domingo, 10 de fevereiro de 2013

Carlos Heitor Cony

folha de são paulo

Folia e foliões
RIO DE JANEIRO - Pensei em dois assuntos para esta crônica: o Carnaval e a estupefação da sociedade com a eleição dos novos presidentes do Congresso. Refletindo com certa calma, verifiquei que os dois temas, aparentemente tão conflitantes, no fundo são a mesma coisa: aquilo que em tempos idos chamavam de "folia".
No Carnaval não chega a haver perplexidade, o calendário marca as datas e a mídia anuncia os bailes e cordões. Em princípio, seria um vale-tudo cantado em prosa e verso.
Lembro que o Mario Filho, irmão do Nelson Rodrigues e nome de estádio aqui no Maracanã, pensou a vida toda em escrever um romance intitulado "1919". No Carnaval daquele ano, logo após a gripe espanhola, que matou milhares de pessoas, valeu tudo realmente. Ameaçado de morte durante meses, o carioca entregou-se à citada folia e -dizia o Mario- as delegacias policiais registraram mais de 5.000 casos de defloramentos e processos de adultério, que, naquele tempo, davam em prisão.
Quanto à eleição dos novos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, a folia não foi idêntica, mas análoga. Não havia razão para a sociedade ficar indignada, nem para os jornais publicarem páginas e páginas de cartas dos leitores achando que era o fim de mundo.
Sabia-se que a ficha limpa, medida que nasceu do povo para impedir abusos da política nacional, não seria levada em consideração. Tal como no Carnaval, continuou valendo tudo. A principal diferença é que o Carnaval dura pouco e acontece uma vez por ano.
A folia na vida pública dura mais e não tem data para acontecer.
Teremos em breve as comissões do Senado e da Câmara. Veremos. No último dia de um Carnaval, cantava-se: "É hoje só, amanhã não tem mais". Na vida pública, amanhã tem sempre mais.

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