segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Dilma começa a delegar poderes? - Renato Janine Ribeiro

Valor Econômico 05/01/2014

Dilma muda seu estilo e passa a delegar poderes aos ministros - em especial a Joaquim Levy, mas não só a ele


Durante quatro anos, Dilma Rousseff recebeu críticas a seu estilo de governar, centralizador demais, a ponto de inibir iniciativas de seus ministros. Comentou-se, e eu mesmo o fiz, que lhe faltava delegar e dialogar. Pois isso pode estar mudando. Ao nomear Joaquim Levy para dirigir a economia, está claro que ela lhe delega poderes que seu antecessor Guido Mantega jamais teve; aliás, há um ponto a mais no caso de Levy: ele é tão necessário ao governo Dilma 2.0 quanto Henrique Meirelles foi ao governo Lula 1.0.

Doze anos atrás, o banqueiro Meirelles foi o fiador do governo Lula junto ao mercado. Com os anos, deixou de ser indispensável (embora tenha continuado no cargo), porque o patronato adquiriu confiança em Lula. Hoje, Levy é o fiador do segundo governo Dilma junto ao mercado. Ao menos nos próximos anos, se ele demitir-se ou for demitido, serão sérios os riscos para a governabilidade econômica. Isso lhe dá um mandato forte.

Há nesse novo ministério - que não entusiasmou quase ninguém - três "clusters", ou núcleos, de titulares com grande autonomia. Ou seja, colaboradores que não podem ser demitidos facilmente. Isto é, ministros a quem atribuições e decisões serão delegadas. Se a autonomia lhes for podada, o custo para a eficiência do governo e o prestígio presidencial será alto.

Três núcleos de ministros quase independentes

O primeiro núcleo é o da economia. Levy é o mais visível, mas com Nelson Barbosa e Alexandre Tombini temos aqui três ministros - podendo chegar a cinco, se incluirmos os titulares da Agricultura, Katia Abreu, e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Armando Monteiro. No andar atual do mundo, a economia é determinante numa escala que nem mesmo Marx imaginou: é difícil outras políticas se definirem sem a garantia de crescer o PIB.

A economia é o setor que mais deve mudar em face do primeiro mandato. Para o PT continuar as políticas sociais, que são sua própria razão de ser (e de sua popularidade), a economia precisa melhorar. A presidenta parece ceder parte razoável da decisão econômica, para assegurar as políticas sociais. Na famosa expressão, cede os anéis para salvar os dedos. Aceitar isso não deve ter sido fácil para uma governante certa de si como Dilma. Tanto que já houve um primeiro stress entre ela e Nelson Barbosa, sobre o salário mínimo. O que eu receio é que não tenha ficado meridianamente claro, e combinado, entre Dilma e os ministros econômicos, quais serão os limites da economia e da política.

O segundo núcleo é o dos ministros que trazem ao governo o apoio de seus partidos, sendo eles os próprios dirigentes principais, de direito ou de fato, de suas agremiações. Entre eles estão os controversos Gilberto Kassab, pelo PSD, e Aldo Rebelo, do PCdoB. Haverá outros. Os dois têm forte experiência administrativa e política. Dilma quer evitar riscos no Congresso, seja o do "impeachment", se a batata da Petrobras esquentar, seja o da rejeição de projetos presidenciais. Blinda-se o Executivo contra uma eventual rebelião do Legislativo.

Um terceiro grupo, mais difuso, que por isso mesmo não sei se cabe chamar de núcleo, é o de alguns ministros testados e aprovados. Não têm o peso dos primeiros junto ao mercado, nem o dos segundos junto ao Congresso. Mas sabe-se o que eles querem. Destaco dois nomes, que saíram da Esplanada no fim do governo Lula e voltam, com forte apoio em suas áreas. Só tem cabimento regressarem se estiverem munidos de carta quase branca. São Patrus Ananias, que dirigiu o combate à fome e agora assume outra pasta dita social, e Juca Ferreira, que retoma o ministério da Cultura.

Realcei os membros do núcleo econômico, que só funcionará se estiverem bem ligados, muito solidários entre si, e que não dependem do PT, ao contrário: nesta altura, parece que é o PT que depende deles; os do "cluster" partidário, que reúne dirigentes bem diferentes entre si - todos eles, também, de fora do PT - mas que têm em comum o fato de que Dilma terá de fazer mais concessões ao mundo político do que esteve propensa a fazer; e finalmente uma simples lista de ministros dos quais se sabe o que farão, e que certamente incluem outros que continuam em suas pastas, reforçados pelo simples fato da recondução.

Mas temos pelo menos uns dez ministros que não dependerão de autorização presidencial, para saber se adotam ou não uma medida. (Dilma pode intervir, cortando essa autonomia, mas o preço será caro).

Estará mesmo mudando o modo de governar? Maquiavel dizia, no "Príncipe", que ou somos de um jeito ou de outro. Não conseguimos mudar. Mas ele reduzia os modos de ser a apenas dois - o dos impetuosos e o dos cautelosos. Tudo o mais era mutável.

Aqui, penso no estilo de governar do primeiro mandato - o da pessoa centralizadora, desconfiada, preocupada em articular as diversas ações ministeriais, empenhada em gerar sinergias - mas que não conseguiu tanto êxito quanto pretendia. O fato é que Dilma não tem alternativa, e é positivo que tenha reconhecido este fato. Avessa aos políticos, talvez por não gostar de sua busca desenfreada pela própria vantagem, reticente em relação aos empresários, talvez por descrer que tenham uma visão do Brasil, ela parece que teve de ceder ao mundo real - que não é o melhor dos possíveis, mas é o único disponível.

Não vai ser fácil conciliar ministros assim diferentes, nem lhe será fácil reduzir seu protagonismo em várias áreas do governo, sobretudo a econômica. Mas esse novo ministério, que não é do sonho de ninguém e duvido que seja dos sonhos de Dilma, sinaliza uma certa possibilidade de desbloqueio de algumas travas políticas, econômicas e sociais a que chegamos.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo. 
E-mail: rjanine@usp.br"

Festejos - Eduardo Almeida Reis

Duvido que o caro, preclaro e paciente leitor se lembre dos nomes dos Reis Magos, Gaspar e Baltazar %u2013, que acabo de reaprender na Wikipédia


Estado de Minas - 05/01/2015



Foi-se o Natal, muitas crianças deixaram de acreditar em Papai Noel, enquanto a maioria dos brasileiros continua acreditando na inviolabilidade das urnas eletrônicas. Amanhã é o Dia de Reis, que neste ano cai numa terça-feira, dia em que o leitor fica livre de mim. Segundo a tradição cristã, o Dia de Reis seria aquele em que o recém-nascido Jesus recebeu a visita de “alguns magos do oriente” (Mateus 2:1), os três Reis Magos, que os jovens entendem magros. Por isso, a noite de hoje, dia 5, e a madrugada de amanhã é conhecida como Noite de Reis.

Nesta data, encerram-se para os católicos os festejos natalinos, retiram-se os enfeites, desarmam-se os presépios. Na fazenda fluminense, o administrador sugeriu a contratação de um empregado, com a seguinte observação: “Ele é folião”. Fui apurar e descobri que o cavalheiro passava dias cantando, dançando, tocando e degustando as guloseimas oferecidas ao seu grupo durante as festas da Folia de Reis. Dá para imaginar a reação de um pequeno fazendeiro que vivia sem saber como pagar as contas no fim do mês.

Na França e na canadense Quebec, comem a Galette des Rois, bolo que contém um brinde e vem acompanhado de uma coroa de papel. Aquele que encontrar o brinde em sua fatia será coroado e terá que oferecer o bolo no ano seguinte. Com a islamização da França, é cada vez menor o número de franceses comendo a Galette des Rois.

Duvido que o caro, preclaro e paciente leitor se lembre dos nomes dos Reis Magos – Belchior, Gaspar e Baltazar –, que acabo de reaprender na Wikipédia. Quarta-feira a gente se encontra, falou?

Palavras

Pilhas novas, ligo o rádio pelo noticiário matinal e fico sabendo que em São Paulo um “assalto simulado para matar o presidente de um sindicato” levou 20 cavalheiros à sede da instituição, onde roubaram dinheiro, celulares e relógios dos sindicalistas, obrigando a tesoureira a telefonar para o presidente pedindo que comparecesse à sede do sindicato. O presidente atendeu ao chamado de sua tesoureira, chegou à sede, foi levado pelos cavalheiros para outra sala onde foi enforcado juntamente com a tesoureira. Os 20 cavalheiros fugiram e a polícia andava atrás deles.

Todos sabemos que o significado de muitas palavras muda com o tempo, mas o pessoal está exagerando. Até ontem, o adjetivo simulado, que entrou em nosso idioma no ano de 1436, significava “que não é verdadeiro, falso, fingido, suposto, feito à imitação de coisa verdadeira, aparência de realidade”. A partir da reportagem da radialista paulistana, um assalto simulado para matar o presidente do sindicato enforcou o patrício e sua tesoureira, enterrados no dia seguinte.

Símbolos e siglas também sofrem modificações. As letras p e t nos contam uma história recente. Pt e pt significavam o símbolo de platina e o país Portugal nos endereços eletrônicos da internet e continuam significando. PT, contudo, era a sigla do Partido dos Trabalhadores e hoje é sinônimo de corja. Tanto assim que o seu ex-tesoureiro, Vaccari Neto, sucessor do condenado Delúbio, foi ovacionado no congresso dos petistas realizado no final de novembro.

Ovacionar: fazer ovação a, aclamar, aplaudir, ovar. Queriam o quê? Num congresso de larápios, os que mais se destacam na arte de larapiar são aplaudidos, invejados, louvados. Fernandinho Beira-Mar teve notas brilhantes nos colégios que frequentou. Marcola já leu milhares de livros. O doutor honoris causa nem isso, mas assinou o prefácio do livro escrito por seu companheiro José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa, o ex-primeiro-ministro de Portugal, socialista, gatuno da mesma laia que Vaccari Neto e a companheirada.

O mundo é uma bola

5 de janeiro de 1477: Luís XI derrota e mata em Nancy, na Lorena, o duque de Borgonha, Carlos, o Temerário, e anexa definitivamente a região ao domínio francês. Em 1785, dona Maria I, de Portugal, promulga alvará que proíbe a proliferação de indústrias no Brasil. Em 1808, foi criada a primeira tipografia no Brasil.

Em 1825, Alexandre Dumas pai, com 23 anos, participou de seu primeiro duelo. Não se machucou seriamente, mas suas calças caíram durante a luta previamente ajustada. Em 1867, primeiro trem urbano da América Latina: a Maxabomba do Recife. Em 1896, um jornal austríaco informa que Wilhem Conrado Röntgen havia descoberto um novo tipo de radiação (Raios-X), o que nos faz supor que até 1895 não existissem as chapas de Raios-X. Em 1911, Alberto I dá a Mônaco sua primeira constituição. O príncipe atual planeja fazer uma ilha no Mediterrâneo para construir e vender diversos edifícios baixos, que não tirem a vista do principado. Em 1919, fundação do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, que teve a inscrição número 7 do Sr. Adolf Hitler. Hoje é o Dia de Santo Eduardo.

Ruminanças

“Pode-se ser um santo sem Deus: é o único problema concreto que eu conheço até hoje” (Camus, 1913-1960).