sexta-feira, 31 de maio de 2013

Certo, só que errado - Editoriais FolhaSP e Charge

folha de são paulo - Charge
Certo, só que errado
Defesa da independência do Congresso pelo senador Renan Calheiros convenceria mais se interesse fisiológico do PMDB não falasse tão alto
Estaria sendo vítima de grave surto alarmista quem dissesse que a democracia corre perigo no Brasil. Mesmo assim, e este parece ser um dos paradoxos políticos do país, as instituições democráticas passam por um constante e gradativo processo de desmoralização.
Chega a tal ponto o desgaste mútuo entre Legislativo e Executivo, por exemplo, que mesmo quando agem corretamente tudo se dá como se estivessem, ao mesmo tempo, sempre errados.
Veja-se o caso das últimas manifestações do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Tradicional aliado do governo Dilma Rousseff --como tem sido dos anteriores, aliás--, o senador protagoniza agora um momento de rebeldia, a que emprestou considerável ar de elevação soberana do Poder que preside.
Por decisão sua, deixou de ser incluída na pauta de votação no Senado a medida provisória que reduz as tarifas de energia elétrica. A iniciativa, anunciada pela presidente Dilma em janeiro, vinha sendo posta em prática desde o mês seguinte --mas dependia do aval definitivo do Congresso.
Aprovada apenas na última terça-feira pela Câmara dos Deputados, foi levada às pressas ao Senado, com prazo dos mais exíguos para ser analisada. Perderá validade, com efeito, se não for aprovada até segunda-feira.
Como presidente do Senado, Calheiros recusou a votação de afogadilho. "A questão não é política", declarou. "O governo não pode apequenar o Senado." Embora relevantes, MPs "não são mais importantes do que as instituições, do que a democracia".
Calheiros se referia, também, a um acordo entre governo e lideranças da base parlamentar, pelo qual só aceitaria a votação de propostas do Executivo se chegassem ao Senado pelo menos sete dias antes de seu prazo de vencimento.
O compromisso vinha na esteira das dificuldades criadas na Câmara com a votação da MP dos Portos. Na ocasião, o desafio ao Executivo proviera do líder do aliado PMDB na Casa, Eduardo Cunha.
Agora, foi a vez de seu correligionário no Senado impor ao governo mais desconfortos. Tanto no caso dos portos quanto no das tarifas de eletricidade, são abundantes os argumentos no sentido de que as iniciativas do Planalto atendem a um claro interesse público.
Acerta o Executivo em lutar pela sua aprovação. Acerta, em teoria, o Legislativo quando se recusa a aprovar automaticamente as medidas do governo.
Fala com nobreza o presidente do Senado, Renan Calheiros, ao defender as prerrogativas da instituição. O problema é que outro Renan Calheiros, o peemedebista, fala uma língua diferente --a que traduz, como na Câmara, os reclamos fisiológicos por trás de toda rebeldia da base parlamentar.

EDITORIAIS
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Munição para a Síria
O fim do sangrento conflito entre o governo sírio e uma miríade de grupos insurgentes deveria ser a prioridade dos países com mais influência na região. Mas a renovada disposição russa de continuar vendendo armas para o aliado Bashar al-Assad incentiva seu regime ditatorial a manter bombardeios em lugar de buscar a negociação.
Ao persistir na ajuda militar, desta vez com a venda de mísseis terra-ar S-300 (uma primeira leva já teria chegado à Síria), Moscou sabota a própria iniciativa conjunta com os Estados Unidos para organizar uma conferência de paz entre governo e opositores, em Genebra.
As chances de alcançar algum acordo são mínimas no momento. Assad, respaldado pela Rússia e reforçado pelo grupo radical libanês Hizbullah, declarou, em entrevista ao diário argentino "Clarín", que concorrerá às eleições no ano que vem e acusou potências ocidentais de não almejar de fato o fim do conflito.
Do outro lado, a confusa coalizão opositora, formada por dezenas de facções, decidiu nesta semana --após demorada discussão-- que só deporá armas caso o ditador sírio se disponha a renunciar.
Com a solução pacífica mais distante, e em clara represália à Rússia, a União Europeia suspendeu o embargo de armas para os rebeldes. Abriu caminho, assim, para França e Reino Unido, principais defensores da medida, municiarem grupos rebeldes.
A decisão europeia visa ainda reforçar a oposição diante da crescente presença de extremistas islâmicos, principalmente a frente Al Nusra, grupo aliado da Al Qaeda e listado como terrorista pelos EUA.
No campo diplomático, o resultado é que Rússia e União Europeia passaram a trocar acusações de incentivar ainda mais a violência. Em dois anos, os combates mataram mais de 70 mil pessoas e produziram 1,4 milhão de refugiados.
Tampouco contribui para a paz o entrelaçamento do conflito sírio com interesses de países vizinhos, como Arábia Saudita (apoiadora de alguns grupos de rebeldes extremistas), Irã (aliado de Assad) e Israel (inimigo de Assad, inquieto com o envolvimento do Hizbullah).
O resultado é que, divididas, as potências mundiais e seus aliados na região conturbada não coordenam pressões para que os sírios tirem o dedo do gatilho. Ao contrário, tudo indica que os estoques de munição só fazem crescer.

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