domingo, 21 de abril de 2013

Eu vi - Tostão

folha de são paulo

Eu vi muito dos maiores craques do futebol. Joguei na mesma época de vários e ao lado de alguns, como o maior de todos, Pelé.
Antes da Copa de 1966, em Caxambu, sul de Minas, o Cruzeiro fez um jogo-treino com o Brasil. Atuei contra meu time. Tinha 19 anos e iniciava minha carreira na seleção. Meu pai foi ver o jogo, e o apresentei a Pelé. Ele chorou. É raro um plebeu conhecer pessoalmente um rei. Quando alguém me elogia e diz ao filho quem fui, fala que joguei ao lado de Pelé. Sinto-me orgulhoso.
Eu vi Garrincha. Antes do Mundial de 1966, o Brasil fez um jogo- -treino contra uma fraquíssima equipe de operários da Suécia. Eu era reserva. Garrincha pegava a bola, a poucos metros do banco, e driblava o marcador só com o olhar. Eu e a torcida mais próxima não parávamos de rir. Por causa desse jogo, Garrincha foi escalado no Mundial. Não tinha condições. Driblava, mas não saía do lugar. Era o fim de um gênio, o Charles Chaplin do futebol.
Eu vi o russo Yashin, o maior goleiro de todos os tempos. Em 1971, fui convidado para o jogo de sua despedida, em Milão. No outro dia, almocei no Milan, com os jogadores e os dirigentes. Todos os atletas tomaram vinho. Queriam me contratar, mas dependia do fim da proibição de importar jogadores. Isso não ocorreu. Por pouco, mudava toda minha vida.
Eu vi Beckenbauer, Baresi e Nilton Santos, três dos maiores defensores da história. Os três jogavam sem sujar o calção. Beckenbauer foi o único espetacular líbero, pois era craque, ao mesmo tempo, como zagueiro de sobra e como jogador de meio-campo. Nilton Santos foi a Enciclopédia do Futebol.
Eu vi os melhores armadores e atacantes do mundo. Não vou citá-los, porque, certamente, deixaria alguns de fora. Hoje, vejo Messi, Cristiano Ronaldo, Xavi, Iniesta, Neymar, que ainda não é do grupo dos maiores, mas tem grandes chances de estar, brevemente. Pela habilidade e efeitos especiais, Neymar tem um estilo mais próximo de Maradona e de Ronaldinho Gaúcho. Messi, pela concisão e precisão, lembra mais Zico e Pelé.
Eu vi o São Paulo, contra o Atlético-MG, repetir o ritmo alucinante do Palmeiras, contra o Libertad. É o que o Galo faz no Independência. Isso só é possível em casa, pois é essencial a participação numerosa, apaixonada e solidária da torcida. Quando o time, raçudo e em casa, perde, costuma apelar para a violência, como na partida entre Huachipato e Grêmio.
O futebol sul-americano, principalmente o de fora do Brasil (entre clubes, e não entre seleções), está cada dia mais violento. As pessoas, aos poucos, se acostumam e não percebem a gravidade. Por isso, pela pouca qualidade técnica e por tantas trapaças, fora de campo, diminui, cada vez mais, o número de torcedores que têm prazer em ver futebol.
Tostão
Tostão, médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa do Mundo de 1970. Afastou-se dos campos devido ao agravamento de um problema de descolamento da retina. Como comentarista esportivo, colaborou com a TV Bandeirantes e com a ESPN Brasil. Escreve às quartas e domingos na versão impressa de "Esporte".

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