domingo, 30 de junho de 2013

Carlos Heitor Cony

folha de são paulo
Ganhando tempo
RIO DE JANEIRO - Não acreditei no que ouvi. Mudei de canal para confirmar. Dona Dilma, muito bem produzida, continuava falando e repetiu o que eu julgara impossível: acuada pelas manifestações das ruas, ela propunha uma "constituinte específica".
Reduziu as exigências feitas pelas multidões em todo o país a alguns pontos também específicos. Para resolvê-las, prometeu uma constituinte "ad hoc". Nem mesmo Swift, nem Voltaire, nem Rabelais, que imaginaram povos e países absurdos, pensaram numa solução igual. Para cada problema específico, uma lei magna também específica.
O comentário mais gentil que recebeu, de um jovem manifestante que ela convocou para tentar um diálogo com representantes da massa, foi definitivo: o estudante considerou a nossa presidente "despreparada".
Eu acreditava que dona Dilma --que dispõe de 39 ministros, dos quais não sabe o nome de todos, além de assessores também específicos nos vários setores de um governo que não é específico porque é geral, e cuja gestão inclui o universo dos problemas e desafios de quase 200 milhões de brasileiros-- tivesse ao lado uma santa alma para adverti-la sobre a besteira (o nome é duro, mas é este mesmo) de sua proposta.
Ainda bem que, no dia seguinte, teve a sabedoria de recuar. Evidente que se trata de uma senhora ilustre e prendada, mas a impressão que deu, ao tentar propor uma solução específica para uma situação que nada tem de específica, foi a da banalidade de ganhar tempo, deixar o ânimo das ruas esfriarem, esperar uma catástrofe natural para desviar a tensão popular e continuar sua famosa gestão com 39 cogestores.
Qualquer situação mais séria e ela terá o remédio engatilhado: uma constituinte específica que especificamente lhe dará tempo para resolver até mesmo a quadratura do círculo.

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