quarta-feira, 24 de setembro de 2014

MARTHA MEDEIROS - George

Zero Hora - 24/09/2014

Há muitos e muitos anos, em um reino distante, eu fiquei com um garoto chamado George, assim mesmo, com G, mesmo ele sendo do bairro Auxiliadora. Foi o mais perto que cheguei de um americano, ainda que falsificado. Nunca mais nenhum George habitaria minha realidade – em compensação, um deles fixou residência em minhas fantasias.

Eu não costumava assistir ao seriado Plantão Médico, então fica difícil dizer em que momento George Clooney entrou na minha vida, só sei que foi pela porta dos fundos e se instalou no sótão do meu imaginário. Não vi tantos filmes dele como gostaria. Aliás, nunca o considerei fabuloso como ator. Se dependesse de mim, ele tomando Nespresso já seria suficiente para levar um Oscar.

O que, afinal, fez de George Clooney o Clark Gable da nossa geração? O rostinho bonito ajudou, sem dúvida, mas é hora de darmos o devido valor a um atributo mais importante do que beleza: carisma. Sem carisma, você até faz filmes, fotos e publicidade, mas não faz história.

George Clooney virou um ícone porque parece ter nascido com mais de 30 anos e já com alguns fios prateados no cabelo – não passou pela desengonçada e petulante adolescência, ou passou tão discretamente que ninguém viu. Jamais foi capa da Capricho. Se foi, não me contem, não estraguem este meu obituário.

Maduro, sim, mas nada emburrado. Inteligente, divertido e independente, nunca foi de levar Hollywood muito a sério. Gosta de trabalhar com os amigos (ele, Matt Damon e Brad Pitt não se desgrudam), de se aventurar como diretor e produtor (sem fazer feio), de ser ativista em causas humanitárias e sempre que pode se refugia em sua residência às margens do lago de Como, e não numa cobertura em Los Angeles, o que diz muito sobre seu refinamento. A única coisa que me parecia cafona em seu histórico era aquela insistência em se manter solteirão.

Um homem precisa se garantir, mesmo diante de um desafio intimidador.

Feito, George. Você já era chique, agora é perfeito. Aos 53 anos, escolheu uma linda e discreta advogada libanesa com o seu mesmo coeficiente de classe. Se serão felizes para sempre é um assunto que não nos diz respeito e talvez nem a vocês – coisa mais antiga assinar compromisso com a eternidade. O que importa é que a partir de sábado você deixará de vez a turma mal-afamada dos galinhas.

Eu falei obituário alguns parágrafos atrás? Agora é que percebi. Ato falho. George Clooney não morreu, está apenas casando, o que não muda nada no universo das fantasias femininas, onde todos entram sem aliança.

Mas, para quem não se conforma e acredita em milagres, não custa rezar. Ainda faltam três dias.

Eduardo Almeida Reis - Bidu

No reino animal, o racismo é biológico: as espécies procuram as parecidas e evitam as diferentes. Na espécie humana, é uma tolice, considerando que não existem raças geneticamente puras


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 24/09/2014






A secura do Rio Grande deixa à mostra embarcações naufragadas há mais de 70 anos, o Tietê exibe seu leito de pedras (e lixo...) que ninguém tinha visto, o Lago de Furnas quase transformado num riacho, o Velho Chico vazio, Três Marias, além de exibir um erro de engenharia, rivalizando em secura com o sistema Cantareira, que bate recordes diários de falta de água, rivalizando com muitas cidades do Triângulo Mineiro e com uma porção de municípios paulistas. Resumindo: grande parte do Sudeste, reunindo os estados mais ricos do Brasil, tem falta de água parecida com a tradicional secura do Nordeste.

As diversas explicações – aquecimento global, aumento populacional, desperdício, poucas chuvas, El Niño etc. – se esquecem da causa principal, não por acaso chamada Operação Lava a Jato: do tanto que determinado partido político, administrando a Petrobras, tem roubado, lá se foi toda a água brasileira na lavagem do dinheiro depositado nos paraísos fiscais. Um bilhão aqui, 10 bilhões mais adiante, 5 bilhões anteontem, é lavagem que não acaba mais, e a limpeza do dinheiro pela ação de líquido, especialmente água, gastou nossa água: bidu.

Racismo à brasileira

Nos últimos dias de agosto, este imenso e futuroso país quase parou com as ofensas racistas de alguns torcedores do Grêmio ao senhor Aranha, goalkeeper do Santos. Racismo à brasileira: entre os poucos torcedores perfeitamente identificados pelas câmeras do estádio gaúcho, pelo menos dois são muito mais escuros de pele que o guarda-valas supostamente ofendido. Na condição de ex-cronista-Fifa, atesto que o senhor Aranha, se é aquele que atuou no futebol mineiro, merece apupos por seu desempenho enquanto quíper. Era fracote e continua fraquíssimo como profissional, posto que fisicamente reforçado. Seu time, naquela noite, ganhou por 2 x 0, mas é preciso notar que a equipa derrotada tem hoje a condução técnica do professor Scolari, pessoalmente muito rico, fisicamente muito saudável, chefe de linda família e detentor do recorde mundial entre as seleções de ponta nas Copas do Mundo com os 7 a 1 que levou dos alemães.

No reino animal, o racismo é biológico: as espécies procuram as parecidas e evitam as diferentes. Na espécie humana, racismo é uma tolice, considerando que não existem raças geneticamente puras. Louríssimo de lindos olhos azuis e de pele incomparavelmente branca, vosso philosopho tem uma pontinha de sangue angolano. Não faço à inteligência do leitor a descortesia de informar que a juba loura grisalhou com o passar dos anos, talvez em consequência deste primoroso philosophar.


Fortunas

Comigo acontece um fenômeno jamais visto entre os cronistas bons e ruins: excesso de assunto. Aquela conversa da folha em branco, recentemente acrescida pela “falta de desejo”, por aqui não cola. No dia em que escrevo estas bem traçadas linhas são tantos os assuntos, que não sei por onde começar. E aí me chega um texto, enviado por bom amigo, em que um ator idoso, muito conhecido, escreve sobre sua vida após a vida, isto é, ao se dar conta de que vive depois de certa idade. Por mal dos pecados, começa: “Quando vi-me...”. Pronto, parei por ali. Por que vime em lugar de plástico, bambu, madeira, couro? Custava escrever “quando me vi”?

Isto posto, vamos aos fatos que abundam como abunda a pita, grande erva rosulada da família das agaváceas. Nosso Eike, tadinho, investiu na Marina da Glória quando teria sido mais inteligente investir na Marina da Silva. Enquanto isso, Jorge Paulo Lemann (Rio de Janeiro, 26 de agosto de 1939) já passou dos US$ 25 bilhões. Com os seus dois sócios, a fortuna passa dos US$ 50 bilhões, dinheirinho razoável pelos padrões internacionais. Um deles, Carlos Alberto da Veiga Sicupira (Rio de Janeiro, 11 de maio de 1948), enriquece o gênero até então composto de sicupira-branca, sicupira-amarela e sicupira-do-cerrado com o sicupira-rico, que deu ao mundo Helena Sicupira, Heloísa Sicupira e Pedro Sicupira. Marcel Hermann Telles (Rio de Janeiro, 23 de fevereiro de 1950) compõe a trinca. Pelo visto, três cariocas, enquanto os paulistanos vivem enchendo as bocas com as suas fortuninhas de meia-tigela.


O mundo é uma bola

24 de setembro de 622: o profeta Maomé completa sua hégira de Meca para Medina. Considerando que ninguém, a começar pelo philosopho, sabe o que seja hégira, devo informar que fui ao Houaiss para aprender que é fuga, longa viagem ou travessia, especialmente quando realizada para escapar de um perigo ou de uma situação indesejável. O início da era maometana é assinalado por essa data.

Em 787, início do Segundo Concílio de Niceia. O finado Celso Pitta casou-se com uma Niceia e viu o que era bom para a tosse. Em 1890, os mórmons abandonam o hábito da poligamia. Pois sim! Ainda outro dia, os jornais nos falavam de um mórmon sul-americano que ganhou na Justiça o direito de continuar casado com duas santas. Hoje em São Paulo é o Dia do Mototaxista e na Catalunha, onde joga Neymar, a maior festa de Barcelona: Dia de Mare de Déu de La Mercê.


Ruminanças

“Não gostamos tanto das pessoas pelo bem que nos fizeram quanto pelo bem que lhes fizemos” (Laurence Sterne, 1713-1768).