sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Dura de matar [Jessica Chastain - "A Hora Mais Escura"]

folha de são paulo

Indicada ao Oscar pela segunda vez consecutiva, Jessica Chastain vive a agente da CIA responsável pela investigação que levou à morte de Bin Laden no filme "A Hora Mais Escura", de Kathryn Bigelow
RODRIGO SALEMENVIADO ESPECIAL A BERLIMNa primeira entrevista do homem responsável pelo tiro que matou o terrorista Osama bin Laden, ele menciona alguns erros (ou exageros) de informação em "A Hora Mais Escura", filme de Kathryn Bigelow que estreia hoje nos cinemas brasileiros.
Mas entre as críticas reveladas na reportagem de capa da revista "Esquire" deste mês, o "Atirador" (codinome pelo qual é identificado) não encontra defeito na interpretação de Jessica Chastain.
A atriz de 35 anos vive Maya, a agente da CIA responsável pela investigação que levou à morte de Bin Laden em 2011: "É incrível. Ela foi retratada como uma mulher durona e é isso que ela é".
A declaração do soldado de elite pode ajudar Jessica na briga pelo Oscar de melhor atriz, sua segunda indicação seguida -no ano passado, pelo papel coadjuvante em "Histórias Cruzadas".
Indicado em mais quatro categorias (filme, roteiro original, edição de som e montagem), "A Hora Mais Escura" retrata a exaustiva caçada a Bin Laden após os ataques de 11 de setembro de 2001.
Apontado como um dos favoritos ao Oscar em dezembro passado, quando foi exibido para jornalistas, o filme perdeu fôlego na disputa ao ser alvo de acusações de defender a tortura em interrogatórios e de pressões do Senado americano sobre as fontes das informações usadas pelo roteirista Mark Boal.
"Não creio que Kathryn quis fazer um filme político. Ela quis mostrar todos os fatos que levaram à morte de Bin Laden. Isso inclui o lado feio. Muita gente não se orgulha dessas sessões de tortura e seria fácil não incluí-las, mas não seria verdade", defendeu a atriz, em entrevista concedida em dezembro passado, em Nova York.
Jessica começou sua jornada sombria para viver uma mulher "que se achava a escolhida para encontrar aquele terrorista" um dia após perder o Oscar para a colega de set Octavia Spencer, em fevereiro de 2012. Pegou um avião e desembarcou em Chandigarh (Índia), a quatro horas da fronteira com o Paquistão.
"Foram quatro meses na Índia. Adorei a experiência, mas fiquei muito feliz de terminar as filmagens e abandonar Maya. Eu estava muito depressiva", confessou a atriz.
A primeira aparição de Maya no filme é numa sessão de tortura de afogamento na qual o prisioneiro olha para ela, em tese "frágil", e pede ajuda. "Você pode se ajudar sendo honesto", responde.
IDENTIFICAÇÃO
"Ela é um computador. Todos em Washington a chamam de 'matadora'", brinca a atriz. "Gosto de imaginá-la crescendo como a primeira da classe, recrutada pela CIA no colégio, onde era solitária."
Uma sensação que a atriz experimentou por um tempo. Quando ela tinha cinco anos, sua mãe largou o marido, um roqueiro de segunda categoria chamado Michael Monasterio, e mudou de identidade para não ser encontrada.
A atriz não falou mais com o pai biológico -agradece à mãe e ao padrasto nos discursos e costuma levar a avó materna para premiações- e nem se pronunciou quando o músico morreu, no início do mês, em Sacramento (EUA), cidade natal de Jessica.
Há dez anos, Juliet, sua irmã mais nova, se matou. Jessica não fala sobre os problemas familiares. Mas ela se lembra bem de outro momento que afetou sua vida: os ataques de 11 de setembro.
"Até hoje não consigo ir à região das torres. E os meses seguintes foram terríveis, com as ameaças de antraz e tanques na rua da minha casa", lembrou Jessica, que agora interpreta a mulher misteriosa (as duas nunca se encontraram) que foi vital para a missão de matar o terrorista mais procurado do mundo.
"É uma mulher que não ganhou nenhum crédito e não pode falar nada. Então gosto de pensar que 'A Hora Mais Escura' é nossa mensagem para ela dizendo: 'Aqui está, todo mundo está te ouvindo agora e sabe sobre seus sacrifícios'."

    FRASES
    "Não creio que Kathryn quis fazer um filme político. Ela quis mostrar todos os fatos que levaram à morte de Bin Laden"
    "Adorei a experiência, mas fiquei muito feliz de terminar as filmagens"


    RAIO-X: JESSICA CHASTAIN
    VIDA
    Nasceu em Sacramento, na Califórnia (EUA), em 1977
    CARREIRA
    Integrou grupos amadores de dança e teatro e estudou na escola de arte Juilliard, em Nova York. Foi premiada pela atuação nos filmes "A Árvore da Vida", "O Abrigo" e indicada ao Oscar por "Histórias Cruzadas"


      CRÍTICA DRAMA
      Diretora cria relato assustador e doloroso sobre caça a terrorista
      ANDRÉ BARCINSKICRÍTICO DA FOLHA"A Hora Mais Escura" é o segundo filme de Kathryn Bigelow a lidar com o tema do pós-11 de Setembro, depois de "The Hurt Locker".
      No Brasil, "The Hurt Locker", expressão militar que significa algo como "um lugar ruim e doloroso", virou "Guerra ao Terror", o que simplifica e desvirtua seu tema.
      Passa uma ideia ufanista e propagandista, enquanto o tema principal do filme é a incapacidade de alguns soldados se adaptarem à vida civil depois de passarem pelos horrores do Iraque.
      Felizmente, o novo filme de Bigelow ganhou uma tradução mais apropriada e justa. Aqui, a "hora mais escura" é o horário agendado para o ataque de militares americanos ao esconderijo de Osama bin Laden no Paquistão, que deu fim a uma busca de dez anos.
      O filme de Bigelow recria, em detalhes, esses dez anos e os quebra-cabeças que envolveram a descoberta do paradeiro de Bin Laden.
      A personagem principal da história é Maya (Jessica Chastain), funcionária da CIA que gasta todos os minutos de sua vida na caça ao terrorista. No início do filme, Maya vai a uma base secreta da CIA acompanhar o interrogatório de um suspeito de ligações com o terrorismo.
      Outro agente da CIA, Dan (Jason Clarke), lidera o "interrogatório", na verdade uma sessão de "waterboarding", um método de tortura que envolve afogamento. Dan parece que já fez isso muitas e muitas vezes. Para Maya, é a primeira de muitas.
      Nos EUA, "A Hora Mais Escura" foi acusado por alguns de ser "a favor" da tortura, por mostrá-la sem tomar uma posição mais crítica. Acho justamente o contrário: o mais assustador do filme é justamente o fato de o "waterboarding" ser mostrado como parte corriqueira do processo interrogatório.
      Escrito por Mark Boal, jornalista que ganhou o Oscar de roteiro por "Guerra ao Terror", "A Hora Mais Escura" não é desses filmes de ação preocupados apenas em criar um clímax empolgante, onde os "mocinhos" resolvem tudo com suas pistolas.
      O mais interessante é o relato do longo e doloroso processo que culminou com o ataque ao esconderijo de Bin Laden, em maio de 2011.
      O filme não traz cenas espetaculares de resgates ou tiroteios. Não é um faroeste moderno. Boal descreve a caçada a Bin Laden em detalhes, mostrando as pistas falsas, as armadilhas, os erros de percurso e as tragédias que custaram vidas e tempo.
      Nesses dez anos, a personagem de Chastain passa por uma transformação: de idealista e esperançosa, no início, a vingativa e cínica, no fim.
      Felizmente, "A Hora Mais Escura" não é o típico filme de guerra hollywoodiano. E Kathryn Bigelow não é uma cineasta qualquer.

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