sábado, 8 de junho de 2013

Alexandre Vidal Porto

folha de são paulo
Selva de bestas assassinas
Em casos de violência como a brasileira, o rumo a seguir é inverso ao da flexibilização das penas
Ainda não havia assistido a "O som ao redor". Estava curioso. Muita gente tinha elogiado o filme. Um crítico importante do "New York Times" o havia incluído em sua lista dos dez melhores de 2012. No Japão, porém, ele ainda não foi exibido comercialmente.
Faz uns dias, encontrei-o para aluguel on-line. O filme é uma beleza, mas não vou falar dele aqui. Basta saber que um dos vários temas que o diretor Kleber Mendonça Filho aborda é a falta de segurança nas cidades brasileiras. No caso, a cidade é o Recife.
Com o filme ainda na cabeça, tive notícias de que uma amiga cearense se mudara de Fortaleza por medo da violência. Nesse mesmo dia, soube pela televisão japonesa que um dentista tinha sido queimado vivo por assaltantes em São José dos Campos. Coisa semelhante já havia acontecido no ABC paulista.
A criminalidade não é monopólio do Brasil. Várias cidades do mundo têm níveis descontrolados de violência, especialmente na América Latina, onde ocorrem 43% dos homicídios dolosos do mundo.
De acordo com relatório da ONG mexicana Conselho Cidadão para a Segurança Pública e Justiça Penal, 41 das 50 cidades mais violentas do mundo se encontram na região. Quinze são brasileiras. Nesse ranking, ser primeiro é uma vergonha.
As causas da criminalidade são complexas e vinculadas. No Brasil, exclusão social, corrupção, violência policial, ineficiência da máquina pública e baixos níveis de educação são apenas alguns dos elementos da equação.
Além disso, as péssimas condições de grande parte dos presídios inviabilizam a ressocialização dos detentos. 70% deles reincidem. Condições degradantes formam cidadãos degradados. É o que o nosso ineficiente sistema prisional produz.
Mas criminalidade tem remédio. Bogotá saiu do ranking das 50 cidades mais violentas à custa de políticas públicas duras, mas eficazes. No final dos anos 80, Nova York controlou seu problema de violência endêmica com um programa de tolerância zero. Em ambos casos, policiamento ostensivo e sanções duras conseguiram reverter um processo que parecia irreversível.
As penas alternativas e medidas socioeducativas ajudam, mas não podem servir como paliativo para problemas como sobrecarga judiciária e superlotação prisional. A experiência parece indicar que, em situações de violência endêmica grave, como a brasileira, o caminho a seguir é inverso ao da flexibilização das penas. Não podemos tratar tuberculose com aspirina.
Qualquer aluno de direito aprende que lei sem sanção não tem eficácia. Não é porque a criminalidade tem causas vinculadas à injustiça social que ela deve ser tolerada. É uma questão de vida ou morte. As autoridades brasileiras têm a obrigação de proteger os cidadãos. Se não o fazem, não estão à altura dos cargos que detêm.
Uma cidade em que se pode ser queimado vivo é como uma selva em que se pode ser comido por leões. Parece que nossas cidades se tornaram em uma selva de bestas assassinas. Não dá para deixar assim.

    Nenhum comentário:

    Postar um comentário