sexta-feira, 10 de maio de 2013

Zumbis multilaterais - Moisés Naím

folha de são paulo

Se Azevêdo não conseguir destravar o jogo na OMC, a organização sofrerá o mesmo destino zumbi que a OEA
O que é mais importante: ganhar a disputa para ser o país-sede dos Jogos Olímpicos ou indicar o novo diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC)?
Os Jogos Olímpicos têm obviamente maior visibilidade mundial ""e o prêmio para o organiza é o privilégio de gastar montanhas de dinheiro e receber um tsunami de turistas.
Indicar o chefe da OMC é um sucesso menos visível para a maioria dos observadores, mas essa é uma organização cuja ação pode influenciar a vida de bilhões de pessoas.
Trata-se do organismo que se ocupa de garantir que os países não trapaceiem no comércio, não impondo obstáculos às importações ou estimulando artificialmente as exportações. Quando a OMC faz bem o seu trabalho, o impacto é imenso.
Por exemplo, a adesão da China à OMC, em 2001, mudou o mundo, já que o gigante acelerou a liberalização de seu comércio internacional.
Lamentavelmente, desde então a OMC perdeu relevância e corre o risco de se tornar só mais um membro do clube dos zumbis multilaterais.
Estou falando de organizações internacionais com missões enaltecedoras, bonitos edifícios em capitais nas quais se vive bem, funcionários poliglotas que trabalham (ou ao menos vão ao escritório) todos os dias, mas não exercem maior impacto.
Muitos organismos multilaterais, ainda que indispensáveis em teoria, se provam irrelevantes na prática.
É o caso da Organização dos Estados Americanos (OEA). Uma instituição multilateral onde estejam representados todos os países do hemisfério, e com a missão de defender a democracia e evitar conflitos, é uma grande ideia.
Hoje em dia, a OEA está muito longe de ser uma organização tão admirável como sua razão de ser indicaria. E como ela, outras organizações se tornaram zumbis: parecem vivas, mas estão mortas. Deixaram de ter relevância mas ninguém tem poder, ou interesse, em fechá-las.
E é esse o difícil desafio que o competente diplomata Roberto Azevêdo enfrenta ao ser eleito. Há muito tempo, a OMC não consegue um sucesso. O sucesso teria sido concluir a rodada Doha de negociações, iniciada em 2001 e que até hoje não produziu resultados concretos, porque é impossível concretizar acordos entre EUA, Europa e Japão e países como Brasil, Índia, China e África do Sul.
E enquanto as organizações mundiais pelas quais a OMC era responsável não se concretizavam, duas coisas importantes ocorreram. A primeira é que, nos dez últimos anos, o crescimento do comércio internacional disparou. Nem mesmo a crise econômica foi capaz de detê-lo.
Quando estourou a crise, muita gente pensou que ela desencadearia uma onda de protecionismo, mas felizmente não foi isso que aconteceu.
A segunda é que, em vez de esperar por um acordo mundial que não parece a ponto de ser obtido, os países começaram a fechar acordos regionais --na prática, complicando as negociações mundiais. Enquanto isso, na OMC o jogo segue travado.
E cabe a Azevêdo destravá-lo. Se ele não for capaz disso, a OMC sofrerá o mesmo destino zumbi que a OEA. E isso seria lamentável. Boa sorte!
@moisesnaim

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