sábado, 13 de abril de 2013

Editoriais da Folha de São Paulo

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Excessos chineses
Em todas as dimensões, a China é superlativa. Na economia não é diferente. Com um incremento de US$ 128 bilhões no primeiro trimestre, as reservas cambiais chinesas atingiram US$ 3,44 trilhões.
O valor equivale ao PIB alemão e ao brasileiro multiplicado por 1,7. É maior que a soma das outras quatro maiores reservas --Japão, Eurozona, Arábia Saudita e Rússia.
O acúmulo de divisas reflete o aumento nos saldos comerciais do país e uma nova onda de investimentos externos, atribuída à perspectiva de crescimento mais robusto. As projeções apontam para alta de 8% no PIB neste ano.
A aparente boa notícia conjuntural, no entanto, reforça as preocupações usuais com a sustentabilidade do modelo chinês. A avalanche de recursos externos incentiva a concessão de crédito doméstico, que atingiu a marca de US$ 1 trilhão no primeiro trimestre, 58% acima do mesmo período de 2012.
Boa parte dos novos financiamentos continua sendo canalizada para expandir ainda mais os investimentos, que já representam quase 45% do PIB (pelo menos dez pontos percentuais acima de outros países asiáticos emergentes, como a Coreia do Sul no auge de seu desenvolvimento). O crédito fácil também irriga governos locais, muitos já com finanças duvidosas.
Evidência desses temores foi o recente rebaixamento da nota de crédito chinesa pela agência Fitch, que citou a aceleração dos empréstimos como a principal fragilidade. O volume de financiamentos alcançou 198% do PIB no ano passado (contra 125% em 2008).
O governo chinês age para conter excessos e o risco de uma bolha. Apertou mais uma vez critérios para empréstimos imobiliários e regras para novos financiamentos no mercado de capitais. Mesmo assim, há poucos sinais na direção do esperado reposicionamento da economia --mais consumo e menos investimentos.
É um problema exatamente oposto ao enfrentado pelo Brasil, que luta para elevar os investimentos enquanto se depara com os limites do crescimento --ancorado só no consumo-- dos últimos anos.


    Haddad e a dívida
    Renegociação de obrigações financeiras com a União é a chave para que São Paulo possa acelerar o atendimento dos anseios de sua população
    A fama atribuída ao eleitor paulistano, de ser um dos mais severos do país na avaliação de governantes locais, saiu reforçada no Datafolha sobre os cem primeiros dias da gestão Fernando Haddad. O petista, eleito com 56% dos votos válidos no final de outubro, era aprovado por 31% no início de abril.
    Ainda assim, o candidato ungido pelo ex-presidente Lula pode dizer que obteve resultado relativamente favorável no início de sua administração. Arranca melhor que os antecessores Paulo Maluf, Celso Pitta, José Serra e Gilberto Kassab ao completaram seus cem dias.
    Essa avaliação também decorre, é verdade, de uma estreia bem convencional, para não dizer anódina. Haddad se limitou a cumprir a promessa de reembolsar a taxa da inspeção veicular e a criar uma controladoria para atacar o problema crônico da corrupção.
    A exigência algo impaciente dos moradores da capital em relação a seus prefeitos encontra respaldo nas difíceis condições objetivas da vida na metrópole. Reflete, antes de mais nada, o descompasso entre a escassez de infraestrutura e renda, de um lado, e as necessidades cotidianas de uma multidão de habitantes que já chega a 11 milhões, do outro.
    Quando a economia do país caminhava próxima da estagnação, durante os 25 anos após 1980, problemas muito evidentes na São Paulo de hoje ficaram encubados.
    Desemprego e pobreza também inibem a circulação de pessoas, seja no transporte coletivo, seja em carros e motocicletas. Na batalha pelo pão de cada dia, relegam-se a segundo plano preocupações menos imediatistas, como as relativas aos sistemas de educação e saúde.
    Bastaram alguns anos de melhoria contínua na renda para que a dimensão titânica das carências nos serviços públicos aflorasse.
    Do transporte coletivo ao individual, da limpeza urbana aos sistemas de drenagem, da regulação dos alvarás à qualidade do ensino, do atendimento médico à gestão das áreas de risco, São Paulo tornou-se minúscula diante dos anseios de sua população emergente.
    O erário municipal, contudo, vendeu parte do futuro da cidade em meados dos anos 1990, em troca de obras e despesas imediatas, algumas questionáveis, outras absurdas e suspeitas. Endividou-se a ponto de estar hoje impedido de satisfazer, num ritmo aceitável, demandas crescentes de melhoria.
    A fim de salvar o município da bancarrota, a União assumiu a dívida paulistana e vem cobrando, há mais de uma década, a devolução desses valores, a juros e correção monetária que, somados, às vezes atingem onerosos 17% ao ano.
    Eram condições compatíveis com um país que lutava para estabilizar a moeda e cujo Tesouro arcava com um custo de sua dívida ainda mais elevado do que o arbitrado para São Paulo.
    Esse drama passou, felizmente. É justo que a Prefeitura de São Paulo usufrua do substancial progresso financeiro do país, bônus de que tem sido privada pelos termos extemporâneos de sua dívida.
    Nada é mais importante para o futuro de Haddad e de seus sucessores do que renegociar bem --e logo-- esse acordo com a União.

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