quinta-feira, 18 de abril de 2013

Pílulas para todas - Editorial FolhaSP

folha de sao paulo

Pílulas para todas
A discussão moral sobre o aborto está entre as mais acaloradas das chamadas guerras culturais. E a veemência dos debates muitas vezes desvia a atenção para um fato importante: o número de interrupções voluntárias da gravidez no mundo já registrou uma baixa importante e pode cair ainda mais.
De acordo com um estudo do Instituto Guttmacher publicado no ano passado no periódico médico "The Lancet", entre 1995 e 2003, a taxa mundial de abortos reduziu-se de 35 para 29 por mil mulheres em idade fértil e, de 2003 a 2008, estabilizou-se nesse patamar.
O principal motivo para a queda foram avanços no campo do planejamento familiar. Como o espaço para esse gênero de iniciativa não está nem de longe esgotado, um esforço nessa área poderia diminuir significativamente a prevalência do polêmico procedimento.
Nesse contexto, são bem-vindas as medidas do Ministério da Saúde para facilitar o acesso das mulheres à pílula do dia seguinte. O medicamento (levonorgestrel), que pode evitar a gravidez até cinco dias após a relação sexual desprotegida, é adquirido por menos de R$ 10 em farmácias.
Causa espanto, desde logo, que esse meio contraceptivo de emergência não seja objeto de campanhas de divulgação mais ampla, a exemplo do que se faz com preservativos. Pior, embora a pílula já seja distribuída gratuitamente na rede pública de saúde, enfrenta barreiras burocráticas inaceitáveis.
O medicamento estava disponível apenas sob prescrição médica, o que, em condições ótimas, faria sentido. Mas o prazo para realizar uma consulta com ginecologista no SUS chega facilmente a dois meses, muito além do período de eficácia da pílula.
O governo federal distribuirá, agora, uma cartilha para profissionais da rede pública na qual esclarece que, se não houver médico disponível, a pílula pode ser fornecida por enfermeiros. Espera-se que essa orientação também facilite o acesso de menores ao levonorgestrel, já que alguns postos de saúde criam embaraços e exigem, por exemplo, a presença dos pais.
A oferta abundante de métodos de planejamento familiar e da contracepção de emergência não vai, é claro, zerar a ocorrência de abortos. Mas, considerando que há alternativa menos traumática para a mulher e menos controversa para a sociedade, seria um erro não massificá-la tanto quanto possível.
Avanços na prevenção da gravidez talvez não sejam suficientes para transformar o aborto numa relíquia, mas bastariam para evitar uma boa dose de sofrimento.


    EDITORIAIS
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    Maioridade legislativa
    Congresso precisa enfrentar a questão dos adolescentes homicidas, por exemplo elevando o tempo máximo de internação, hoje de 3 anos
    Pesquisa Datafolha publicada ontem registrou apoio recorde à redução da maioridade penal, hoje fixada aos 18 anos. Nada menos que 93% dos paulistanos disseram-se a favor da mudança legislativa.
    A quase unanimidade é rara em levantamentos do tipo. Ainda que a comoção diante de novo assassinato estúpido cometido por um adolescente tenha estimulado a tendência, é inequívoco que a sociedade clama, com razão, por ações capazes de combater a insegurança.
    Não há como fugir desse debate. O direito penal precisa, já no plano simbólico, mostrar-se habilitado a preservar a ordem, e um divórcio completo com a opinião pública só prejudica esse objetivo. Daí não decorre que a redução da maioridade seja a melhor medida para alcançar os efeitos desejados.
    Existem 9.013 internos da Fundação Casa, órgão do Estado de São Paulo responsável por adolescentes infratores. Somente 134 deles, ou menos de 1,5%, cometeram crimes envolvendo mortes.
    Se, por hipótese, uma lei mais dura para jovens e de eficácia máxima tivesse sido adotada anos atrás, o impacto na criminalidade paulista teria sido pouco perceptível. Nos últimos dois anos, homicídios e latrocínios (roubo seguido de morte) no Estado somaram quase 10 mil casos. Os adolescentes internados respondem por menos de 1,5% deles.
    Ao final de 2012, as penitenciárias paulistas tinham 23.786 presos por homicídio ou latrocínio. Considerando a população adulta do Estado, esses crimes levaram ao cárcere 75 pessoas a cada grupo de 100 mil. A internação de jovens homicidas entre 15 e 17 anos é menos frequente: 7 a cada 100 mil.
    Há que levar em conta, ainda, que um adolescente, em fase de formação, seria presa fácil para os bandidos adultos numa cadeia comum. Misturá-los, em ambiente perverso, seria contraproducente.
    Por outro lado, como é preciso fazer algo para afastar indivíduos perigosos do convívio social e combater a impunidade, não há sentido em limitar a três anos o período máximo de internação dos jovens mais violentos.
    A melhor saída é ampliar esse prazo --apenas para os crimes dolosos contra a vida, dentro de critérios estritos e mantendo os jovens separados dos adultos, mesmo após os 18 anos. A proposta, defendida por esta Folha há anos, foi encaminhada pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), ao Congresso Nacional.
    É crucial que tal matéria seja analisada com serenidade. A turbulência emocional será daninha se levar os parlamentares ao populismo fácil, mas bem-vinda como catalisador de um necessário amadurecimento legal.

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