quinta-feira, 4 de julho de 2013

Musical à brasileira - Nelson de Sá

folha de são paulo
O espetáculo 'A Madrinha Embriagada', com direção de Miguel Falabella, marca a entrada do Sesi nesse gênero teatral
NELSON DE SÁDE SÃO PAULODurante o ensaio de anteontem de "A Madrinha Embriagada", em São Paulo, o tradutor e diretor Miguel Falabella primeiro mudou o nome da personagem de Saulo Vasconcelos, de Feldzieg para Iglesias. Foi para homenagear Luiz Iglesias, produtor e depois marido da célebre atriz Eva Todor, 93 --que estreou no palco em 1934, como bailarina de uma revista musical de Iglesias, "Quanto Vale uma Mulher".
Mais alguns minutos e, ao passar uma cena, o diretor decidiu mudar também o nome da personagem de Kiara Sasso, de Kitty para Eva.
Vasconcelos e Sasso, dois dos principais atores-cantores a surgirem da explosão do musical na última década no Brasil, interpretam um produtor e uma corista neste espetáculo que celebra os musicais de um século atrás.
Mas era originalmente uma celebração dos musicais da própria Broadway, quando o espetáculo "The Drowsy Chaperone" estreou em Nova York, em 2006, e conquistou cinco prêmios Tony.
Falabella não gostou e, na adaptação, mudou tudo, a começar do título. De "a letárgica dama de companhia", na tradução literal, trocou para "a madrinha embriagada".
"Tem que trazer para nós, para o Brasil, senão fica muito chato", afirma ele, que está em cartaz como ator até este domingo com "Alô, Dolly!", da Broadway, mas se diz cansado de musicais estrangeiros.
"A Madrinha Embriagada", assim, é apresentada como uma versão brasileira do espetáculo americano de 1928 feita por um fictício "João Canarinho" e que teria estreado também em 1928 no teatro São Pedro, na Barra Funda.
Nas mãos de Falabella, virou uma "revue modernista", revista musical com referências do movimento modernista, como a cena em uma mansão da avenida Paulista onde vive uma quatrocentona com seus quadros de jovens artistas paulistanos.
"Está na hora do musical nacional", diz o diretor, que já anuncia seu próximo trabalho: comprou os direitos de "Memórias de um Gigolô", de Marcos Rey, e vai adaptá-lo para musical, com composições de Josimar Carneiro.
Falabella fala seguidamente sobre o elenco que juntou. "É a nata do teatro musical brasileiro, vozes lindas, gente de Brasília, de Minas, do Rio de Janeiro", repete.
MILHÕES
O brasiliense Vasconcelos e a carioca Sasso, por exemplo, começaram a atuar juntos em "A Bela e a Fera", há dez anos. Desde então já dividiram o palco em "O Fantasma da Ópera", "A Noviça Rebelde" e "Mamma Mia!".
Sara Sarres, que faz Jane, atuou em "Fantasma", "Les Misérables" e "Cats", entre outros. É ela quem responde pelo quadro mais memorável de "The Drowsy Chaperone", com a canção "Show Off", em que anuncia que quer deixar o palco, quer deixar de "aparecer", sem maior convicção.
Stella Miranda, a "madrinha", é parceira de Falabella desde os anos 1980 e trabalhou com ele, no Rio, nos musicais "South American Way" e "Império". Adriana Caparelli, que faz Dora, vem dos musicais do Teatro Oficina.
O elenco de 25 reúne atores e bailarinos que estiveram em boa parte dos musicais da última década, apresentados em teatros paulistanos que acabaram se especializando no gênero, como Bradesco, Alfa e Renault, ex-Abril.
O Teatro do Sesi, agora, não economiza para entrar no grupo. "A Madrinha...", que estreia no dia 14 de agosto, tem seu orçamento de R$ 12 milhões bancado integralmente pela instituição, sem apoio de leis de incentivo.
Os números da produção são grandiloquentes: dividindo o palco com o elenco de 25, uma orquestra com 15 músicos; temporada de 11 meses, totalizando 325 apresentações, oito por semana; público final de 148 mil pessoas.
    Projeto quer formar atores para esse tipo de teatro
    DE SÃO PAULO
    Depois de dois anos atuando em teatro musical na Cidade do México, em espetáculos derivados da Broadway e do West End londrino, como "O Fantasma da Ópera" e "Les Misérables", Saulo Vasconcelos chegou a São Paulo em 2001 e encontrou "uma terra de ninguém".
    Entrava para fazer os primeiros testes de elenco, as primeiras audições, e "não havia concorrência". Eram poucos os atores com formação musical, então.
    Naqueles primeiros passos da retomada do gênero em São Paulo e no Rio, nem o público sabia como agir --desacostumado, por exemplo, a aplaudir os quadros musicais separadamente. "A gente puxava as palmas da coxia", conta Vasconcelos, rindo.
    "Hoje a concorrência é maior, e o público, mais experiente." Mas ele vê necessidade de mais formação e é um dos coordenadores de um programa paralelo à produção de "A Madrinha Embriagada", no Sesi: a partir de agosto, oficinas de "vivência" de teatro musical; a partir de março do ano que vem, um curso de três anos.
    O projeto foi levado ao Sesi pela produtora Atelier de Cultura, a mesma do espetáculo. Além de Vasconcelos, estão envolvidos nisso os atores Cleto Baccic, que dirige a produtora, Sara Sarres e Vivian Albuquerque, entre outros profissionais do gênero musical.
    O grupo visitou quatro escolas tradicionais nos EUA, inclusive a Tisch, de Nova York, e duas no Reino Unido. "E ouvimos 50 personalidades dos musicais no Brasil, para levantar as necessidades do mercado."
    A primeira turma deve ter 90 alunos, selecionados em audições. De início, os estudos se restringirão a atores, mas Vasconcelos admite também a possibilidade de formar compositores "mais para a frente", uma das necessidades levantadas.
    Não é a primeira iniciativa de formação em musicais, em São Paulo. Dez anos atrás, depois dos primeiros espetáculos de maior repercussão no gênero, surgiram dois cursos, um da Casa de Artes OperÁria, na Mooca, zona leste, e outro na escola Wolf Maya, no shopping Frei Caneca.

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