Entrevista: Alemanha atrai número grande de imigrantes altamente qualificados
- ShutterstockNos últimos anos, a Alemanha começou a atrair um grande número de imigrantes altamente qualificados
Nos últimos anos, a Alemanha começou a atrair um grande número de imigrantes altamente qualificados. O especialista em perfil demográfico Reiner Klingholz diz que isso pode ser vital para o futuro do país, apesar dos atuais problemas com a integração dos estrangeiros.
Spiegel – Klingholz, em seu estudo "New Potential" ("Novo Potencial", em tradução livre), você ressalta um paradoxo: apesar de a Alemanha ter se tornado um país que recebe muitos imigrantes, muitos problemas relacionados à integração dessas pessoas ainda não foram resolvidos.
Klingholz – Atualmente, as empresas alemãs estão atraindo imigrantes que são, em média, mais qualificados do que a população nacional. Em 2010, mais de um terço dos imigrantes provenientes do sul da Europa tinha nível universitário. Eles estão fazendo contribuições significativas para o bom estado da nossa economia. Aqueles que vieram para a Alemanha como trabalhadores convidados em décadas passadas geralmente tinham pouca qualificação. Isso significa que, hoje em dia, essas pessoas geralmente têm empregos mal remunerados ou estão desempregadas ou recebem baixas aposentadorias.
Além disso, os filhos dessas pessoas geralmente apresentam uma desvantagem educacional. Apenas uma em cada quatro crianças – ou 25% – filhas de imigrantes turcos consegue obter o diploma do ensino médio em escolas preparatórias para a universidade (Nota da tradutora: essas escolas, chamadas de Gymnasium, têm forte ênfase na aprendizagem acadêmica e destinam-se a preparar os alunos para entrar na universidade, ao contrário das escolas técnicas, por exemplo). Entre os filhos de pais alemães, essa taxa é de 43%.
Spiegel – Por que os filhos e netos de imigrantes turcos têm tanta dificuldade na escola e no mercado de trabalho?
Klingholz – Em toda a população alemã, o nível de escolaridade dos pais tem uma enorme influência sobre o sucesso escolar dos filhos. Dessa maneira, não é nenhuma surpresa que os filhos das famílias turcas que foram convidadas para trabalhar na Alemanha estejam entre aqueles que têm mais dificuldade na escola. Além disso, essas famílias frequentemente tiveram experiências negativas em relação à integração no país. Essas pessoas são discriminadas no mercado de trabalho devido a suas origens mesmo que tenham as qualificações necessárias. O resultado, muitas vezes, se reflete na seguinte crença: mesmo com mais educação, nós não seremos capazes de ascender na escada social.
Spiegel – Recentemente, milhares de turcos-alemães fizeram festa para homenagear o primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, na cidade de Colônia. Esse é um sinal de que eles ainda não se sentem totalmente em casa na Alemanha?
Klingholz – Há várias razões para essas homenagens ao primeiro-ministro turco. Pessoas de origem turca de todos os estratos sociais participaram dessa homenagem. Mas aqueles que têm oportunidades limitadas aqui e não se sentem aceitos certamente anseiam por mais força e por sua terra natal. Para essas pessoas, Erdogan representa uma Turquia economicamente bem-sucedida e forte, mesmo que, na realidade, existam problemas significativos no país.
Spiegel – Como a integração desses imigrantes de classes sociais mais baixas poderia ser mais bem-sucedida?
Klingholz – As crianças devem ser matriculadas em creches de língua alemã em uma idade precoce. Tudo o que não pode ser oferecido em casa, pelos pais, deve ser oferecido pelo ensino público da primeira infância. E elas precisam ter exemplos positivos. Temos que mostrar para os jovens imigrantes que as pessoas de seu grupo podem ascender na escada social, mas que é necessário ter iniciativa pessoal. Mesmo alguém tão bom quanto (o astro do futebol profissional alemão) Mesut Özil não chegaria onde está sem esforço.
Spiegel – O governo da chanceler Angela Merkel se orgulha de ter tomado medidas para diminuir as regras relacionadas à obtenção da dupla cidadania. Há um bom motivo para todo esse orgulho?
Klingholz – O projeto de lei é sensato, pois permite que as crianças filhas de pais estrangeiros nascidas na Alemanha mantenham ambas as cidadanias depois de alguns anos. Para os imigrantes, no entanto, a dupla cidadania só é reservada às pessoas de certos países-membros da UE (União Europeia), por exemplo. Isso é incompreensível.
Spiegel – Atualmente, as questões relacionadas à integração são tratadas pelo Ministério do Interior. Será que isso faz sentido?
Klingholz – As questões relacionadas à segurança interna desempenham um grande papel entre os temas tratados pelo Ministério do Interior. Mas, com a imigração, o foco principal recai sobre as necessidades das empresas alemãs por trabalhadores qualificados. Dessa maneira, o Ministério da Economia provavelmente seria o melhor órgão para lidar com essa questão.
Spiegel – Os alemães têm um grande medo dos "imigrantes da pobreza", originários do Leste Europeu.
Klingholz – E, apesar disso, a Europa Oriental tem nos enviado um número maior do que a média de pessoas altamente qualificadas, como médicos e engenheiros. Em 2010, por exemplo, mais de 40% dos imigrantes romenos e búlgaros com idades entre 30 e 64 anos tinham diploma universitário. Muitas das pessoas com pouca qualificação que vêm desses países são trabalhadores sazonais. Mas o mercado de trabalho necessita desses dois grupos de trabalhadores. Sempre há, é claro, os imigrantes que sobrecarregam o nosso sistema de previdência social. Em 2010, a taxa de desemprego entre os romenos e os búlgaros que viviam na Alemanha era de 10%.
Spiegel – De acordo com seu estudo, a Alemanha é dependente da imigração.
Klingholz – Os "baby-boomers", aquelas pessoas que vieram ao mundo quando o número de nascimentos estava em alta, atualmente estão se aproximando da idade da aposentadoria. Por volta do ano 2030, haverá o dobro de pessoas se aposentando anualmente em relação ao total de jovens que estarão entrando no mercado de trabalho. Nem as empresas serão capazes de sobreviver sem a imigração nem será possível financiar os sistemas de previdência social sem os imigrantes.
Spiegel – Será que a imigração é capaz de acabar com as significativas mudanças demográficas que estão ocorrendo?
Klingholz – Não, mas ela pode amortecer o golpe. É verdade que os imigrantes tendem a ter entre 20 e 30 anos no momento em que chegam aqui e que, em média, costumam ter uma quantidade um pouco maior de filhos do que os nativos – eles diminuem a faixa etária da população em geral, tornando-a mais jovem. Mas eles também envelhecem, e a taxa de natalidade entre os grupos de imigrantes tende a cair para os níveis mais baixos que observamos atualmente aqui na Alemanha no período de uma geração.
Tradutora: Cláudia Gonçalves