sábado, 18 de maio de 2013

Marcos Caramuru de Paiva

folha de são paulo

Abrir portas na OMC
Há uma energia motivadora nas mudanças, mas o novo diretor-geral não pode provocar um "big bang"
Há que reconhecer que, descontadas as caneladas usuais do jogo, a OMC (Organização Mundial do Comércio) operou com bom senso a seleção de seu novo diretor-geral. Ganhou o candidato mais bem integrado ao seu trabalho.
Escolher dirigentes por mérito não é prática nas organizações multilaterais econômicas. Se mérito fosse o critério, dificilmente o sanitarista Jim Yong Kim seria presidente do Banco Mundial ou a advogada Christine Lagarde comandaria o Fundo Monetário Internacional.
Yong Kim foi aprovado a toque de caixa, passando por cima de bons nomes na causa do desenvolvimento. Lagarde derrotou o presidente do Banco Central mexicano, Agustín Carstens, que fez grande parte de sua carreira no próprio Fundo.
A pergunta enunciada desde a eleição de Roberto Azevêdo -será possível reviver a Rodada Doha e tirar a OMC do marasmo?- requer realismo na resposta.
Há três processos de negociação que absorverão a energia de países de peso e reduzirão ainda mais seu interesse em avançar Doha: o acordo de livre-comércio EUA-Europa, a iniciativa transpacífica do presidente Obama e o acordo China-Japão-Coreia. Nenhum é de fácil execução. Eles podem ficar pelo caminho e dar espaço ao multilateralismo, mas não é certo que seu eventual fracasso gerará tal resultado.
A economia internacional não ajuda. Em momentos difíceis, os países não abrem mão dos instrumentos de política econômica. Podem fazê-lo seletivamente, por motivos estratégicos ou para gerar novos estímulos ao crescimento, como parece ser o caso do acordo EUA-UE.
Finalmente, os próprios membros que elegeram Azevêdo talvez tenham baixo interesse em maior liberalização. Estaria o Brasil, por exemplo, preparado para reduzir as tarifas de produtos industriais para trazer a agricultura à mesa da OMC?
Há uma energia motivadora nas mudanças de liderança. Mas o que o novo diretor-geral pode fazer é ir abrindo portas, não provocar um "big bang". É assim, aliás, que diplomatas operam.
Organizações internacionais nem sempre vivem momentos de brilho. O FMI costuma perder relevância quando não há crises. Seu trabalho rotineiro, monitorar a política econômica dos membros, nunca teve o peso esperado. O Banco Mundial esvaziou-se quando países como China, Índia e Brasil deixaram de necessitar de seus recursos -foi o primeiro exemplo de como Brics e emergentes podem mudar agenda e peso de uma instituição. Na OMC, os acordos de livre-comércio se impuseram sobre o multilateralismo.
As três principais organizações econômicas terão, ao longo do tempo, que promover mudanças substanciais se a ideia for fazê-las recuperar o peso do passado.
A eleição de Azevêdo foi boa para o Brasil. Mostrar que temos gente da sua qualidade, uma diplomacia respeitada, capilaridade no relacionamento externo e independência de posições é muito positivo.
Pode se afigurar melhor se ajustarmos as expectativas de curto prazo, admitirmos que Doha não se revitaliza de repente e enxergarmos o novo diretor-geral como arquiteto de uma realidade que ainda não podemos claramente delinear.

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