Revista Carta Capital -
26/01/2015
As pesquisas confirmam que somente a economia foi o ponto vulnerável do primeiro mandato
O maior sucesso das oposições ao longo do primeiro governo Dilma Rousseff (e, talvez, o único realmente significativo) foi a destruição da imagem da política econômica. Todas elas dedicaram-se a promovê-la, desde os partidos aos líderes empresariais, no Brasil e no exterior. Mas a ponta de lança, como de costume, foi o estaclishment midiático. Mais que os políticos de oposição, mais que os porta--ozes do empresariado, quem mais golpeou a condução da política econômica, mais se entristeceu com os sucessos alcançados e mais se alegrou com os fracassos foi a imprensa antipetista. Não que fosse seu único alvo. Dilma, o governo e o PT passaram dois anos sob tiroteio cruzado, destinado a enfraquecê-los e derrotá-los na eleição. Mas, em todos os fronts, salvo nas questões econômicas, as oposições obtiveram resultados magros. Não conseguiram, por exemplo, convencer a opinião pública da imoralidade dos governos e políticos petistas. Fizeram o carnaval que puderam com o julgamento do "mensalão" e as acusações de irregularidades na Petrobras, achando que marcariam Dilma, Lula e seus correligionários com a pecha da corrupção. Não houve um dia sem que os colunistas conservadores atirassem contra "escândalos" reais ou inventados. Foi debalde, no entanto, como vimos nas pesquisas do fim de 2014. Na pesquisa Vox Populi feita entre 5 e 8 de dezembro, 60% dos entrevistados responderam que foram Lula (com 31%) e Dilma (com 29%) os presidentes que mais combateram a corrupção entre os três mais recentes (ficando Fernando Henrique Cardoso com apenas 11% das respostas). No tocante à Petrobras, 69% dos entrevistados afirmaram que "as irregularidades (na empresa) vêm de antes do PT (chegar ao governo federal)". A incompetência foi outro flanco ao qual as oposições e, em especial, abrigada midiática se dedicaram. Também nesse plano não deixaram passar um dia sem denunciar os sintomas de alguma "crise de gerência", da ameaça do "apagão elétrico" à falta de esparadrapo em um hospital do interior. Achavam que iam bem nesse combate, à luz dos resultados de pesquisas que mostraram, até agosto, que Dilma, de fato, não alcançava os níveis de aprovação necessários a uma reeleição tranquila. Mas esqueceram-se de que ela teria, a partir do início da propaganda eleitoral na televisão e no rádio, como falar diretamente com a opinião pública, mostrando as realizações de seu governo livre da censura imposta pela "grande imprensa". Quando terminou a eleição, Dilma exibia taxas de avaliação positiva amplamente suficientes para explicar sua vitória. Na mesma pesquisa Vox Populi, 42% dos respondentes disseram que consideravam "ótimo" ou "bom" o governo, ante 22% que o avaliavam como "ruim" ou "péssimo", restando 33% que afirmaram que o viam como "regular". Na mesma métrica usada durante a campanha por Aécio Neves para dizer que saíra do governo de Minas Gerais com elevadíssima popularidade, Dilma chegou a dezembro de 2014 com 75% de aprovação. Ou seja: por mais que tenham passado os últimos dois anos insistindo nas teclas da corrupção e da incompetência, nossas oposições não convenceram a quem precisavam persuadir. Talvez tenham conseguido exacerbar o antipetismo mais tosco na sociedade, aquele que se expressa na internet e nas redes sociais, mas foram incapazes de formar maiorias. Conseguiram, todavia, atingir a presidenta e o governo na economia. Chegamos ao início do segundo mandato com percepções muito negativas em dimensões como inflação, desemprego e desenvolvimento. Quase metade dos entrevistados diz-se "muito preocupada" com a inflação. No tocante ao desemprego, 53% afirmam estar "muito preocupados" ou "preocupados, ainda que não muito" com a possibilidade de ficar sem emprego. Tampouco são elevadas as expectativas de melhora do poder de compra dos salários: 28% temem que diminuam, 45% que se mantenham e apenas 19% que aumentem. No tocante à possibilidade de piora do desemprego, números idênticos: 28% esperam que cresça, 45% que permaneça e 19% que se reduza. Dilma começa seu segundo governo consciente de que as oposições tentam, mas não conseguem caracterizá-la como leniente com a corrupção ou má gestora. E convencida de que precisa alterar as expectativas a respeito da economia. Não é por outra razão que mudou a aposta na política econômica. Seria ingenuidade imaginar que insistir no que foi feito no primeiro governo agora daria certo. |
segunda-feira, 26 de janeiro de 2015
Dilma, um e dois - Marcos Coimbra
A evangelização do esporte - MIGUEL MARTINS
Revista Carta Capital -
26/01/2015
O PRB arrebanha cargos da pasta de olho na exposição das Olimpíadas e no desenvolvimento de projetos com a Universal
Braço político da Igreja Universal do Reino de Deus, do bispo Edir Macedo, o Partido Republicano Brasileiro busca arrebanhar o esporte nativo. O novo ministro do Esporte, o inexperiente George Hilton, mais conhecido por ter sido detido em um aeroporto com malas de dinheiro do que por sua atuação política, está na cúspide de uma hierarquia de pastores designados a controlar a pasta no País. O interesse do partido pelo Esporte começou a ganhar forma em 2012. Originalmente de São Bernardo do Campo, o pastor Júlio Cesar Ribeiro foi escolhido pelo PRB naquele ano para ocupar a Secretaria de Esporte do Distrito Federal. Nas eleições de 2014, Ribeiro liderou a votação para a Câmara Legislativa, apesar de residir há pouco mais de dois anos na capital federal. "Não tive votos somente do esporte", garante. "Mas com certeza a minha gestão à frente da Secretaria ajudou muito."
Se estar à frente da organização da Copa das Confederações e da Copa do Mundo em Brasília serviu de vitrine eleitoral para o pastor, os eleitores ligados à Universal, afeitos a votar em seus líderes religiosos, devem ter aprovado sua atuação. Em Brasília, Ribeiro abraçou publicamente eventos da Força Jovem Universal, grupo da igreja que promove atividades esportivas e organiza palestras contra o uso de drogas. Em 2014, a Secretaria de Esporte do DF promoveu o "Saiba Dizer Não", que atraiu milhares de fiéis ao ginásio Nilson Nelson. Neste ano, o apoio do governo do Distrito Federal ao evento foi acertado entre o deputado e sua correligionária Leila Barros, ex-jogadora de vôlei da seleção brasileira e nova secretária de Esporte. Está marcado para dia 28 de janeiro, no Mané Garrincha, estádio de Copa do Mundo.
A promoção de eventos em parceria com a Universal e a visibilidade política proporcionada pelos Jogos Olímpicos de 2016, cuja emissora oficial será a Record, somam-se no súbito interesse do PRB por ocupar postos relevantes do esporte nacional. A bancada de 24 parlamentares eleita em 2014 chancelou o interesse do partido pelo Ministério do Esporte, oferecido por Dilma Rousseff ao pastor Hilton. O foco na área não ficou restrito ao plano federal. O sucesso da experiência de Ribeiro em Brasília levou o presidente do partido, Marcos Pereira, a costurar acordos com o PSDB em São Paulo, o PSB no Distrito Federal e o PT em Minas Gerais e no Ceará para ocupar as respectivas secretarias de Esporte. Um time de quatro pastores e uma solitária ex-atleta.
A biografia política de Hilton é rasa. Pastor da Universal, teólogo e apresentador de televisão, o novo ministro foi deputado estadual em Minas Gerais entre 1999 e 2006. Em 2000, esteve à frente do programa Minas na TV, da Record. Eleito deputado federal nos últimos três mandatos, Hilton chegou a disputar em 2012 a prefeitura de Contagem, mas ficou em quarto lugar. Fora a assumida paixão pelo Cruzeiro, não acumulou experiência alguma com esportes em sua carreira política. Em 2005, foi flagrado no Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, com 11 malas e caixas recheadas de dinheiro. Ao seu lado estava Carlos Henrique Silva, escolhido pelo governador mineiro Fernando Pimentel para ocupar a Secretaria de Esporte estadual. Ambos foram liberados pela Polícia Federal, mas Hilton foi expulso do PFL, seu partido à época. Questionado sobre o episódio, o ministro argumenta que transferia de forma voluntária doações de fiéis da Universal a pedido da igreja. Resta saber por que o partido apressou-se em expulsá-lo.
Hilton e Silva são neófitos na matéria entregue a seus cuidados. O novo ministro, não sem candura, reconhece nada entender de esporte em geral. Compensa a falha, diz ele, pelo conhecimento da alma humana. O mesmo não pode ser dito dos outros secretários do PRB. Medalhista olímpica, Leila Barros é naturalmente afinada com a área. A frente da pasta em São Paulo, o pastor e vereador paulistano Jean Madeira foi um dos primeiros coordenadores da Força Jovem Universal e articulou nos últimos anos parcerias com as prefeituras paulistas para realizar eventos esportivos e religiosos no estado. O radialista e pastor David Durand, secretário no Ceará, colaborou na criação de uma liga de futebol no estado formada por jovens participantes de grupos de reabilitação para dependentes químicos.
O governo estadual do Rio de Janeiro, cuja capital será sede das Olimpíadas, também priorizou os acordos políticos em sua escolha. Embora não tenha responsabilidade direta sobre as Olímpiadas, sob alçada do prefeito Eduardo Paes, Luiz Fernando Pezão, do PMDB, escolheu para a secretaria alguém não apenas com parca experiência na área, mas na própria vida. Filho do ex-governador Sérgio Cabral, Marco Antônio Cabral tem 23 anos e ainda sequer concluiu seu curso universitário. A ausência do PRB no esporte fluminense explica-se pela disputa política de 2014: o adversário de Pezão nas eleições do ano passado foi o senador Marcelo Crivella, pastor da Universal e principal liderança do partido.
Apesar das desconfianças quanto às motivações do PRB em dominar a pasta, Hilton garante que vai articular os atores envolvidos e massificar a prática esportiva no País. "Responderei com muito diálogo e muito trabalho", afirma a Carta Capital. "Espero mudar essa impressão inicial." As primeiras críticas partiram da ONG Atletas pelo Brasil, formada por mais de 50 desportistas de diversas modalidades, entre eles o ex-nadador Gustavo Borges, a ex-jogadora de basquete Hortência e a ex-atacante de vôlei Ana Moser, que preside o grupo. Após Hilton ser anunciado em dezembro passado, o grupo chiou. "Infelizmente, há anos, o Ministério do Esporte é usado na barganha política", afirmou a ONG por meio de nota. Apesar da oposição inicial, Daniela Castro, diretora-executiva da Atletas pelo Brasil, garante que o momento de críticas passou. "O nosso interesse agora é falar de agenda. Precisamos de uma política e de um Sistema Nacional de Esporte. O País está longe das potências olímpicas." Após assumir, Hilton sinalizou manter parte da equipe que integrou a gestão de Aldo Rebelo, do PCdoB, mas começou a realizar mudanças importantes. Para a Secretaria de Alto Rendimento do Ministério, que coordena investimentos no esporte profissional, foi escolhido Ricardo Trade, diretor-executivo da Copa do Mundo da Fifa no Brasil. Substituirá Ricardo Leyser, do PCdoB.
Principal demanda dos atletas, a formulação de um Sistema Nacional de Esporte está entre as prioridades do ministério, diz Hilton. O objetivo é criar um fundo que conjugue ações integradas entre União, estados, municípios, escolas e federações esportivas para pinçar e formar talentos. O projeto foi alvo de debates de três conferências organizadas pelo PCdoB enquanto esteve à frente da pasta, mas não houve avanços relevantes.
Coma iminência das Olimpíadas do Rio de Janeiro, o Brasil perde tempo para debater sua gestão esportiva. Dez anos antes de sediar as Olimpíadas de Londres, o Reino Unido iniciou um programa para incentivar a prática de esportes pelos britânicos e desenvolver um laço com as escolas para fortalecer as modalidades olímpicas. Hilton explica de forma curiosa as limitações do projeto olímpico nacional em relação ao britânico. "Somos um País com pouco mais de 500 anos. Estamos ainda construindo uma nação." Esquece o ministro que o Brasil tem cerca de 200
milhões de habitantes enquanto o Reino Unido não chega a 70 milhões e que o número de praticantes influi no resultado. Esquece também que o atletismo e a natação, esportes de base em uma Olimpíada, são acessíveis à população mais pobre. De fato, o ministro claudica no assento.
A discussão sobre o legado social e esportivo das Olimpíadas soma-se o debate sobre a gestão e a transparência dos clubes brasileiros e das federações. Debatido no Congresso, o refinanciamento da dívida dos principais clubes brasileiros, próxima de 6 bilhões de reais, foi alvo de diversas interferências recentes da CBF. No fim do ano passado, o deputado petista Vicente Cândido, sócio em um escritório de advocacia do futuro presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, apresentou emendas para retirar do texto final da Lei de Responsabilidade Fiscal no Esporte as contrapartidas a ser apresentadas pelos clubes para renegociar seus débitos, entre elas o pagamento em dia de funcionários e jogadores.
O Bom Senso F.C., grupo de jogadores que busca racionalizar a gestão do futebol no País, queria incluir no texto a exigência de a CBF manter balanços financeiros públicos e limitar a reeleição de seu presidente a apenas um mandato. Em meio às discussões, outro integrante da bancada da bola, o deputado Jovair Arantes, do PTB, incluiu o refinanciamento das dívidas dos clubes em uma Medida Provisória relativa a temas tributários gerais, sem estabelecer contrapartidas para os clubes e a CBF. A presidenta Dilma Rousseff vetou o artigo de Arantes na terça 20.
Por mais incrível que possa parecer, Hilton teve boa impressão de Del Nero e do atual presidente, José Maria Marin, dois fiéis seguidores do ex-mandatário Ricardo Teixeira. "Os dirigentes da CBF estão atentos à nova realidade que se impõe sobre os clubes e as entidades esportivas", comenta. "A própria CBF assumiu publicamente o compromisso de incluir nos regulamentos de suas competições obrigações aos clubes quanto ao fairplay financeiro e trabalhista." Sobre a necessidade de as federações esportivas garantirem transparência de seus gastos, Hilton concorda com a exigência, especialmente se forem beneficiárias de recursos públicos. "Mesmo as entidades privadas buscam se abrir. A transparência é um valor importante no mundo hoje." Em meio à investigação de desvios de 30 milhões de reais do patrocínio do Banco do Brasil à Confederação Brasileira de Vôlei para favorecer dirigentes e ao desconhecimento sobre o destino dos lucros vultosos da CBF, uma reforma do esporte brasileiro tem de começar pelas federações. A confiança do ministro em Del Nero e Marin é um mau presságio.
O PRB arrebanha cargos da pasta de olho na exposição das Olimpíadas e no desenvolvimento de projetos com a Universal
Braço político da Igreja Universal do Reino de Deus, do bispo Edir Macedo, o Partido Republicano Brasileiro busca arrebanhar o esporte nativo. O novo ministro do Esporte, o inexperiente George Hilton, mais conhecido por ter sido detido em um aeroporto com malas de dinheiro do que por sua atuação política, está na cúspide de uma hierarquia de pastores designados a controlar a pasta no País. O interesse do partido pelo Esporte começou a ganhar forma em 2012. Originalmente de São Bernardo do Campo, o pastor Júlio Cesar Ribeiro foi escolhido pelo PRB naquele ano para ocupar a Secretaria de Esporte do Distrito Federal. Nas eleições de 2014, Ribeiro liderou a votação para a Câmara Legislativa, apesar de residir há pouco mais de dois anos na capital federal. "Não tive votos somente do esporte", garante. "Mas com certeza a minha gestão à frente da Secretaria ajudou muito."
Se estar à frente da organização da Copa das Confederações e da Copa do Mundo em Brasília serviu de vitrine eleitoral para o pastor, os eleitores ligados à Universal, afeitos a votar em seus líderes religiosos, devem ter aprovado sua atuação. Em Brasília, Ribeiro abraçou publicamente eventos da Força Jovem Universal, grupo da igreja que promove atividades esportivas e organiza palestras contra o uso de drogas. Em 2014, a Secretaria de Esporte do DF promoveu o "Saiba Dizer Não", que atraiu milhares de fiéis ao ginásio Nilson Nelson. Neste ano, o apoio do governo do Distrito Federal ao evento foi acertado entre o deputado e sua correligionária Leila Barros, ex-jogadora de vôlei da seleção brasileira e nova secretária de Esporte. Está marcado para dia 28 de janeiro, no Mané Garrincha, estádio de Copa do Mundo.
A promoção de eventos em parceria com a Universal e a visibilidade política proporcionada pelos Jogos Olímpicos de 2016, cuja emissora oficial será a Record, somam-se no súbito interesse do PRB por ocupar postos relevantes do esporte nacional. A bancada de 24 parlamentares eleita em 2014 chancelou o interesse do partido pelo Ministério do Esporte, oferecido por Dilma Rousseff ao pastor Hilton. O foco na área não ficou restrito ao plano federal. O sucesso da experiência de Ribeiro em Brasília levou o presidente do partido, Marcos Pereira, a costurar acordos com o PSDB em São Paulo, o PSB no Distrito Federal e o PT em Minas Gerais e no Ceará para ocupar as respectivas secretarias de Esporte. Um time de quatro pastores e uma solitária ex-atleta.
A biografia política de Hilton é rasa. Pastor da Universal, teólogo e apresentador de televisão, o novo ministro foi deputado estadual em Minas Gerais entre 1999 e 2006. Em 2000, esteve à frente do programa Minas na TV, da Record. Eleito deputado federal nos últimos três mandatos, Hilton chegou a disputar em 2012 a prefeitura de Contagem, mas ficou em quarto lugar. Fora a assumida paixão pelo Cruzeiro, não acumulou experiência alguma com esportes em sua carreira política. Em 2005, foi flagrado no Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, com 11 malas e caixas recheadas de dinheiro. Ao seu lado estava Carlos Henrique Silva, escolhido pelo governador mineiro Fernando Pimentel para ocupar a Secretaria de Esporte estadual. Ambos foram liberados pela Polícia Federal, mas Hilton foi expulso do PFL, seu partido à época. Questionado sobre o episódio, o ministro argumenta que transferia de forma voluntária doações de fiéis da Universal a pedido da igreja. Resta saber por que o partido apressou-se em expulsá-lo.
Hilton e Silva são neófitos na matéria entregue a seus cuidados. O novo ministro, não sem candura, reconhece nada entender de esporte em geral. Compensa a falha, diz ele, pelo conhecimento da alma humana. O mesmo não pode ser dito dos outros secretários do PRB. Medalhista olímpica, Leila Barros é naturalmente afinada com a área. A frente da pasta em São Paulo, o pastor e vereador paulistano Jean Madeira foi um dos primeiros coordenadores da Força Jovem Universal e articulou nos últimos anos parcerias com as prefeituras paulistas para realizar eventos esportivos e religiosos no estado. O radialista e pastor David Durand, secretário no Ceará, colaborou na criação de uma liga de futebol no estado formada por jovens participantes de grupos de reabilitação para dependentes químicos.
O governo estadual do Rio de Janeiro, cuja capital será sede das Olimpíadas, também priorizou os acordos políticos em sua escolha. Embora não tenha responsabilidade direta sobre as Olímpiadas, sob alçada do prefeito Eduardo Paes, Luiz Fernando Pezão, do PMDB, escolheu para a secretaria alguém não apenas com parca experiência na área, mas na própria vida. Filho do ex-governador Sérgio Cabral, Marco Antônio Cabral tem 23 anos e ainda sequer concluiu seu curso universitário. A ausência do PRB no esporte fluminense explica-se pela disputa política de 2014: o adversário de Pezão nas eleições do ano passado foi o senador Marcelo Crivella, pastor da Universal e principal liderança do partido.
Apesar das desconfianças quanto às motivações do PRB em dominar a pasta, Hilton garante que vai articular os atores envolvidos e massificar a prática esportiva no País. "Responderei com muito diálogo e muito trabalho", afirma a Carta Capital. "Espero mudar essa impressão inicial." As primeiras críticas partiram da ONG Atletas pelo Brasil, formada por mais de 50 desportistas de diversas modalidades, entre eles o ex-nadador Gustavo Borges, a ex-jogadora de basquete Hortência e a ex-atacante de vôlei Ana Moser, que preside o grupo. Após Hilton ser anunciado em dezembro passado, o grupo chiou. "Infelizmente, há anos, o Ministério do Esporte é usado na barganha política", afirmou a ONG por meio de nota. Apesar da oposição inicial, Daniela Castro, diretora-executiva da Atletas pelo Brasil, garante que o momento de críticas passou. "O nosso interesse agora é falar de agenda. Precisamos de uma política e de um Sistema Nacional de Esporte. O País está longe das potências olímpicas." Após assumir, Hilton sinalizou manter parte da equipe que integrou a gestão de Aldo Rebelo, do PCdoB, mas começou a realizar mudanças importantes. Para a Secretaria de Alto Rendimento do Ministério, que coordena investimentos no esporte profissional, foi escolhido Ricardo Trade, diretor-executivo da Copa do Mundo da Fifa no Brasil. Substituirá Ricardo Leyser, do PCdoB.
Principal demanda dos atletas, a formulação de um Sistema Nacional de Esporte está entre as prioridades do ministério, diz Hilton. O objetivo é criar um fundo que conjugue ações integradas entre União, estados, municípios, escolas e federações esportivas para pinçar e formar talentos. O projeto foi alvo de debates de três conferências organizadas pelo PCdoB enquanto esteve à frente da pasta, mas não houve avanços relevantes.
Coma iminência das Olimpíadas do Rio de Janeiro, o Brasil perde tempo para debater sua gestão esportiva. Dez anos antes de sediar as Olimpíadas de Londres, o Reino Unido iniciou um programa para incentivar a prática de esportes pelos britânicos e desenvolver um laço com as escolas para fortalecer as modalidades olímpicas. Hilton explica de forma curiosa as limitações do projeto olímpico nacional em relação ao britânico. "Somos um País com pouco mais de 500 anos. Estamos ainda construindo uma nação." Esquece o ministro que o Brasil tem cerca de 200
milhões de habitantes enquanto o Reino Unido não chega a 70 milhões e que o número de praticantes influi no resultado. Esquece também que o atletismo e a natação, esportes de base em uma Olimpíada, são acessíveis à população mais pobre. De fato, o ministro claudica no assento.
A discussão sobre o legado social e esportivo das Olimpíadas soma-se o debate sobre a gestão e a transparência dos clubes brasileiros e das federações. Debatido no Congresso, o refinanciamento da dívida dos principais clubes brasileiros, próxima de 6 bilhões de reais, foi alvo de diversas interferências recentes da CBF. No fim do ano passado, o deputado petista Vicente Cândido, sócio em um escritório de advocacia do futuro presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, apresentou emendas para retirar do texto final da Lei de Responsabilidade Fiscal no Esporte as contrapartidas a ser apresentadas pelos clubes para renegociar seus débitos, entre elas o pagamento em dia de funcionários e jogadores.
O Bom Senso F.C., grupo de jogadores que busca racionalizar a gestão do futebol no País, queria incluir no texto a exigência de a CBF manter balanços financeiros públicos e limitar a reeleição de seu presidente a apenas um mandato. Em meio às discussões, outro integrante da bancada da bola, o deputado Jovair Arantes, do PTB, incluiu o refinanciamento das dívidas dos clubes em uma Medida Provisória relativa a temas tributários gerais, sem estabelecer contrapartidas para os clubes e a CBF. A presidenta Dilma Rousseff vetou o artigo de Arantes na terça 20.
Por mais incrível que possa parecer, Hilton teve boa impressão de Del Nero e do atual presidente, José Maria Marin, dois fiéis seguidores do ex-mandatário Ricardo Teixeira. "Os dirigentes da CBF estão atentos à nova realidade que se impõe sobre os clubes e as entidades esportivas", comenta. "A própria CBF assumiu publicamente o compromisso de incluir nos regulamentos de suas competições obrigações aos clubes quanto ao fairplay financeiro e trabalhista." Sobre a necessidade de as federações esportivas garantirem transparência de seus gastos, Hilton concorda com a exigência, especialmente se forem beneficiárias de recursos públicos. "Mesmo as entidades privadas buscam se abrir. A transparência é um valor importante no mundo hoje." Em meio à investigação de desvios de 30 milhões de reais do patrocínio do Banco do Brasil à Confederação Brasileira de Vôlei para favorecer dirigentes e ao desconhecimento sobre o destino dos lucros vultosos da CBF, uma reforma do esporte brasileiro tem de começar pelas federações. A confiança do ministro em Del Nero e Marin é um mau presságio.
O perigo da extrema direita - Renato Janine Ribeiro
Valor Econômico 26/01/2015
A extrema-direita brasileira acaba apoiando o PSDB. É bom ela não ter identidade própria - ou ela contamina o partido tucano?
Cresce a extrema direita no Brasil. Felizmente, tirando os deputados Feliciano e Bolsonaro, tem pouca presença institucional. Mas, de duas uma: ou criará um partido novo, ou continuará numa relação ambígua com o PSDB, que lhe dá votos mas perturba a identidade.
A extrema-direita brasileira acaba apoiando o PSDB. É bom ela não ter identidade própria - ou ela contamina o partido tucano?
Cresce a extrema direita no Brasil. Felizmente, tirando os deputados Feliciano e Bolsonaro, tem pouca presença institucional. Mas, de duas uma: ou criará um partido novo, ou continuará numa relação ambígua com o PSDB, que lhe dá votos mas perturba a identidade.
A extrema direita não elege quase ninguém aqui. Para cargos executivos,
menos ainda. Mas se fortalece na expressão de suas ideias. É fraca em
poder, mas avança no berro. Para usar a expressão de Gramsci, disputa a
hegemonia. Degrada o debate no país.
Durante alguns anos, PSDB e PT, representando nossa centro-direita e
centro-esquerda, viveram uma aproximação na prática - ainda que ela
fosse negada no discurso de ambos. Mas nos últimos anos a retórica subiu
em decibéis. Temos um paradoxo: candidato, Aécio Neves prometeu
continuar a política social do PT; reeleita, Dilma Rousseff adotou
medidas econômicas dos tucanos. Portanto, a realidade não os afasta
tanto - mas, na aparência, eles parecem estar quase em guerra. O que
vale, a realidade fria ou a aparência raivosa? As políticas econômicas e
sociais, ou a retórica desenfreada? a razão ou a paixão? Porque guerras
favorecem os extremos.
Onde é mais fácil ver a extrema direita é na internet. Ela povoa os
comentários das redes sociais e das edições online dos jornais. É
incrível o ódio que destila. Há poucos dias, lendo as notícias sobre o
fuzilamento de Marcos Archer na Indonésia, me surpreendeu a quantidade
de comentários atacando o PT, que nada tinha a ver com o assunto. A
maior parte era escrita por pessoas desinformadas da realidade e
desacostumadas ao cultivo da língua. Mas são veementes. Felizmente, não
vão muito além do Facebook e dos blogs.
Ou não iam. Saíram da internet e foram para as ruas nos últimos meses -
numa paródia, em menor, das manifestações de 2013. Pediram que os
militares rasgassem a Constituição e tomassem o poder. No diagnóstico,
erram. Misturam em seu ódio homossexualidade, Hugo Chávez e programas
sociais. Nas suas propostas, nem percebem que o mundo atual não está
para golpes. O que fariam as Forças Armadas, se tomassem o poder? Meio
século atrás, os golpistas tinham uma agenda inteira montada. Os
militares não tinham afeição pela democracia. Os empresários receavam os
movimentos sociais, que avançavam. A economia estava em grave crise. O
governo norte-americano apoiava qualquer golpe de direita na América
Latina. Hoje, nada disso existe. Os extremistas são, literalmente,
reacionários. Querem que o mundo recue. Não têm projeto viável.
Esse público nas ruas e na Internet vai além de seus próprios pregadores
na mídia. Alguns colunistas de jornal chegaram perto de declarar
ilegítima a eleição de 2014, o que é uma afirmação bastante grave de se
fazer numa democracia, mas não lembro nenhum que tenha pedido a
derrubada do governo eleito. Entre os ideólogos e seus seguidores que
foram às passeatas ou escrevem em blogs, há uma distância. Os primeiros
são mais informados, mais inteligentes. Os segundos, não. Apenas
radicalizam.
Mas um problema sério é que essa extrema direita, que tem votado no PSDB
nos momentos decisivos, pressiona nosso partido que porta em seu nome a
social-democracia - uma denominação típica da esquerda - a ir para a
direita. E isso traz alguns resultados. Assim se entende o uso do aborto
na campanha tucana em 2010 ou a ênfase de Alckmin numa política
repressiva de segurança. Esse fato cria problemas de identidade no PSDB,
reduzindo o peso do passado glorioso de Montoro, Covas, Ruth Cardoso. É
óbvio que FHC não deve se sentir confortável com esse avanço dos
extremismos.
Pode essa extrema direita, que é mais forte em São Paulo, mas cujo
tamanho exato ninguém no Brasil é capaz de mensurar, alterar a natureza
do PSDB? Não me parece provável. Ela deve manter seu papel de aliada
subordinada. Presta o serviço de destruir imagens petistas e recebe
alguma compensação midiática por isso. Mas é uma aliada incômoda. Não
gosta dos direitos humanos, com os quais o PSDB histórico tem um forte
compromisso. Não gosta dos programas sociais, dos quais os tucanos não
querem ou não podem abrir mão.
Pior, a extrema direita carrega o risco de convencer demais. Ela ajuda o
PSDB na medida em que reforça o antipetismo de parte razoável do
eleitorado - mas, se crescer em votos, pode fazer os tucanos perderem os
votos de seus eleitores iluministas e, pior, tornar-se dominante em
algumas seções regionais do PSDB, o que poria o partido em sério risco.
Há outra possibilidade, para a qual me alertou o cientista político
português Álvaro Vasconcelos, ora professor visitante no IRI da USP. Sem
o PSDB, a extrema direita pode se tornar um partido próprio, e este
pode ganhar força. É o que sucede na Europa. A Frente Nacional ameaça a
política francesa há anos. Tem uma votação elevada, embora o sistema
eleitoral francês traduza esses sufrágios em pouquíssimos cargos de
efetiva significação.
Mas essa é uma possibilidade remota. Como a extrema direita brasileira,
dado o seu exacerbado antipetismo, acaba apoiando o PSDB, ela não se
organiza para tomar o poder. Prefere operar nas laterais. Sabe que -
hoje - teria poucos votos, se disputasse as eleições para valer. Mas é
preciso fazer constantemente o balanço do que é melhor para o país e
para os tucanos - se é a extrema direita continuar subordinada, sem voz
independente mas podendo minar um partido sério, com história e com
futuro, ou se é ela adquirir voz e identidade próprias, com o risco de
crescer mais. Porque o atual, talvez crescente, desencanto com os
políticos favorece aventuras.
Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.
Solitação - Eduardo Almeida Reis
Rapariga, substantivo feminino em nosso idioma desde o século 13, é mulher adolescente, jovem, moça, raparigota
Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 26/01/2015O menino é tido no grupo em que treina como um novo Neymar, tamanha sua identidade com a bola. Só pensa em futebol, respira futebol, vai mal na escola. Há um ano pedi ao Alexandre Kalil, que tinha na conta de amigo, que marcasse um dia para o eletricista levar o menino ao CT do Atlético abrindo caminho para sua futura inclusão na turma da base. Kalil não disse que sim, nem que não, muito antes pelo contrário, aliás: indicou o nome de uma funcionária da diretoria que me enrolou durante meses.
Há 90 dias, depois de passar um domingo inteiro jogando futebol, o menino amanheceu queixando-se de dores numa perna. Com o pai trabalhando, a avó levou-o ao SUS, onde foi radiografado e diagnosticado como tendo a patela fora do esquadro. Saiu da consulta com a lista de uma porção de remédios e as muletas, que a avó comprou na esquina.
Uma semana, quinze dias, um mês, o craque de muletas, entupido de remédios, sem dores no osso sesamoide situado na parte anterior do joelho, anteriormente denominado rótula. Desconfiado, o eletricista marcou uma consulta com ortopedista conceituado aqui na praça. Ao olhar a radiografia do SUS, o ortopedista mandou radiografar o menino lá mesmo na sua clínica, comparou as duas chapas e explicou ao pai: “Este menino não tem nada. Tiraram a primeira radiografia com ele torto. Joga fora as muletas, suspende os remédios, volta ao futebol e traz o menino daqui a vinte dias, quando acabar o efeito dos remédios”.
Dito e feito: o craque está zero bala. Agora, preciso conhecer alguém que me apresente ao Dr. Gilvan de Pinho Tavares para mandar avaliar o menino na Toca da Raposa. Guilherme Mendes, diretor de comunicação do Cruzeiro, brilhante jornalista formado pela UFJF, Universidade Federal de Juiz de Fora, bem que podia cuidar disso.
Consulta
Telefonema de velha amiga, que não vejo há milênios, identifcando-se como mãe do Paulo, jovem amigo que não vejo há séculos. Não atino como ela possa ter conseguido o novo número do meu celular. A consulta era simples: ela disse que tem a Coleção do Centenário, do Eça, sabe que também tenho e quer saber onde encontrar o texto “As singularidades de uma rapariga loura”.
Pergunto o seu e-mail, que anoto num bloquinho, informo que estou no meio de um suelto sobre a Petrobras, depois procuro no Eça e informo via e-mail. Terminado o suelto, foi fácil: fiz a pesquisa e informei: “Volume VIII, página 269”.
Rapariga loura me lembra das raparigadas em que andei metido quando procurei fazenda para comprar no Norte de Minas: casas de raparigas, regionalismo brasileiro: mulheres que vivem da prostituição, meretrizes, prostitutas. Os amigos procuravam as raparigas e o jovem philosopho, solidário, os acompanhava.
Rapariga, substantivo feminino em nosso idioma desde o século 13, é mulher adolescente, jovem, moça, raparigota, mas tem um monte de significados, entre os quais o regionalismo prostituta. Em Portugal, o regionalismo é para moça do campo, roceira.
Aproveitei a embalagem para reler o conto do Eça, que foi filmado pelo cineasta português hoje a caminho dos 104 ou 105 aninhos, não o filme, e sim o cineasta.
O mundo é uma bola
26 de janeiro de 1531: terremoto em Lisboa mata 30 mil pessoas, mas o terremoto lisboeta famoso, mesmo, só ocorreria em 1755. Em 1546, Brás Cubas funda a cidade de Santos, no litoral paulista. Em 1654, rendição dos holandeses em Recife retirando-se definitivamente do Brasil e se livrando do frevo, que é dose. Em 1788, desembarque dos primeiros colonos ingleses na atual Sydney, Austrália. Em 1827, o Peru anuncia o fim de sua união com a Colômbia e se declara independente. Em 1839, elevação da vila de Santos à condição de cidade. Em 1870, com o fim da Guerra da Secessão, o estado de Virginia é readmitido na União. Em 1887, início da construção da Torre Eiffel em Paris. Corre na internet um conjunto de fotos de torres modernas, algumas bonitas, outras espantosas, geralmente nos países que nadam em petróleo. Em 1905, encontrado na mina Premier, África do Sul, um diamante de 3.106 quilates, o maior do mundo. Chama-se Cullinan em homenagem a Thomas Cullinan, dono da mina. Em 1950, proclamação da República da Índia.
Em 1998, o presidente Bill Clinton, dos EUA, nega pela derradeira vez ter mantido relações sexuais com a estagiária Monica Lewinsky no Salão Oval da Casa Branca, mas a moça guardou sem lavar o vestido respingado pelo sêmen presidencial.
Ruminanças
“Observo em minhas viagens esta prática para aprender sempre algo com outrem (que é uma das mais belas escolas que possa haver) de levar sempre os com que me entretenho a conversar das coisas de que mais entendem” (Montaigne, 1533-1592).
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