segunda-feira, 4 de março de 2013

Jô Soares faz 25 anos de "talk show" e lança DVD com melhores entrevistas

folha de são paulo

ALBERTO PEREIRA JR.
DE SÃO PAULO

Há 25 anos, Jô Soares, 75, trocou o humor rasgado e uma galeria de 200 personagens de sucesso na Globo pelo sonho de ser entrevistador.
No SBT, inspirado pelos americanos Jack Paar e Johnny Carson, estreou em 16 de agosto de 1988 o "talk show" "Jô Soares Onze e Meia", que levou prestígio e anunciantes à emissora.
De volta à Globo desde 2000, Jô Soares retoma hoje a temporada do seu "Programa do Jô" e anuncia o lançamento, em DVD, das suas principais entrevistas, em ambos os canais.
"Esse é um tipo de parceria benéfica. Não que houvesse essa intenção, mas o programa se tornou uma espécie de registro da história do Brasil desse período", diz ele, que chegou a pedir no SBT que as fitas de sua atração não fossem apagadas.
O material dos DVDs ainda está em seleção e deve trazer um apanhado de encontros raros, como o com Luís Carlos Prestes (1898-1990).
"Entrevistas marcantes, você pode botar o Roberto Carlos, o Chico Buarque, mas também o gago que se candidatou a vereador e outros tantos desconhecidos. A conversa mais marcante, espero que seja sempre a próxima."
Muitas personalidades declinaram o convite para se sentar na poltrona do artista, como Silvio Santos.
"É a pessoa a quem eu devo a oportunidade de ter feito o programa. O Silvio é um convidado que não consegui e sei que nunca irei entrevistar", lamenta.
Adriano Vizoni/Folhapress
O apresentador Jô Soares em seu apartamento, em São Paulo
O apresentador Jô Soares em seu apartamento, em São Paulo
Dos 13 mil bate-papos, três convidados são recorrentes: o cartunista Ziraldo, com 20 participações, e o cantor Caetano Veloso e o ex-presidente Lula, com 13 cada um.
"Certa vez, num dia em que seria entrevistado, um dente meu quebrou e eu fui ao programa de máscara", lembra Ziraldo. "Há dias em que o Jô está desinteressado pelo entrevistado, mas quando ele se interessa, é imbatível."
A última entrevista de Lula, recorda o apresentador, foi antes de sua eleição presidencial, em 2002. Depois de eleito, escândalos de corrupção envolvendo petistas, como o mensalão, o desencantaram. "Não direi que o Lula sabia ou não. Mas podia ter tomado uma posição mais forte, mais exigente..."
Outra quem lhe deve uma visita é a presidente Dilma Rousseff. "Ela foi ao programa como ministra. Logo depois da eleição, falei com uma assessora, que me disse que ela estava priorizando as jornalistas mulheres."
EXIBIDO, CLARO
Admirado por uns e rechaçado por outros, Jô Soares admite já ter falado mais do que seus entrevistados.
"Eu corrigi isso. Mas não era exibicionismo. Como todo artista, sou exibido, claro! Eu entrava em discussão com o convidado. Ficava entusiasmado e não me segurava."
"No Brasil, há pouco 'talk show'. É a melhor forma de voyeurismo: ficar olhando duas pessoas conversando sobre coisas que tem que ser interessante", afirma ele, que, embora avesso a redes sociais, considera seu programa um imenso Twitter.
Editoria de Arte/Folhapress
BEIJO DO GORDO 13 mil entrevistas em 25 anos
BEIJO DO GORDO 13 mil entrevistas em 25 anos
Segundo ele, a liberdade editorial é cláusula indispensável para sua atração. "No meu programa nunca existiu [jabá, prática de fazer entrevista em troca de dinheiro]. Isso polui a credibilidade!"
Ele também evita subir em palanques políticos. "Acho que a posição correta para o artista é o de anarquista, no sentido de não se engajar politicamente por esse ou outro candidato. Para estar sempre pronto para a crítica."
E o que Jô Soares espera dos próximos anos? "Muitas entrevistas! Não vou cansar tão cedo. O artista só se aposenta quando quer ou quando está gagá", dispara.


OPINIÃO
'Talk show' exige preparo; Jô, às vezes, demonstra cansaço
MAURICIO STYCERCOLUNISTA DA FOLHAAlguns entrevistados rendem mais, outros menos, diz o senso comum no esforço de explicar a irregularidade dos "talk shows". A explicação não convence o fã do gênero, hoje com acesso, via TV paga e internet, a mais de uma dezena de programas diários com formato quase idêntico.
O que diferencia e dá sabor a estes programas é o entrevistador, não importa quem esteja sentado diante dele. Famoso ou anônimo, extrovertido ou tímido, nada disso importa se o mestre de cerimônias está bem preparado e tem o que dizer para provocar o seu entrevistado.
Pesa sobre Jô Soares, e também sobre seus "concorrentes" (Danilo Gentili e Luciana Gimenez), a sensação de que muitas vezes não se preparam adequadamente para o encontro que terão com os seus convidados.
Creio ser este o pecado capital num tipo de programa que, como o nome diz, é uma mistura de conversa com show. O público espera informação e diversão.
Não importa, como repete-se muito sobre Jô, se ele fala mais do que seus entrevistados, ou se é exibido. Não vejo isso como problemas.
Incomoda quando o entrevistador não tem nada de interessante a dizer ou se ele se repete. Não demonstra estar, de fato, curioso sobre o que pode acontecer no encontro com o convidado.
Não é sempre necessário -como fez Oprah Winfrey ao entrevistar Lance Armstrong- ter 112 questões preparadas. Aquele foi um caso excepcional, uma entrevista com um herói nacional exposto por causa de doping.
Mas não convém subestimar entrevistados. Não sei se por cansaço, no caso de Jô, ou por arrogância, frequentemente vejo conversas na televisão brasileira que parecem conduzidas com o objetivo de simplesmente preencher o tempo.
Pior, às vezes, como ocorreu com Marília Gabriela diante do pastor Silas Malafaia, no SBT, a surpresa ou o desconhecimento podem levar a embates rudes, que acabam resultando desfavoráveis a quem se coloca na posição de questionador.
Inspirado no modelo americano, o "talk show" nacional deveria importar também a poção milagrosa que deixa apresentadores como David Letterman, há 30 anos fazendo a mesma coisa, com energia, bom humor, curiosidade e raciocínio rápido.

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