quarta-feira, 20 de março de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo

Cautela suprema
Diante das incertezas envolvidas e das cifras em disputa, não há como deixar de reconhecer o bom-senso da ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, ao suspender, em caráter provisório, os efeitos da lei que alterou a divisão dos royalties do petróleo entre Estados e municípios brasileiros.
A decisão foi tomada em ação proposta pelo governo do Rio de Janeiro, que considera inconstitucionais as regras aprovadas pelo Congresso Nacional. Até que o plenário do STF examine a questão -o que deve ocorrer em abril-, continua valendo a lei antiga.
Embora o líder do PT na Câmara dos Deputados, José Guimarães (CE), tenha dito que a sentença "deixou todo mundo tonto", não há surpresa na determinação da ministra. Ela nada mais fez que aplicar ao caso concreto o princípio por trás das medidas liminares: evitar um dano irreparável ou de difícil reparação.
O risco de prejuízo é evidente. A nova fórmula de rateio dos royalties diminui, já em 2013, a receita de Estados e municípios produtores de petróleo -a fatia a que têm direito é reduzida, respectivamente, de 26,25% para 20%, e de 26,25% para 15%.
Em valores absolutos, o impacto imediato da mudança para o Estado do Rio de Janeiro chegaria a R$ 1,6 bilhão, segundo o governador Sérgio Cabral. Espírito Santo e São Paulo também sairiam prejudicados, mas em proporções menores.
Seria um despropósito se esses três Estados e os municípios produtores de petróleo se vissem obrigados a abrir mão de parte de suas receitas antes de a nova lei dos royalties ter sua constitucionalidade examinada. É sem dúvida mais prudente aguardar a decisão definitiva do Supremo -que tem diante de si uma questão delicada.
Os parlamentares aprovaram a mudança das regras mesmo para áreas petrolíferas já licitadas, não só para contratos futuros, como seria o ideal. Afetaram, assim, a legítima expectativa de diversos Estados e municípios. O desequilíbrio da norma, contudo, não basta para torná-la inconstitucional.
Caberá ao plenário do Supremo dizer se a nova lei viola princípios constitucionais, como o direito adquirido (por atingir contratos em vigor) ou a segurança jurídica (por comprometer receitas previstas).
Seja como for, o STF precisa decidir o quanto antes e da forma mais transparente possível. Prolongar o cenário de incertezas é ruim, mas passar a impressão de que o Judiciário tomou algum partido que não o da Carta seria ainda pior.

    EDITORIAIS
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    Alertas ignorados
    Governantes falham na realização de obras e moradores reagem de modo irracional ao se recusarem a abandonar áreas de risco
    Ninguém desconhece que os meses de verão correspondem no Brasil a um período de forte incidência de chuvas. Tampouco se podem ignorar as catástrofes ocasionadas pelos temporais da estação, que ora se repetem, com a morte de mais de 20 pessoas -além de centenas de desabrigados- na região serrana fluminense.
    Mais uma vez, deslizamentos de encostas, que também se verificaram no litoral norte paulista, trazem consequências funestas para a população que vive nessas áreas de risco -em geral, famílias de baixa renda em habitações precárias.
    O aumento do processo de favelização conspirou para agravar as consequências dos temporais. Em janeiro de 2011, como se sabe, mais de 900 pessoas perderam a vida na serra do Estado do Rio -naquela que se considera a maior tragédia provocada por causas naturais no país.
    Em meio ao desastre, autoridades municipais, estaduais e federais apressaram-se em anunciar medidas para remediar a situação e prevenir novas emergências e mortes. As chuvas particularmente volumosas dos últimos dias demonstram que as providências não foram suficientes.
    Em primeiro lugar, porque parte delas nem sequer se transformou em realidade. Um misto de burocracia, inépcia administrativa e conveniências políticas, nos planos federal, estadual e municipal, tem contribuído para a baixa execução de recursos em obras preventivas ou voltadas para abrigar as vítimas das intempéries.
    Em 2012, apenas 32% (R$ 1,8 bilhão) das verbas federais destinadas a esse fim foram desembolsadas. E, desde agosto do ano passado, a região serrana conta com R$ 545 milhões para dragagem, desassoreamento e canalização de rios, mas não se tem notícia de licitação concluída.
    Outro aspecto a levar em conta é a resistência de moradores em abandonar suas casas quando alertados sobre riscos iminentes. Embora possa ter soado como nota inoportuna, no momento da tragédia, a declaração da presidente Dilma Rousseff sobre famílias que não responderam aos alertas, trata-se de um tema a ser enfrentado.
    O prometido Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad) foi inaugurado em 2012 para avisar a população sobre a possibilidade de enchentes ou deslizamentos. Na serra fluminense, sirenes soaram, mas muitos ficaram nos locais ameaçados.
    É preciso que as autoridades acelerem as obras e, ao mesmo tempo, atuem de maneira mais incisiva para que as zonas sob maior risco sejam evacuadas. Compreendem-se os dilemas de quem termina por permanecer em casa, mas é uma decisão irracional, cujas consequências podem ser fatais.

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