domingo, 30 de junho de 2013

'Branca de Neve' segue tendência de clássicos infantis mais sombrios

folha de são paulo
Negra como neve
Premiado filme espanhol que estreia na sexta torna o conto dos irmãos Grimm uma história sombria
SANDRO MACEDODE SÃO PAULOMuito antes de "O Artista" (2011) se tornar um fenômeno de crítica e público ou de adaptações de fábulas infantis virarem febre, o espanhol Pablo Berger já sonhava com seu "Branca de Neve" (2012), filme igualmente mudo e em preto e branco que estreia no Brasil na próxima sexta (5).
O diretor levou sete anos para conseguir juntar dinheiro e finalizar seu projeto, vencedor de dez Goya, principal prêmio do cinema espanhol.
O longa de Berger transporta o famoso conto infantil para a Sevilha do começo do século 20, quando os heróis do povo eram os toureiros, e Antonio Villalta (Daniel Giménez Cacho) era o maior deles.
O belo preto e branco cai bem a uma história que nada tem de infantil --é, ao contrário, bem sombria.
Numa sequência de pequenas tragédias, Villalta sofre um acidente de trabalho; sua mulher, prestes a dar à luz, morre no parto. A pequena Carmen/Branca de Neve nasce sem mãe e com o pai inválido casado com sua cruel enfermeira (Maribel Verdú).
Carmencita vai morar na mansão da madrasta, que confina o pai a um quarto e desenvolve uma relação sadomasoquista como o chofer.
Berger diz ter se inspirado em "A Paixão de Joana d'Arc" (1928), de Carl T. Dreyer, e no do cinema expressionista de Fritz Lang e F.W. Murnau.
"Não queria fazer uma adaptação do conto. Apenas usá-lo como inspiração", afirmou o diretor à Folha.
Ao mostrar os anões toureiros que resgatam Carmen, já uma bela jovem, na floresta, Berger incute uma dúvida matemática na plateia, ao mostrar apenas seis anões.
"Gosto de provocar o espectador. E fiz uma homenagem à minha turma de amigos da juventude. Éramos em seis."
A inevitável lembrança de "O Artista" se restringe à forma. "A conexão é normal e até óbvia, mas são irmãos' muito diferentes."
Num dado momento das produções, os dois pareciam estar em disputa pela primazia. "Era como uma corrida para ver quem chegava primeiro à Lua. Fui o russo."
    'Branca de Neve' segue tendência de clássicos infantis mais sombrios
    Filme ganhou dez Goya e se tornou o terceiro mais premiado da história do 'Oscar espanhol'
    Para o diretor do longa, o basco Pablo Berger, 'cinema é um lugar para sonhar' e sua obra é 'uma prova disso'
    DE SÃO PAULOApós passar sete anos lutando para produzir "Branca de Neve", o basco Pablo Berger (nascido em Bilbao) gosta de descrever o produto final como "sonho realizado".
    E o sonho de Berger se tornou concreto na última entrega do Goya, principal premiação do cinema espanhol.
    "Branca de Neve" levou dez estatuetas, incluindo a de melhor filme, e se tornou a terceira produção mais laureada na história do prêmio espanhol ("Mar Adentro", de 2004, levou 14 e "¡Ay, Carmela!", de 1990, 13).
    Embora se destaque da onda por sua sofisticação e densidade, o filme de Berger se insere numa tendência recente do cinema comercial americano: a adaptação de clássicos infantis para um público em geral mais adulto.
    Um dos precursores foi "Alice no País das Maravilhas", de Tim Burton, que rendeu US$ 1 bilhão em 2010.
    Histórias infantis com toques sombrios e temas maduros inundaram estúdios de Hollywood. "João e Maria: Caçadores de Bruxas" (2013), por exemplo, troca a dupla de garotos alimentada por uma bruxa canibalesca por adultos traumatizados e exterminadores de monstros.
    Branca de Neve, tema do longa de Berger, inspirou outros dois filmes recentes: "Branca de Neve e o Caçador" (2012), que traz uma heroína à la Joana D'Arc, e "Espelho, Espelho Meu" (2012), com uma Rainha Má que busca no casamento a solução para seus problemas financeiros.
    INDIGNADOS
    Na última semana, Berger veio ao Brasil para promover seu filme. Primeira parada: Brasília, onde o longa integrava o Festival Internacional de Cinema --o diretor passaria ainda por Rio e São Paulo.
    Nos arredores do Museu da República, na Esplanada dos Ministérios, local da primeira exibição, Berger se deparou com uma multidão, não exatamente para prestigiar o seu longa. Ele diz ter ouvido que aquele era um momento histórico. Naquela quinta (20/6), cerca de 30 mil pessoas participaram de uma manifestação na capital.
    Emocionado, Berger --que compara os protestos no Brasil ao movimento dos "indignados" surgido na recente crise espanhola-- voltou à sala de cinema para apresentar seu filme para poucos. Dedicou a sessão "aos jovens sonhadores" que estavam "lutando por um país melhor".
    Tocada pelo discurso, Anna Karina de Carvalho, uma das diretoras do festival, decidiu abrir as portas do cinema para quem estivesse na rua.
    "O momento atual é para sonhar. E o cinema é um lugar para sonhar. Meu filme é uma prova disso. E as pessoas vão ao cinema para sonhar", diz o diretor.

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