quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

O maestro do rap [Sabotage]

FOLHA DE SÃO PAULO

Dez anos após ser assassinado, Sabotage ganhará disco póstumo com músicas inéditas, documentário, longa de ficção e show em sua homenagem
LUCAS NOBILEDE SÃO PAULO
Era julho de 2002 na favela do Canão, no Brooklin, zona sul de São Paulo, quando Mauro Mateus dos Santos, o rapper Sabotage, disse ao diretor de cinema Ivan Vale Ferreira: "Poderia morrer amanhã, minha parte eu já fiz".
Seis meses depois, aos 29 anos, morreu alvejado por cinco tiros, após deixar a mulher no trabalho. O autor do crime, Sirlei Menezes da Silva foi condenado a 14 anos e cumpre pena em regime fechado.
Amanhã completam-se 10 anos da morte de Sabotage, e projetos ligados ao MC começam a sair do papel. Dois deles, um documentário e um disco póstumo com músicas inéditas, seguem caminhos parecidos em sua realização: levaram mais de uma década para serem lançados.
O álbum, com previsão de lançamento entre março e abril, terá o título de "Canão Foi Tão Bom", com produção dos criadores da banda Instituto, Daniel Ganjaman, Tejo Damasceno e Rica Amabis.
Na semana de sua morte, Sabotage trabalhava no que seria o seu segundo disco. Gravou de segunda a quinta. Morreu na sexta.
Dez anos depois, o álbum terá as músicas pré-gravadas naquela semana, outras três com o Instituto e mais uma com participação de Wanderson "Sabotinha", filho do rapper, ao lado do Sepultura.
Terá ainda o rap "Sai da Frente", que ficou de fora da trilha de "Carandiru" (2003), de Hector Babenco, com letra feita pelo cineasta em parceria com Sabotage.
"Tinha muito problema com os direitos das músicas, cuidados por gente do tráfico antes de o filho do Sabotage assumi-los há dois anos. Toda a grana irá para a família", explica Ganjaman.
A confiança no Instituto era natural. Foi o coletivo -ao lado de Quincas Moreira, Zé Gonzalez, Helião e Sandrão (RZO), Rappin Hood, Mano Brown e Ice Blue, dos Racionais MCs- que ajudou Sabotage a erguer o único disco de sua vida.
Lançado em 2000, "Rap É Compromisso" se tornou um clássico do rap nacional, com frases eternizadas, como a que batiza o álbum, além de "respeito é pra quem tem".
FICÇÃO E DOCUMENTÁRIO
Sabotage, que atuou nos filmes "O Invasor" (2001), de Beto Brant, e "Carandiru", também terá sua vida filmada. Com direção de Walter Carvalho, o longa ainda está em fase de roteirização.
Mais adiantado do que a ficção está o documentário "O Maestro do Canão", de Ivan Vale Ferreira.
Com 70% das filmagens realizadas, o diretor acaba de se associar à produtora Elixir, de Denis Feijão, que produziu "Raul Seixas - O Início, o Fim e o Meio", sobre a vida do roqueiro baiano.
Além disso, Ferreira também fechou parceria para exibir seu documentário no Canal Brasil, mas ainda busca patrocínio para finalizar o filme e distribui-lo nos cinemas.
O documentário exibirá mais de 20 entrevistas, imagens inéditas de arquivos e trechos em animação.
"Recorremos à linguagem de HQ para cobrir alguns buracos, como a infância dele, da qual temos poucas imagens", conta o diretor.
O filme terá depoimentos de Brown, Rappin Hood, Helião, Thaíde, Beto Brant, Babenco, Ganjaman, entre outros que o comparam a Che Guevara, Garrincha, Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro.
Apesar disso, Feijão diz que a ideia do filme não é canonizá-lo. "Servirá para desmistificar a figura dele."
Em abril, mês em que o músico completaria 40 anos, será realizado um tributo, sem local definido, com os principais nomes do rap nacional.

Filme detalha ligação com o tráfico de drogas
DE SÃO PAULOO documentário "O Maestro do Canão" ajudará a esclarecer passagens da vida de um artista que se transformou numa espécie de mito do rap nacional.
Poucos sabem, mas Sabotage nunca foi preso. "Ele teve apenas uma passagem pela Febem. Quem foi preso foi o irmão dele, o Deda. Quando perguntavam se ele tinha sido preso, ele não afirmava nem negava. Para ele, ajudava a manter uma imagem", diz o diretor Ivan Ferreira.
As visitas ao irmão fizeram com que Sabotage se familiarizasse com o universo das penitenciárias.
"Ele sabia como tudo funcionava dentro de uma cadeia, o que foi importante para a caracterização de personagens em 'Carandiru'. Isso ajudou muito o Babenco", conta o diretor.
Outro aspecto abordado é o envolvimento com o tráfico antes de ser "salvo" pelo rap. "Como ele estudou até a 8ª série, passou a ser contador [responsável pelo dinheiro] do tráfico", diz Ferreira.
"Uma vez o vi armado e o questionei, mas ele desconversou", diz o parceiro musical Helião.

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