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Depois de cursar filosofia, Maíra Nassif
Passos fundou a Relicário Edições, que trabalha com rede de amigos
%u201Cque têm habilidades a oferecer%u201D e tem 10 volumes lançados |
Por
pouco, o clima bucólico interiorano de Cidadezinha qualquer, de Carlos
Drummond de Andrade, não cai perfeito à Rua Capuraque, do Bairro
Floresta, Leste de Belo Horizonte. A casa 1, do número 55, abriga uma
(espécie de) república, além da Relicário Edições, criada pela graduada
em filosofia pela UFMG Maíra Nassif Passos, de 29 anos.
A
microempresa vem surpreendendo o ainda tímido mercado editorial mineiro,
com a publicação de pérolas como A vida porca (El juguete rabioso), do
argentino Roberto Arlt (1900-1942), já em segunda edição no Brasil.
Produto da parceria de Maíra com o tradutor Davidson de Oliveira Diniz,
doutor em literatura argentina, a edição do volume reflete o clima
independente, quase artesanal da pequena editora, para a qual também
trabalha a designer Ana C. Bahia, amiga de Maíra, que assina a criação
da capa da obra.
“O processo de trabalho é sempre com a rede
de amigos, que têm habilidades a oferecer”, diz Maíra. O namorado dela,
Lucas Morais, de 28, que trabalha também para outras editoras, é
responsável pela revisão de textos na Relicário Edições.
Depois da
estreia com Personagens conceituais – Filosofia e arte em Deleuze, de
Fernando Torres Pacheco, a editora já lançou mais nove títulos, entre os
quais A festa do adeus, livro de contos que marca a estreia de Leonardo
Beltrão, de 30. “Além de dificuldades de financiamento, o próprio
mercado editorial é complicado. Ele é muito fechado”, afirma o escritor
estreante, que trabalha como gestor cultural há alguns anos.
Nicho
Na opinião dele, a literatura, ao lado da dança, é o segmento da arte
com mais dificuldade de se organizar mercadologicamente. Resultado: além
do livro escolar, cujo principal cliente é o governo, o outro nicho
mais explorado é sempre a literatura estrangeira, com os famosos
best-sellers.
“Em Minas Gerais, o mercado é muito imaturo,
embora estejam surgindo editoras como a Relicário, Polvilho Edições,
Scriptum Livraria e Editora e Aletria Editora, que está inaugurando uma
linha de poesia”, lista o jovem escritor, que já está escrevendo uma
novela, com o título provisório De Rishikesh a Marrakesh, inspirada na
viagem de um ano que fez por 14 países, entre Europa, Ásia e África.
Editar
obras do poeta alemão Christian Morgenstern (1871-1914), do austríaco
Ernst Jandl (1925-2000), do filósofo Philippe Lacoue-Labarthe
(1940-2007) e do pensador Michel Carrouges, ambos franceses, está nos
planos de Maíra, que tem viabilizado traduções brasileiras de obras
estrangeiras para a Relicário via editais de embaixadas. “Eles não
custeiam integralmente. É uma ajuda”, afirma.
Esse recurso
também atrai as jovens Luísa Rabello, Carolina Fenati, Cecília Rocha e
Júlia de Carvalho Hansen, proprietárias da Chão da Feira, cuja estreia
no mercado editorial, há aproximadamente três anos, ocorreu na
plataforma on-line. Batizada com o nome de uma travessa de Lisboa, na
qual mora atualmente Carolina, que conclui doutorado em literatura em
Portugal, a editora contabiliza cinco títulos, além de uma revista
literária gratuita, cujo segundo número será lançado em junho.
Enquanto
a Relicário Edições se debruça sobre duas linhas de publicações –
livros acadêmicos (nas áreas de filosofia e estudos literários) e
literatura em geral, aberta a novos talentos e a traduções de autores
consagrados – a Chão da Feira vai da literatura ao ensaio filosófico,
passando pela poesia, correspondência e livros de fotografia em diálogo
com a literatura.
As incursões estrangeiras da editora comandada por
mulheres na faixa dos 30-35 anos inclui o filósofo francês Jean-Luc
Nancy. Graduadas em diferentes áreas – artes visuais, história, letras e
comunicação social – as meninas da Chão da Feira começaram com o
Caderno de Leituras, on-line, que acabou gerando a revista literária.
Depois
de uma edição dedicada à correspondência (Cartas para todos e para
ninguém), a próxima, com direito a ensaios, poemas e outros gêneros, vai
se pautar sobre cartografias. A partir do segundo número, a revista
literária, que nasceu independente, passou a ser viabilizada com
recursos captados via Lei Municipal de Cultura.
A exemplo da
Relicário Edições, a Chão da Feira também não tem sede física para a
venda dos livros. A editora recebe pedidos por e-mail
(livro@chãodafeira.com), além de comercializar seus produtos em lojas
físicas de Belo Horizonte (livrarias Quixote e Scriptum), Lisboa (Letra
Livre e Paralelo W) e Porto (Gato Vadio) e no modo virtual
(www.quartoamado.com).
“Estamos felizes por ver que são muitas
as iniciativas na área. É saudável”, diz Luísa Rabello, ela mesma
autora de uma das cinco obras publicadas pela Chão de Feira (Entrar e
sair). Os demais títulos do catálogo são À escuta, de Jean-Luc Nancy;
Alforria blues ou poemas do destino do mar, da sócia Júlia de Carvalho
Hansen; A carta do Lord Chandos, de Hugo von Hofmannsthal, em tradução
de João Barrento, e Literatura, defesa do atrito, da portuguesa Silvina
Rodrigues Lopes. “Este ano, estamos sentindo que, com o segundo volume
da revista e novos títulos, vamos dar uma crescida”, aposta a
autora-editora, esclarecendo que o objetivo é publicar pouco, porém com
cuidado.
Conta-gotas Segundo a editora da
Relicário, os livros do selo costumam vender bem no ato de lançamento.
Depois, “é a conta-gotas”. “Confesso que não fiz plano de negócios. Fiz
tudo intuitivamente, não pesquisei mercado. As portas foram se abrindo, e
eu entrando”, afirma Maíra. A editora tem conseguido presença nos
mercados do Rio de Janeiro, na livraria Travessa, e de São Paulo, na
livraria Cultura.
Em BH, ela deixou 78 exemplares em
consignação em diversas lojas e diz que se surpreendeu com o resultado
de vendas. Associada à Liga Brasileira de Editoras (Libre), com sede em
São Paulo, Maíra também apoia iniciativas como as feiras independentes,
em locais como o Edifício Malleta, a Praça da Liberdade e o Galpão
Cine-Horto. A média das tiragens da Reclicário Edições é de 500
exemplares.
A autobiografia do cientista político, escritor, ativista
e dissidente cubano Charles George Moore Wedderburn, editada sob o
título Pichón, com direito a capítulo inedito, é a novidade da Nandyala
prevista para chegar ao mercado em junho.
Criada há oito anos,
a editora – que posteriormente também se tornaria uma livraria e um
instituto de utilidade pública – é especializada nas relações
étnico-raciais e de gênero. “Por isso mesmo, o mercado é bastante
sazonal para nós”, afirma Iris Amâncio, uma das proprietárias. Com 101
títulos já lançados, a Nandyala prevê editar 13 livros neste ano,
incluindo Pichón, cuja edição teve campanha de crowdfunding. Entre as
novidades da editora está a publicação de Olivio Jekupe, autor indígena
da aldeia Crucutu, de São Paulo. “Será uma narrativa sobre o povo
guarani”, conta Iris, que também quer publicar autores infantis.
Neste
mês, a Nandyala pretende mandar para as lojas Eu e o outro, de Cristina
Teodoro Trinidade. Trata-se de um ensaio a respeito da discriminação
racial na infância, seguido da tradução de Uma ideia de filosofia
africana, de Marcien Towa, de Camarões.
Pesquisa inédita mapeia o setor
Ailton Magioli
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Leonardo Beltrão lançou seu primeiro livro, A
festa do adeus, pela Relicário. Ele considera o mercado editorial
%u201Cmuito fechado%u201D |
Pesquisa inedita a
ser divulgada neste mês pela Câmara Mineira do Livro (CML) revela que,
das 77 editoras existentes no estado, 56 estão instaladas na capital.
Primeira iniciativa do gênero em Minas Gerais, a pesquisa mapeia também
livrarias e distribuidoras do estado, além das editoras.
Belo
Horizonte e oito cidades-polo (Teófilo Otoni, Poços de Caldas, Juiz de
Fora, Uberlândia, Divinópolis, Governador Valadares, Patos de Minas e
Montes Claros) foram as cidades pesquisadas pela CML, que promete trazer
à tona o hábito de leitura da capital e do interior, com direito
inclusive a um perfil do leitor mineiro.
Viabilizada com recursos
próprios e do Fundo Estadual de Cultura (FEC), a pesquisa reúne dados da
cadeia produtiva do livro, incluindo o número de empregados na área e o
faturamento do setor.
Além da Câmara Mineira do Livro, que tem
50 associados, Belo Horizonte também sedia o Clube de Editoras Mineiras,
com 10 empresas-associadas.