quarta-feira, 19 de junho de 2013

Quadrinhos

folha de são paulo
CHICLETE COM BANANA      ANGELI
ANGELI
PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE
LAERTE
DAIQUIRI      CACO GALHARDO
CACO GALHARDO
NÍQUEL NÁUSEA      FERNANDO GONSALES
FERNANDO GONSALES
MUNDO MONSTRO      ADÃO ITURRUSGARAI
ADÃO ITURRUSGARAI
BIFALAND, A CIDADE MALDITA      ALLAN SIEBER
ALLAN SIEBER
MALVADOS      DIK BROWNE
DIK BROWNE
GARFIELD      JIM DAVIS
JIM DAVIS

Turismo cervejeiro ganha rotas no Brasil

folha de são paulo

Na trilha da cerveja

DANIELLE NAGASE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A receita é basicamente a mesma: água, malte e lúpulo. Uma ou outra cervejaria até acrescenta uma firula, como rapadura e especiarias.
Apesar da composição semelhante, cada cerveja é única em cor, aroma e sabor. E a origem das diferenças está na qualidade dos ingredientes e nos detalhes da fabricação.
Para descobri-los, um bom caminho é conversar com o mestre-cervejeiro ou bisbilhotar as fábricas.
Com cada vez mais interessados pelas cervejas artesanais, agências de turismo e entusiastas trouxeram para o Brasil o que há muito se faz nos Estados Unidos e na Europa: os tours cervejeiros.
São roteiros que geralmente incluem visitas a fábricas, bares, restaurantes e lojas, guiadas por um especialista.
Desde o ano passado, foram lançados cinco pacotes -em Morretes (PR), Blumenau (SC), interior de São Paulo e dois em Belo Horizonte (MG).
E, até o final do ano, devem surgir mais dois novos tours de trem, no Pantanal (MS) e em Bento Gonçalves (RS).
Foram inspirados no Beer Train, um passeio pelas serras da mata atlântica, no qual se percorre a estrada de ferro entre Curitiba e Morretes. De dentro do vagão, apreciam-se a paisagem e as cervejas.
Já o Beer Tour, em Belo Horizonte, repare, começa em um bar. "Tomamos café da manhã já com cervejas", diz o organizador Rodrigo Lemos. São servidos rótulos de trigo, mais leves e menos alcoólicos, e outros com malte torrado, "com notas de café, comum no desjejum".
No interior de São Paulo também há atrações. O Beer Route sai da capital e leva à Dama Bier, em Piracicaba, e à Rofer, em Itupeva. A excursão termina com "hamburgada" harmonizada na Cervejoteca, em São Paulo.
Quando o mestre-cervejeiro Ilceu Dimer recebe turistas em visitação à cervejaria Dama Bier, em Piracicaba, no interior de São Paulo, não esconde o prazer de repassar o que sabe sobre o processo de fabricação da bebida.
"Nesta panela, acrescentamos o lúpulo, enquanto o mosto [mistura de água e malte] ferve. Primeiro, os de amargor e, no final, as amostras aromáticas", explica Dimer aos visitantes. "São pequenos detalhes, mas que modificam as características sensoriais da cerveja. Não é lindo isso?"
Ele fala sobre os princípios básicos da produção e também sobre os macetes que aprendeu nos mais de 30 anos de experiência em cervejarias -hoje, Dimer elabora as receitas da
Dama Bier com o sommelier Paulo Feijão.
Em outras cervejarias, as visitas transcorrem de maneira semelhante, sempre guiadas por um profissional que domina cada passo da produção.
"É uma aula sobre as cervejas artesanais. Vê-se de perto o empenho dos mestre-cervejeiros em fazer um produto de qualidade", afirma o sommelier Gustavo Renha, que organiza excursões em Belo Horizonte (BH).
Outro atrativo é a oportunidade de provar versões direto do tanque, com aroma e sabor apurados, diferente do que se encontra nas amostras engarrafadas. "Provamos cervejas em diferentes estágios de maturação e percebemos como evoluem de acordo com o tempo", complementa Renha.
Editoria de Arte/Folhapress
Editoria de Arte/Folhapress
Turismo cervejeiro ganha rotas no Brasil
Em visita às fábricas, turistas acompanham o processo produtivo das cervejas e provam a bebida direto da fonte
COLABORAÇÃO PARA A FOLHAQuando o mestre-cervejeiro Ilceu Dimer recebe turistas em visitação à cervejaria Dama Bier, em Piracicaba, no interior de São Paulo, não esconde o prazer de repassar o que sabe sobre o processo de fabricação da bebida.
"Nesta panela, acrescentamos o lúpulo, enquanto o mosto [mistura de água e malte] ferve. Primeiro, os de amargor e, no final, as amostras aromáticas", explica Dimer aos visitantes. "São pequenos detalhes, mas que modificam as características sensoriais da cerveja. Não é lindo isso?"
Ele fala sobre os princípios básicos da produção e também sobre os macetes que aprendeu nos mais de 30 anos de experiência em cervejarias --hoje, Dimer elabora as receitas da Dama Bier com o sommelier Paulo Feijão.
Em outras cervejarias, as visitas transcorrem de maneira semelhante, sempre guiadas por um profissional que domina cada passo da produção.
"É uma aula sobre as cervejas artesanais. Vê-se de perto o empenho dos mestre-cervejeiros em fazer um produto de qualidade", afirma o sommelier Gustavo Renha, que organiza excursões em Belo Horizonte (BH).
Outro atrativo é a oportunidade de provar versões direto do tanque, com aroma e sabor apurados, diferente do que se encontra nas amostras engarrafadas. "Provamos cervejas em diferentes estágios de maturação e percebemos como evoluem de acordo com o tempo", complementa Renha.
Confira roteiros oferecidos por agências e visitas avulsas em quatro Estados brasileiros.(DANIELLE NAGASE)
    GUIA DO TURISTA CERVEJEIRO
    PACOTES
    BEER TOUR
    Belo Horizonte
    ROTEIRO programação para um dia (sábado), com visitas a cervejarias, um restaurante e uma loja
    QUANTO R$ 180, inclui café da manhã, almoço harmonizado, visitações e traslados
    CONTATO rjlemosarq@yahoo.com.br
    EXCURSÃO CERVEJEIRA
    de Niterói a Belo Horizonte (448 km; cerca de 5h30 de viagem)
    ROTEIRO final de semana com visitas a pelo menos duas cervejarias e estabelecimentos cervejeiros (lojas, restaurantes e pub)
    QUANTO R$ 680, inclui hotel, traslados e o ingresso às cervejarias
    CONTATO gustavorenha@gmail.com
    BODEBROWN BEER TRAIN
    de Curitiba a Morretes (110 km; cerca de 3h30 de viagem)
    ROTEIRO passeio de trem entre as serras da mata atlântica; são oferecidos barris de cervejas artesanais e comidinhas
    QUANTO R$ 264, inclui trajeto de ida e volta, cervejas, comidinhas e almoço em Morretes
    CONTATO

    comercial@bodebrown.com.br


    ROTA CERVEJEIRA
    de Curitiba a Blumenau (243 km; cerca de 3 horas de viagem)
    ROTEIRO quatro dias; inclui visitas a cervejarias (até seis), restaurantes e lojas, além de brecha na programação para a Oktoberfest
    QUANTO R$ 1.100, inclui hotel, traslados e ingressos às cervejarias
    CONTATO SBTur Viagens (tel. 0/xx/41/3232-1965)
    BEER ROUTE
    São Paulo, Piracicaba e Itupeva (220 km; cerca de 3h de viagem)
    ROTEIRO um dia; inclui visitas às cervejarias Dama Bier e Rofer, almoço harmonizado e "hamburgada" na Cervejoteca na volta à SP
    QUANTO R$ 275
    CONTATO cervejastore.com.br
    VISITAS AVULSAS
    RIBEIRÃO PRETO (SP)
    CERVEJARIA COLORADO r. Minas, 394, tel. 0/xx/16/3941-4949
    VISITAS aos sábados, às 11h, com agendamento prévio
    QUANTO R$ 15, inclui degustação de quatro rótulos da marca
    CERVEJARIA INVICTA av. do Café, 1.365, tel. 0/xx/16/3878-1020
    VISITAS de segunda à sábado, com agendamento prévio
    QUANTO R$ 25, inclui degustação de chopes e almoço
    CERVEJARIA LUND r. José Roberto Vittorazzi, 325, tel. 0/xx/16/3443-7166
    VISITAS todos os dias, com agendamento prévio
    QUANTO R$ 20, inclui degustação de quatro estilos de chope
    OUTRAS ATRAÇÕES
    CHOPERIA PINGUIM r. General Osório, 389, tel. 0/xx/16/3610-8258
    POR QUE VALE A VISITA tem o chope mais famoso do país
    EMPÓRIO BIERGARTEN av. Lygia Latuf Salomão, 605, box 83, tel. 0/xx/16/3237-0722
    POR QUE VALE A VISITA empório e bar com mais de 350 rótulos de cervejas especiais
    PIRACICABA (SP)
    DAMA BIER av. Rio das Pedras, 104, tel. 0/xx/19/3411-7006
    VISITAS aos sábados, com horário pré-agendado
    QUANTO R$ 20, inclui degustação dos chopes produzidos na casa
    BELO HORIZONTE
    CERVEJARIA FALKE r. Rio Doce, 124, tel. 0/xx/31/2551-4300
    VISITAS todos os dias, com agendamento prévio
    QUANTO valor a combinar, dependendo do número de degustações
    CERVEJARIA WÄLS r. Padre Leopoldo Mertens, 1.460, tel. 0/xx/31/3443-2811
    visitas aos sábados, das 10h30 ao meio-dia
    QUANTO R$ 25, com degustação de cinco cervejas artesanais
    OUTRAS ATRAÇÕES
    LOJA MAMÃE BEBIDAS av. do Contorno, 1.955, tel. 0/xx/31/3213-9494
    por que vale a visita tem vasta carta de cervejas artesanais
    RESTAURANTE RIMA DOS SABORES r. Esmeraldas, 522, tel. 0/xx/31/3243-7120
    POR QUE VALE A VISITA tem vasta carta de cervejas artesanais e pratos com carnes exóticas
    BLUMENAU (SC)
    CERVEJARIA BIERLAND r. Gustavo Zimmermann, 5.361, tel. 0/xx/47/3337-3100
    VISITAS de ter. a sex., das 15h às 18h, com agendamento
    QUANTO gratuita, não inclui degustações
    EISENBAHN r. Bahia, 5.181, tel. 0/xx/47/3488-7371
    VISITAS de seg. a sáb., das 14h às 19h, com visitas de hora em hora
    QUANTO R$ 5, inclui degustação de um chope (400 ml)
    WUNDER BIER r. Fritz Spernau, 155, tel. 0/xx/47/3339-0001
    VISITAS de seg. a sex., até às 17h, com agendamento
    QUANTO gratuita, sem degustações

      Nina Horta

      folha de são paulo
      Acorda, Brasil!
      São ladrões como os grandes mágicos. São gênios, de uma leveza, de uma prática estonteantes
      Ah, que pena... Todo mundo me telefonando e eu vendo no Facebook os chefs, os cozinheiros, os donos de restaurante nas escadarias do Masp reunidos contra a violência, "Acorda Brasil", e me chamando para me juntar a eles. Ora, não dá mais tempo!
      Esquadrinho as fotos e enxergo o Charlô, com sua cabeleira branca, o Alex Atala, talvez o lenço de cabeça da Helena, do Maní, e mais uma multidão jovem e me orgulho deles e estou lá com eles. É hora de a gente se manifestar.
      Todo mundo tem direito à sua história de assalto em restaurante.
      Há um mês, saí do bufê numa noite fria e fui com minha filha a uma doceira de Pinheiros tomar um chocolate quente. Estava relativamente cheia e escolhemos ficar num terracinho envidraçado, vazio. Vocês sabem o tamanho da menor mesa dessas de mármore, de bar. O tamanho de um abraço.
      Eu estava com uma bolsa enorme, de couro, velha, cheia de metais, complicadíssima de abrir, minha amiga, minha velha conhecida. Coloquei sobre meus pés e até me lembro da sensação dela escorregando pela minha perna, pesada, até chegar ao chão.
      Chegou um casal e se sentou na mesa ao lado, a uns dois metros. Minha filha de frente para eles, e eu de costas. Tomamos o chocolate, e fui pegar a bolsa para pagar. E cadê?
      A primeira reação é de incredulidade, quase como se tivéssemos sendo vítimas de uma brincadeira. Porque, na nossa cabeça, é impossível que numa mesinha sem toalha, de bar, num restaurante vazio, alguém tenha se aproximado o suficiente para roubar sua bolsa, provavelmente, andando de quatro, e você não tenha percebido.
      Imediatamente, se passa de vítima a carrasco mentiroso. Como não é de se acreditar, mesmo, o segurança diz que você chegou sem bolsa, abanando as mãos. A encarregada não deixa que conversemos com o chefe, pois também desconfia que quem está dando o golpe somos nós, para não pagar o chocolate.
      Tomei as providências que achei necessárias, registrei pela internet a ocorrência policial, escrevi para o responsável que achei no Google, para o Facebook da empresa, telefonei para o banco. Por incrível, o mais amável foi o banco. "A senhora já está em casa? Está bem? Precisa de alguma coisa?"
      Como havíamos percebido uma câmera logo acima da nossa mesinha, fomos assistir ao filme, depois de muita insistência, pois lembrem-se: os bandidos éramos nós.
      No filme, o casal ladrão entra, fica parado no meio do restaurante, olha bem à volta e escolhe a mesa na mesma varanda vazia que nós. Mal se sentam, ela se abaixa, por trás de mim, quase que se deita no chão e pesca minha bolsa, que estava a meus pés. Passa para dentro do casacão dele que, imediatamente, enfia na mochila, levantam-se e saem. Um minuto de ação.
      Parecerá normal para vocês. Mas, para mim, que estava com a bolsa no pé e que não senti ninguém nas minhas costas, e para minha filha, que não tinha outro lugar para olhar senão à sua frente e não viu, são ladrões como os grandes mágicos, como David Copperfield. São gênios, de uma leveza, de uma prática estonteantes. Foi um assalto "soft", mas "Acorda, Brasil!", antes que nos roubem até o grito de revolta.
      ninahorta@uol.com.br
      Leia o blog da colunista
      ninahorta.blogfolha.uol.com.br

        Jeitos diferentes de jogar - Tostão

        folha de são paulo
        TOSTÃO NA COPA
        Jeitos diferentes de jogar
        Uma jovem, participante dos protestos, disse que trocaria a vitória, no primeiro jogo, pelo sistema educacional do Japão. Eu também.
        Enquanto o Japão está no 12º lugar no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), o Brasil ocupa a 84ª posição. O México, rival de hoje, tido como um país muito parecido com o nosso, está na 57ª.
        O México costuma jogar bem contra o time brasileiro. Nos dez últimos jogos, foram cinco vitórias do México, três derrotas e dois empates. Segundo o chavão futebolístico, o jogo do México encaixaria bem com o do Brasil.
        Não enxergo motivo técnico para isso. Deve ser algo psicológico. Os jogadores são facilmente influenciáveis por atos de repetição. Hoje, o Brasil está melhor.
        O México deve atuar com duas linhas de quatro, recuadas. Será importante a marcação por pressão, para tomar a bola, quando a defesa estiver desprotegida. A seleção brasileira tem feito bem isso. Tenho muito mais receio dos times que pressionam o Brasil no meio-campo.
        Continuo o assunto sobre as dificuldades da passagem da bola, sem chutões, da defesa para o ataque, do time brasileiro. Critico isso há muito tempo. Sei que não dá para jogar como a Espanha.
        Não temos craques no meio-campo, nem é mais, há muito tempo, nossa característica. O estilo brasileiro é de lançamentos longos e de jogadas individuais e de velocidade.
        Com Dunga, também era assim. Felipão já disse que não gosta de ver o Barcelona jogar. Muitos pensam da mesma forma.
        É preciso separar os lançamentos longos dos zagueiros, para tentar colocar a bola nas costas dos defensores, como David Luiz e Thiago Silva tentam fazer, o que pode dar certo, dos lançamentos ou chutões, para se livrar da bola e contar com a sorte. Às vezes, também funciona.
        Luiz Gustavo e Paulinho jogam muito separados, e os dois ficam longe dos três meias. Deveriam se aproximar mais, para trocar passes. Além disso, como Oscar joga mais pelos lados, falta um meia de ligação.
        Prefiro, em tese, dependendo da qualidade e das características dos jogadores, atuar com três no meio-campo (dois que marcam e avançam como meias) a ter dois volantes só para marcar e um meia só para criar.
        Com três no meio-campo, melhora a saída de bola da defesa, e o time ataca e defende com mais jogadores. Espanha e Itália jogam com três no meio-campo.
        Cada equipe tem de encontrar seu jeito de atuar. Mais importante que o tipo de estratégia é a execução bem feita do que foi ensaiado e planejado.

          Um protesto, mil razões

          Zero Hora - 19/06/2013

          As reivindicações dos manifestantes que tomaram as ruas da Capital não se resumem a uma ou duas. São muitas e podem ser percebidas em palavras de ordem e cartazes. É o que conta o repórter de Zero Hora que acompanhou de perto a passeata de segunda-feira.

          Sentados no calçamento do Paço Municipal, às 17h de segunda-feira, os primeiros a chegar para a manifestação estendem no piso as folhas de cartolina e hesitam, pensativos. É o momento de explicitar, com tinta ou pincel atômico, por que estão ali e o que querem.

          Aos poucos, as palavras vão ganhando contornos no papel, e cada novo cartaz erguido alarga a pauta de reivindicações e revela os motivos para o descontentamento. A tarifa de ônibus é só um, entre tantos: “Não são só R$ 0,20”, esclarece, em uma simples folha de ofício, um ativista de flor na boca. Os manifestantes são quase todos muito jovens.

          Quando o país tomou as ruas pela última vez, para derrubar Fernando Collor, não eram nascidos ou ainda ensaiavam os primeiros passos. Mas alguns pegam emprestadas as palavras popularizadas em outra era, quando o país sofria sob a ditadura militar. Che Guevara (“Hasta la victoria siempre”), Chico Buarque (“Afasta de mim esse cálice”) e Geraldo Vandré (“Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”) se transformam de novo em porta-vozes de uma geração.

          Em muitos outros cartazes, a insatisfação expressa à tinta é a de quem não se sente representado, seja por governos, tribunais, partidos, sindicatos ou meios de comunicação. O conteúdo dessas folhas de cartolina e papelão erguidas para o alto – e usado para intercalar os textos deste relato sobre o que foi visto e ouvido no protesto em Porto Alegre – oferece esse testemunho.

          SAÚDE (X), EDUCAÇÃO (X), TRANSPORTE (X)

          Às 17h15min, um ciclista de barba e cabelos compridos aparece, bandeira do Brasil atada ao pescoço.

          – Todos deveriam usar a bandeira, para o mundo ver. Tem uns que são anarquistas, que não a respeitam – critica.

          Perto dele, desfila de um lado a outro um rapaz vestido de preto dos pés à cabeça, com capacete e máscara sobre o rosto. Um dos 14 guardas municipais que fazem a segurança da prefeitura saca o celular e passa a captar imagens do manifestante. Ele responde na mesma moeda: desembolsa uma câmera e filma o agente.

          É aplaudido.

          SENHOR GOVERNADOR, CADÊ O RESPEITO?

          O rapaz usando máscara e capacete se aproxima de um pequeno grupo com aparência hippie.

          – Ô, cara, tu estás muito armado – comenta uma adolescente com a cara pintada de verde e amarelo.

          – Pensa que está em São Paulo? – questiona outra.

          Quando ele remove a máscara, revela-se o rosto nada assustador de um jovem de bochechas coradas e barba clara bem aparada.

          BRIGADIANO TAMBÉMÉ EXPLORADO

          O Paço Municipal começa a encher de manifestantes quando uma garota comenta com um rapaz:

          – As pessoas roubam, matam, e não aparece polícia. A polícia só vem contra os manifestantes.

          – Tem de entender que a polícia é um instrumento de repressão do povo. Mas agora não tem jeito, porque a internet bombou de uma forma... O problema é que na quinta-feira dispersou demais.

          – Essa dispersão é que não pode acontecer hoje – defende a garota.

          – Eu faço Ciências Sociais. Tive de dizer: “Professora, lamento, mas hoje não vai dar. Está acontecendo uma coisa que talvez não vá acontecer nunca mais”.

          O universitário se interrompe para conferir o celular e fazer um anúncio de forma entusiasmada:

          – Meu Deus! Um amigo está vindo com mais 10 pessoas!

          FAÇA AQUI OSEU CARTAZ. GRÁTIS

          – São Paulo inteira na rua, não é, velho? – comemora um jovem, encontrando o amigo.

          Então, exibe os dizeres em seus cartaz:

          – O que tu achas?

          – Massa! – avalia o outro.

          Do lado, já espremida pela multidão, uma manifestante desabafa ao namorado:

          – Se eu tivesse cartolina, também escrevia. Acho muito legal o que está acontecendo. Os jovens estavam muito acomodados. Agora, não. Espero que todo mundo que veio aqui esteja pensando em um futuro melhor. Porque tem gente que aparece só para se promover.

          O diálogo termina em beijo.

          NENHUM PARTIDO ME REPRESENTA

          Pouco antes das 18h, horário marcado para o protesto, chegam dois agrupamentos partidários, com suas bandeiras, tentando se inserir no movimento: integrantes do PSTU e do PSOL. Durante toda a noite, terão de suportar o mesmo slogan, entoado pelas milhares de vozes que os cercam:

          – Sem partido! Sem partido! Sem partido!

          CONSTITUIÇÃO FEDERAL FIFA

          Ao lado da Fonte Talavera, uma roda reúne três rapazes e uma garota.

          – Não sou contra Copa. Não sou contra nada. Mas do jeito que fizeram... – diz um dos jovens.

          – ... é, esse monte de estádios – completa um amigo.

          – O problema aqui é que tem muito protesto junto, muita coisa.

          – Mas é válido. É um momento histórico. Tem de participar.

          – Pois é. Mas a mídia não divulga nada.

          – Divulga, sim – contesta a garota.

          – Mas o histórico é esse acompanhamento vivo, não-tendencioso, feito pela internet – devolve um manifestante.

          – É, a internet – concordam todos.

          NÃO FALTAM MOTIVOS PARA PROTESTAR

          Pouco depois das 18h, os manifestantes começam a gritar suas palavras de ordem, de frente para o prédio da prefeitura. O coro vem alternadamente de diferentes lados da praça e manifesta os variados pontos de vista ali reunidos:

          – Um, dois, três, quatro, cinco mil! Abaixa a passagem ou paramos o Brasil!

          – Da Copa eu abro mão! Queremos é dinheiro para saúde e educação!

          – Prefeito, elite, o povo te demite!

          – O povo, unido, governa sem partido!

          QUANDO SEU FILHOFICAR DOENTE...

          Por entre os grupos, um rapaz circula, propagandeando com panfletos uma das múltiplas causas da noite. Seu folheto divulga uma caminhada em defesa da queda do presidente da CBF, José Maria Marin, de um novo modelo de campeonato gaúcho e de ingressos mais baratos no Gauchão.

          – O presidente da CBF é o cara que está fazendo a Copa. É uma roubalheira. Por isso, estamos convidando para um movimento contra ele – explica, para um trio de garotas adolescentes.

          – Minha mãe nem queria que eu estivesse aqui – desculpa-se uma das meninas.

          – Bom, estou divulgando para vocês.

          – Parabéns – elogia a garota.

          Vendo que o diálogo é observado e registrado, o manifestante faz um apelo:

          – Só peço que você fale bem da manifestação no jornal. Tem uns caras que exageram, mas a maioria é da paz.

          DILMA, PARA QUE TANTO IMPOSTO?

          Uma jovem chega, abraça o amigo, e avisa:

          – Não vou poder ficar muito. Só vim dar uma passadinha.

          O clima geral é de orgulho. Há um sentimento de entusiasmo, de estar em massa na rua para exigir alguma coisa. Muitos pedem para ser fotografados pelos amigos na condição de manifestantes. O rapaz diz à amiga:

          – Estava olhando a internet e tinha 240 mil confirmações de presença. E a Dilma não se pronuncia.

          – Se ela não se pronunciar, a situação só vai piorar.

          – Legal é que aconteceu bem na Copa das Confederações.

          – Demais, não é? Dá visibilidade.

          NÃO À PEC 37

          Às 19h, a massa começa a se mover Borges de Medeiros acima. Uma mulher arrisca sua interpretação:

          – Sarney, mensalão. Acho que foi tudo se acumulando.

          – É. E esse monte de estádios. Tem de ir para a rua – diz uma amiga.

          Ao longa da Borges e da Salgado Filho, a multidão recebe o apoio de quem está nos prédios. Quando atingem um ponto mais alto da Borges ou mais baixo da Salgado Filho e conseguem ver a massa a espraiar-se por centenas de metros, os participantes se emocionam, se abraçam, parecem a ponto de chorar.

          – Meus Deus! Tem muita gente.

          DE UM LADO ESTE CARNAVAL, DO OUTRO...

          Um novo tipo de manifestante começa a ganhar protagonismo quando a marcha ingressa na Avenida João Pessoa. Eles escondem o rosto debaixo de máscara e panos, empunham pedras e pedaços de paus e tomam a dianteira da caminhada. Picham, quebram, incendeiam e explodem, para revolta dos que vêm logo atrás e tentam impedi-los.

          As depredações culminam no cruzamento das avenidas Azenha e Ipiranga, onde o punhado de arruaceiros depreda uma revenda de motos, dando origem a uma violenta reação da Brigada Militar, que transformou Porto Alegre em campo de batalha.

          – Vandalismo é anti-imperialismo – bradam.

          É um momento de desilusão para muitos dos que foram às ruas:

          – Aqui o protesto perdeu a razão – diz uma garota.

          – Vocês estragaram tudo, seus ignorantes.

          As duas têm lágrimas nos olhos.

          ITAMAR MELO

          As derrapadas dos cartolas

          Correio Braziliense - 19/06/2013


          Pela primeira vez na história, um torneio da Fifa tornou-se palco de manifestações populares de um país. A Copa das Confederações e a do Mundo não foram o estopim dos protestos Brasil afora, mas certamente colaboraram para a revolta. E, mais importante, os torneios serviram de vitrine para os protestos. Os responsáveis pela competição, enquanto isso, tentam dissociar a imagem das competições das demandas da população.

          A estratégia começou a ser utilizada pelo presidente da Fifa, Joseph Blatter. "Eu posso entender que as pessoas não estão felizes. Mas acho que eles não deveriam usar o futebol para anunciar as reivindicações", reclamou. "O Brasil pediu essa Copa do Mundo. Nós não a impusemos ao Brasil. Eles sabiam que para ter uma boa Copa do Mundo naturalmente teriam que construir estádios. Mas nós dizemos que não é apenas para o Mundial. Junto com os estádios há outras construções: rodovias, hotéis, aeroportos... São itens do legado para o futuro."

          O presidente da Federação Pernambucana de Futebol, Evandro Carvalho faz coro a Blatter. O estado é uma das seis sedes da Copa das Confederações e tem manifestação marcada para amanhã Na visão do cartola, porém, os protestos não chegarão à cidade. "Não têm nada a ver com futebol, com a Copa", argumenta. "O período foi de uma infelicidade estratégica enorme. São Paulo não poderia ter escolhido uma época pior, com essa proximidade do torneio", avalia Carvalho.

          Colega dele, Paulo Schettino, presidente da Federação Mineira de Futebol, concorda: as manifestações estão longe do esporte. O dirigente afirmou só ter visto os movimentos em Belo Horizonte pela televisão, apesar de ter assistido a Taiti x Nigéria no estádio. "Vou torcer para que nada mais aconteça", resume o dirigente, que tem uma opinião bem clara dos ativistas: "As pessoas que estão fazendo isso só querem visibilidade. E a visibilidade, nessa hora, é enorme".

          CBF volta atrás

          Depois de ter pedido para que os atletas da Seleção Brasileira ignorassem os protestos, sob a alegação de manter a concentração na Copa das Confederações, a CBF mudou de ideia. A entidade orienta o apoio aos ativistas, com o objetivo de evitar que a equipe seja vista como contrária às manifestações (leia mais na página 3). Na coletiva de imprensa de ontem, no Estádio Castelão, o técnico Luiz Felipe Scolari optou de novo pelo discurso nacionalista: "A Seleção é do povo, nós somos do povo". Não foi além disso, no entanto. Em seguida, voltou a se esquivar, ao dizer que o trabalho dele é fazer o time crescer para representar o país: "Não temos interferência nas outras áreas".

          Principal crítico no Congresso Nacional da organização da Copa do Mundo, o deputado federal Romário (PSB-RJ) decidiu diminuir as aparições públicas neste mês. Com receio da presença de manifestantes, o Baixinho cancelou, inclusive, uma sabatina que seria feita ontem, na Universidade de Brasília (UnB), por um jornal paulista. Apesar disso, o ex-atacante avaliou ao Correio os movimentos como "importantíssimos a qualquer tempo".

          Romário pediu protestos sem violência e vandalismo e fez uma ressalva à demora para a mobilização popular. "Talvez o timing tenha sido um pouco tardio, mas ainda assim é muito válido. Eles estão roubando a visibilidade que seria dos jogos com o objetivo de chamar a atenção do governo para uma insatisfação generalizada", acredita.

          Ex-parceiro de Romário na Seleção Brasileira, o empresário Ronaldo, membro do Comitê Organizador Local (COL), prefere não se posicionar. Uma assessora de imprensa afirmou que o ex-atleta "não tem nada para comunicar" sobre o assunto.


          As cores da bandeira

          A uma semana da abertura da Copa das Confederações, o movimento "Copa para quem?" já tinha formulado uma agenda de ações para protestar nas 12 cidades sedes do Mundial de 2014. Quando marcou a data de 14 de junho, véspera do jogo de estreia, para o início dos protestos, o grupo ainda não sabia que, dias antes do combinado, uma série de manifestações em São Paulo somaria outras pautas e mobilizações pelo país.

          Articulados desde 2010, os representantes dos Comitês Populares da Copa têm apresentado denúncias de violações de direitos humanos durante a preparação para os megaeventos esportivos dos próximos anos. A ideia do movimento surgiu no início deste ano e foi consolidada em abril. Reunida, a Ancop, Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa, decidiu que os protestos — contra os gastos para o Mundial e a falta de transparência e participação popular na organização do evento — seriam oportunamente realizados na véspera, durante e no dia seguinte à abertura da Copa das Confederações.

          Quatro dias antes da estreia, os representantes foram surpreendidos pela manifestação em São Paulo. Diante da violência usada pela polícia, protestos de apoio e novas reivindicações se espalharam pelas cidades brasileiras. Desde então, o "Copa para quem?" se uniu a outros atos, como o que será realizado hoje, em Fortaleza. "O protesto de amanhã (hoje), próximo ao estádio, não estava na nossa agenda. Surgiu no Facebook por iniciativa de estudantes e nós aderimos", pontua André Lima Sousa, professor da Universidade Federal do Ceará e articulador do Comitê de Fortaleza, em entrevista ao Correio.
          A dissolução dos protestos em várias frentes e com diferentes reclamações não incomoda o "Copa para quem?". "Estamos nos reunindo para que a nossa pauta, que é contra os abusos ocorridos na Copa, também fique clara", explica Patrícia Abdalla, especialista em gestão de Políticas Públicas e Organizações Sociais,  membro do Comitê Popular de São Paulo.

          Quem são Os Comitês Populares surgiram em momentos diferentes em cada uma das sedes. A medida que percebiam interferências nas cidades, diferentes setores da sociedade se uniram para acompanhar. Em cada comitê, há grupos distintos, mas prevalece a presença de movimentos sociais e ONGs com foco nos direitos humanos, assessores jurídicos, estudantes e representantes de universidades públicas. Em Brasília, por exemplo, fazem parte a Organização de Comunicação Universitária Popular (Ocup), Associação Jurídica Universitária Popular (Ajup) e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).


          Atletas na linha de frente

          Nas últimas décadas, grandes eventos esportivos e atletas de renome serviram como atenuadores de conflitos políticos e sociais. Nem sempre, porém, como agentes da paz. Em 1978, a ditadura argentina usou a Copa do Mundo como primeiro grande símbolo de aprovação nacional. O país vivia bom momento econômico, e a conquista do Mundial pela Seleção em seu prório território fez com que movimentos oposicionistas perdessem força. Àquela altura, porém, o país contava com mais de 20 mil desaparecidos políticos. O esporte também funcionou para acalmar os ânimos em 1969, quando o Santos de Pelé fez uma excursão na África. A chegada do Peixe à Nigéria interrompeu momentaneamente a Guerra de Biafra, que já durava dois anos. O governo local declarou feriado, e o país viveu um dia de paz para ver o Rei do Futebol atuar. O Santos venceu a Seleção do Meio Oeste por 2 x 1. Em 1990, a participação do boxeador Muhammad Ali foi importante para negociar a libertação de 15 reféns americanos no Kuwait. Eles foram sequestrados a mando do ditador Saddam Hussein para impedir ataques dos Estados Unidos ao Iraque. 

          Anos mais tarde, descobriu-se que Ali viajou ao Iraque, falou pessoalmente com Saddam e foi peça essencial para um acordo entre os dois governos. Mais recentemente, foi a vez de a Seleção Brasileira entrar em campo pela paz. Em 2004, a equipe canarinha foi ao Haiti a convite da Organização das Nações Unidas (ONU) para ajudar em um missão criada para restaurar a ordem no país, que acabava de passar por conflitos políticos e sociais que culminaram na deposição do presidente, Jean-Bertrand Aristide. O jogo foi realizado em 19 de agosto e mobilizou milhares de haitianos, que acompanharam a goleada do Brasil sobre a Seleção local: 6 x 0.

          Afinal, há risco para a Copa?

          Enquanto a população vai às ruas do país em plena Copa das Confederações, dirigentes do futebol nacional e internacional buscam separar o torneio dos protestos. Ao longo da história, países que passaram por manifestações — de maior ou menor gravidade — quase sempre viveram situações, no mínimo, delicadas, apesar do esporte. Em 1982, a Colômbia anunciou que abdicaria de realizar a Copa de 1986; em 2008, oito etapas do Rali Dacar foram canceladas; em 2011, a F-1 ficou sem o GP do Barein... Especialistas ouvidos pelo Correio contam quais as reais possibilidades de o Mundial do ano que vem não ser realizado.
          Na política, uma Seleção desentrosada: enquanto jogadores apoiam as marchas, Felipão se esquiva.

          Brasil e México duelam hoje, e mais de 30 mil devem protestar em frente ao Castelão na hora do jogo.
          Conversamos com líderes do movimento Copa para quem?. Saiba quais os planos para a final, no Rio.


          Os movimentos, a política social e o direito de sonhar - José Maurício Domingues


          O Globo - 19/06/2013

          Há muito ainda a compreender nas belas manifestações que tomaram o país. Mas algumas coisas parecem claras. Elas refletem uma insatisfação mundial, que afeta em particular os jovens, com a forma fechada com que funcionam os sistemas políticos.

          As pessoas recusam que a política seja coisa das máquinas que a sequestraram; as redes sociais têm cumprido papel fundamental em sua organização, e as manifestações são influenciadas pelas que acontecem em outros lugares. Mas o contexto é importante.

          Entre nós, depois de anos de mudanças sociais significativas, tudo indica que as pessoas querem mais e que estão faltando criatividade e iniciativa, em particular ao PT, que foi o oxigênio principal da política nas últimas décadas.

          Há de tudo nas manifestações, mas dois aspectos se destacam. Vemos a insatisfação e um desejo difuso de mudança se espraiarem. A agenda do combate à pobreza e das políticas setoriais parece haver atingido seus limites de inclusão social. Assim afirma-se a ocupação massiva do espaço público, reivindicando-o contra a privatização da vida e pelo direito a sonhar.

          Por outro lado, desponta a pauta dos direitos sociais - o que é especialmente visível em São Paulo em face do terrível transporte público e da opção pelo individualismo automotivo que se mantém há décadas no país.
          O que ocorrerá daqui por diante está em aberto. Talvez o saldo a médio prazo desses protestos seja a regeneração do associativismo, que declinou nas últimas décadas, agora sob formas mais horizontais e inovadoras, provavelmente mais autônomas em relação aos partidos.

          Uma pauta mais universalista e igualitária de direitos sociais tende a se afirmar. A curto prazo há pouco a esperar do sistema político, afora respostas pontuais, mas sua abertura à dinâmica social, a limitação dos interesses do capital nas políticas públicas e a busca de novas formas institucionais de participação são decisivas para oxigená-lo e impedir sua desdemocratização tecnocrática e gerencial.

          A gente não quer só eletrodomésticos - Luiz Carlos Delorme Prado


          O Globo - 19/06/2013

          Os indicadores econômicos mostram que há uma grande melhoria na renda e no consumo das populações mais pobres do país. No entanto, uma parte dessa população - a mais beneficiada delas, os mais jovens, mais educados, que tiveram substanciais melhorias no acesso a bens de consumo, inclusive eletrodomésticos e produtos eletrônicos - parece estar profundamente insatisfeita.

          Esses jovens, muitos deles estudantes universitários, que foram chamados de nova classe média, são o núcleo das recentes manifestações nas principais cidades brasileiras. As demandas são muitas, nem sempre consistentes. Algumas razoáveis, outras absurdas. O comportamento dos manifestantes nas ruas é igualmente variável: alguns demonstram com palavras de ordem sofisticadas, e outros, com expressões banais. Alguns querem demonstrações pacíficas, outros as querem iradas e destrutivas. Não há ordem nem liderança nesse processo - as poucas bandeiras vermelhas dos tradicionais grupos radicais parecem isoladas e perdidas em uma multidão desorganizada com muitas demandas, nem sempre claras, e muita indignação.
          Uma explicação para esse fenômeno pode ser buscada no conceito proposto pelo economista do desenvolvimento Albert Hirschman, falecido no ano passado, chamado "efeito túnel".

          Imagine, diz ele, que estejamos em um engarrafamento parado em duas pistas. De início, há uma sensação de desesperança e resignação, já que ninguém se move. Mas imagine que uma das pistas comece a andar, e uma delas não se movimente. O resultado é frustração e, no limite, a tentativa de mudar de fila a qualquer custo, e exigir de forma barulhenta o movimento da fila em direção ao fim do túnel.

          Ou seja, no Brasil, estagnado, desde a década de 1980, havia uma certa resignação com a má qualidade da vida, que incluía pouco acesso aos bens de consumo e ao serviço público. No entanto, nos últimos dez anos, houve uma grande melhoria na qualidade de vida de uma parcela da população tradicionalmente excluída. A fila andou. Ampliou-se o acesso a eletrodomésticos e outros bens e serviços. A educação ampliou-se, o desejo de acesso a lazer ampliou-se. A vida melhorou.

          Crescimento de algas alimenta edifício

          folha de são paulo
          DO "NEW YORK TIMES"

          The New York TimesUm novo prédio em Hamburgo, na Alemanha, parece com uma estrutura moderna e tem uma das mais recentes tecnologias de construção sustentável -uma fazenda de algas vertical.
          Os criadores do edifício Bio Intelligent Quotient (BIQ), que custou US$ 6,58 milhões e usa exclusivamente energias renováveis, prometem que esse pioneiro sistema energético irá colher algas de rápido crescimento para gerar biocombustíveis, produzir calefação, fazer sombra no prédio, atenuar o ruído da rua e entrar para a história.
          Sobre as laterais do edifício, estão montados 129 biorreatores, painéis de vidro plano sobre persianas externas que servem como ambiente para o crescimento das algas. O sistema foi construído por um consórcio que incluiu a empresa de arquitetura Colt Group.
          Em 2009, o consórcio venceu uma competição que pedia aos participantes para usar materiais inteligentes, definidos como "sistemas e produtos que se comportam dinamicamente, ao contrário dos materiais convencionais de construção, que são estáticos".
          As algas são alimentadas com nutrientes líquidos e com dióxido de carbono para estimular o crescimento no sistema, que se tornou operacional em abril. Ar pressurizado é injetado nos painéis para estimular ainda mais o crescimento e impedir que micro-organismos se instalem e provoquem apodrecimento, disse Jan Wurm, um dos projetistas.
          Ele observa que escovas nos painéis mantêm os vidros limpos automaticamente. Os painéis funcionam também como coletores térmicos solares, transformando a luz do sol em energia utilizável.
          Segundo Wurm, "a parte da luz que não é absorvida pelas algas para a fotossíntese é convertida em calor", o qual pode ser usado imediatamente para aquecer a água ou armazenado no subsolo.
          Periodicamente, as algas serão colhidas e armazenadas em tanques no edifício. Uma empresa local de energia irá então comprar a colheita e transportar a biomassa até uma usina de calefação e energia nos arredores, onde ela passará por uma fermentação. O processo produz gás metano para a geração de eletricidade. "A energia gerada seria neutra de carbono", disse Wurm.
          Os projetistas da casa BIQ não sacrificaram a forma por causa da função. A cor das algas, combinada com o balé de bolhas da ascensão do ar pressurizado, lembra uma lâmpada de lava, segundo Wurm.
          The New York Times
          Edifício Bio Intelligent Quotient, em Hamburgo, na Alemanha
          Edifício Bio Intelligent Quotient, em Hamburgo, na Alemanha
          Ainda está sendo debatido se o prédio com biorreatores de algas é o começo de algo grande ou apenas uma experiência isolada.
          Wurm admite que a nascente tecnologia custa mais do que os sistemas solares ou combustíveis convencionais. "Em termos de custos de investimentos, não se pode compará-lo a sistemas estabelecidos e produzidos em massa que estão no mercado", afirmou.
          Jonathan Wimpenny, do Real Instituto de Arquitetos Britânicos nos EUA, questiona se muitos bancos e incorporadores imobiliários irão investir em biorreatores de algas. "Dificilmente poderei considerar isso como um divisor de águas na prática construtiva cotidiana", disse Wimpenny.
          Mas para David Bayless, da Universidade de Ohio, o prédio de Hamburgo é importante. "As pessoas ficam cautelosas com as algas porque é uma tecnologia relativamente desconhecida."
          O preço é um obstáculo em potencial. Scott Walzak, projetista do escritório global de arquitetura HOK, estima que o custo do quilowatt-hora produzido por biorreatores de algas seria equivalente a sete vezes o preço da energia solar e 14 vezes o do petróleo bruto.
          Anica Landreneau, líder de consultoria na HOK, concebeu um sistema para aproveitar os gases de escapamento dos carros na autoestrada Santa Ana, na Califórnia, como fonte de carbono para alimentar as algas. "Elas prosperam com uma dieta de porcarias", disse Landreneau.
          A Grow Energy, start-up de San Diego, na Califórnia, está apostando exatamente nisso para produtos que trilham caminhos diferentes a fim de gerar energia a partir de algas. A empresa, criada há um ano, planeja produzir dois diferentes biorreatores de algas.
          No ano que vem, a Grow Energy pretende aceitar pré-encomendas do seu sistema Verde, que cultiva as algas, as seca automaticamente e as queima num gerador de combustão no próprio telhado para produzir eletricidade. O sistema Verde custará cerca de US$ 12 mil e produzirá em torno de 35% da eletricidade usada por um lar americano médio.
          O arquiteto Tom Wiscombe está animado com o prédio de Hamburgo. "Na história da arquitetura, tentar manter organismos, fungos e bolor constantemente fora de um prédio sempre foi crucial", disse ele. "Agora, estamos tentando trazer tudo isso de volta."

          Senado aprova projeto de lei do Ato Médico

          folha de são paulo
          Texto regulamenta práticas exclusivas dos médicos, como indicação de cirurgias e prescrição de tratamentos
          Para conselho de enfermagem, projeto tem como intenção criar "reserva de mercado"
          JOHANNA NUBLATGABRIELA GUERREIRODE BRASÍLIAO plenário do Senado aprovou, na noite de ontem, o polêmico projeto de lei apelidado de Ato Médico.
          Após pouco mais de dez anos de discussão, a proposta segue para sanção da presidente Dilma Rousseff.
          Ao regulamentar a profissão do médico, o texto colocou em lados opostos o CFM (Conselho Federal de Medicina), que apoia a proposta, e os conselhos de outras profissões da saúde, que veem no projeto uma restrição à sua prática diária.
          Ficam definidos como atos privativos do médico, por exemplo, o diagnóstico da doença e a respectiva prescrição terapêutica e a indicação e realização de cirurgias e procedimentos invasivos.
          Esses procedimentos, segundo o texto, são a invasão da derme e epiderme com uso de produtos químicos ou abrasivos; invasão da pele que atinja o tecido subcutâneo para injeção, sucção, punção, drenagem ou instilação; ou ainda invasão dos orifícios naturais do corpo, atingindo órgãos internos.
          Profissionais de outras áreas da saúde temem que, com essas definições, possam ficar restritas ao médico ações como a acupuntura, a realização do parto normal e a identificação de sintomas de doenças corriqueiras.
          Por outro lado, o projeto especifica que não são privativos do médico os diagnósticos funcional, psicológico, nutricional e avaliações comportamentais.
          O único ponto ainda em aberto é a decisão sobre realização e a emissão de laudo dos exames citopatológicos (como papanicolaou). Segundo a senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO), uma das líderes do debate, o texto aprovado diz que essas ações não são privativas dos médicos. No entanto, a mesa do Senado entendeu que, de acordo com a votação, ficou decidida a exclusividade do médico na realização desses testes.
          As medidas valem 60 dias após a lei entrar em vigor.
          Para a senadora Lúcia Vânia, o projeto não relega outras profissões da saúde a uma categoria de inferioridade em relação ao médico.
          "É evidente que esse projeto não se superpõe à legislação de quaisquer profissões da saúde regulamentadas."
          O CFM sustenta que a intenção não é limitar as demais profissões, mas afirmar a necessidade da presença do médico em todos os locais.
          O conselho argumentou, durante a tramitação, que não pode haver uma divisão econômica e social, em que parte da população tem seus procedimentos feitos por um médico, e outra parte, não.
          Uma consequência desse projeto, segundo a entidade, é que todas as equipes de saúde da família deverão ter médicos --o que ocorre hoje em cerca de 50% dos casos, de acordo com o CFM.
          Para o Conselho Federal de Enfermagem, o texto "mantém a formulação de uma organização hierárquica entre os que pensam e os que executam, a clara intenção de reserva de mercado e de garantia de espaço de poder sobre a atuação dos outros profissionais de saúde (...) reservando para a enfermagem a condição de subsidiária em atividades manuais sob prescrição e supervisão médica".

            Mudanças em Cuba - Julia Sweig

            folha de são paulo
            Mudanças em Cuba
            O surgimento de partidos políticos e uma mulher na Presidência já não estão na categoria do inconcebível
            Em 2010, participei de uma conversa com Fidel Castro, na qual, em resposta a uma pergunta sobre se Cuba ainda estava "exportando" seu "modelo" para a América Latina, ele inadvertidamente provocou uma tempestade na mídia internacional ao responder: "O modelo cubano não funciona mais nem para nós." Era o óbvio para a maioria dos cubanos e uma afirmação de que mudanças reais estavam em curso.
            Seguem algumas impressões ainda não digeridas, extraídas de conversas com dezenas de cubanos, do governo e de fora dele, sobre como eles enxergam essas mudanças.
            1-) A morte de Hugo Chávez e a incerteza na Venezuela reforçam uma lógica e uma cronologia preexistentes para Cuba aprofundar laços comerciais, diplomáticos e de investimentos com vários parceiros. O Brasil é um exemplo rematado. Somam-se a essa estratégia o restante da América Latina, China, Rússia, Angola, União Europeia e, eventualmente, os próprios EUA.
            2-) As remessas de dinheiro e ajuda material de cubanos no exterior exercem papel crescente na microeconomia da ilha e ajudam a lançar pequenas empresas familiares.
            Mas os cubanos que buscam prosperar no setor privado ainda aguardam pela ampliação do acesso ao crédito bancário, pela abertura de mercados atacadistas e pela estabilização das taxas de juros. Isso pode soar muito moderado, mas sugere que estão em curso transformações sociais importantes.
            3-) O grande passo macroeconômico, a eliminação da moeda dupla, será doloroso e necessário. O Estado não tem condições de subsidiar tudo para todos e já não o faz mais. Mas reduzir os subsídios e desvalorizar a moeda ao mesmo tempo seria mais terapia de choque que a sociedade pode suportar.
            4-) A era digital está chegando, enfim. A abertura de cibercafés, neste mês, é a medida principal de uma decisão política de aumentar o acesso à infraestrutura digital. Os cubanos já são loucos pela mídia social --e não me refiro apenas à blogueira Yoani Sánchez, ídolo no Brasil. Fique de olho nesse espaço --é provável que cresça.
            5-) Ainda não está claro como a imprensa oficial cubana vai se adaptar. No próximo mês, um congresso de jornalistas vai debater o futuro de seu sindicato. Esperamos que surja mais espaço para os valores de transparência e responsabilidade promovidos pelo governo de Raúl Castro em outras áreas. Mas, para ter uma ideia dos debates reais em Cuba, vá para www.espaciolaical.org ou www.temas.cult.cu.
            6-) Por falar em transparência, está em curso uma iniciativa grande para penalizar a corrupção. Empresas estrangeiras estão de sobreaviso: terão que obedecer às regras. Em pouco tempo, a corrupção da qual depende o mercado negro passará a ser examinada legalmente. Os cubanos parecem compreender que o respeito às leis é essencial para uma economia de mercado.
            7-) Partidos políticos? Ainda não, mas já não são inconcebíveis.
            8-) Também na categoria de algo que já não é inconcebível: uma mulher na Presidência.
            @JuliaSweig