já há 1,8 milhão de cubanos vivendo nos EUA ou 10% da população da ilha (postas em proporção as respectivas populações, significaria que 20 milhões de brasileiros teriam fugido para um único país).
"Comparados com o resto da população hispânica nos Estados Unidos, os cubanos são mais velhos, têm nível mais elevado de educação, renda familiar mais alta e taxa de propriedade de imóveis também mais alta", informa o braço hispânico do Centro Pew de Pesquisas.
A renda dos cubanos vivendo nos EUA é de US$ 38 mil/ano, o que chega a ser um insulto para os miseráveis salários recebidos em Cuba. Ainda mais que o salário real declinou 73% entre 1989 e 2010.
É razoável supor que os cubanos que agora podem viajar mais ou menos livremente a outros países farão comparações e as chances de Cuba perder são naturalmente elevadas.
Basta lembrar que, dos 941.953 cubanos que viajaram ao exterior entre 2000 e agosto passado, 12,8% não voltaram -e era gente confiável aos olhos do regime, a ponto de ter obtido a "tarjeta blanca".
Por fim, a chamada "atualização" do modelo econômico prevê a dispensa de entre 500 mil e 1,3 milhão de trabalhadores ociosos nas empresas estatais.
Parece improvável que essa massa possa ser absorvida pelos pequenos negócios privados cuja abertura está sendo lentamente autorizada no marco da "atualização".
A possibilidade de viajar e ficar 24 meses fora sem perder a cidadania funcionará como estímulo para que os dispensados procurem colocar-se no exterior.
É importante lembrar que a queda do Muro de Berlim e o consequente fim do comunismo se deram depois que a então Alemanha Oriental não conseguiu conter a avalanche de pessoas que corriam para a porta de saída, cansadas do regime e seduzidas pelo pouco que podiam ver da luminosa Berlim Ocidental.
Acontecerá com Cuba? Respostas a partir de agora.
crossi@uol.com.br

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