domingo, 28 de julho de 2013

O Rio se farta de coxinhas - Alvaro Costa e Silva

folha de são paulo

O Rio se farta de coxinhas


 
ALVARO COSTA E SILVA
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A coxinha é de origem francesa. Mas, entre nós, de aclimatação paulista. Segundo historiadores da alimentação, a receita aportou com a Corte portuguesa, em 1808, e cresceu na preferência popular com a industrialização de São Paulo: era um substituto mais barato e prático das coxinhas de frango com osso que eram vendidas nas portas das fábricas. Massa de farinha de trigo e caldo de galinha, com recheio de carne de frango.
E o "coxinha"? De origem paulista, é gíria usada de forma depreciativa para identificar certo grupo de pessoas cujo comportamento é elitista ou afetado.
Com a rapidez da internet, via redes sociais, o termo chegou ao Rio esnobando as ruas. Os cariocas não só já sabem identificar um "coxinha" como adotaram a classificação como se ela tivesse surgido numa birosca do morro da Serrinha, nos arredores do Arpoador ou nos condomínios fechados da Barra da Tijuca -esse último, em teoria, um lugar "coxinha".
Como toda gíria que se preze, foi usada a princípio como código em um organismo fechado -a cadeia, a caserna, a zona de prostituição- para só depois conquistar novos territórios. O que espanta é que esse território hoje seja o Rio.
Os cariocas se acostumaram a ditar modas e gírias para o Brasil inteiro. Pelo que se escuta, não mais. Geograficamente no centro da polaridade norte-sul, cabeça política até a mudança da capital para Brasília, com tendência cosmopolita, o Rio chegou a ter o padrão da fala no país. Finalmente sua praia foi invadida. E não apenas por "coxinhas". A detestável "balada" é de uso corrente. Espera-se para breve a chegada de "perifa", "rasgado", "parça", "breja", "monstra" e outros verbetes do coxês-português.
É UM ASSOMBRO
Diante da invasão, nativos radicais já ensaiam protesto: carioca que diz "coxinha" é "coxinha". O verdadeiro carioca come coxinha.
O cantor e compositor Gabriel Cavalcante, o Gabriel da Muda, é especialista em besteiras de botequim, de preferência as bebíveis e comestíveis. Indica como melhor coxinha do Rio a preparada no Bar da Gema (r. Barão de Mesquita, 615, Tijuca). É tão especial que é servida apenas um dia por semana: às terças. E é personificada: atende por coxinha da Luiza, com todo o respeito, em homenagem à proprietária e cozinheira. Custa R$ 4, e a receita é segredo de família.
A da tradicional Confeitaria Colombo, fundada em 1894, continua um assombro: é do tipo coxa creme, com a coxa propriamente dita e a sobrecoxa cozidas no caldo de legumes e ervas (R$ 10,80 a unidade). Na hora do almoço, é a que mais sai nos luxuosos salões da rua Gonçalves Dias, 32, centro.
CHORO MODERNO
O choro flui e reflui conforme as ondas da cidade e sempre teve pouso certo nos quintais dos bairros ao longo dos trilhos da antiga Leopoldina Railway e em rodas de botequins menos barulhentos. Expoente da nova geração, Abel Luiz toca cavaquinho, bandolim, viola caipira e violão tenor aos sábados, a partir das 14h, no bar Adelos (r. do Mercado, 51, Centro).
Com o violão de sete cordas de Marlon Mouzer e o percussionista Reinaldo Pestana, Abel fundou o grupo Choro Novo, que acaba de lançar o CD "Sotaques e Influências" (Pupurri Cultural, R$ 15), uma reflexão sobre as possibilidades na contemporaneidade de um gênero surgido em ambientes -vá lá- "coxinhas" do século 19 e depois avacalhado nas ruas.
AI, SE EU TE PEGO
João Paulo 2º preferia o aterro do Flamengo para missas campais. Como bom argentino, o papa Francisco cruzou o Túnel Novo e aportou em Copacabana, bairro que concentra o maior número de idosos no país. Foi um choque ver os velhinhos lado a lado com os peregrinos, cerca de 800 mil, a maioria mulheres com menos ou pouco mais de 20 anos.
Nem Fausto Fawcett, em seus maiores delírios musicais, poderia imaginar que Copacabana se transformaria no real "purgatório da beleza e do caos".
Em frente aos inferninhos da avenida Prado Júnior, as lolitas de Cristo passavam cantando aos berros "Ay, si Yo te Agarro", versão em espanhol para o sucesso brega-sertanejo.
Haja "namoro santo", como proposto pela igreja, para conter tanto entusiasmo.
ALVARO COSTA E SILVA, o "Marechal", 50, é jornalista.

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