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Inauguração da estátua de Tiradentes, em Ouro Preto, em 1894 |
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Registro do caminho da Estação, de 1882, que integra a mostra |
No
Brasil do século 19, os fotógrafos eram ambulantes que viajavam pelas
cidades levando em lombos de burro e veículos puxados a cavalo todo o
material necessário para sua atividade. Transportavam não só câmeras,
mas também produtos químicos indispensáveis para fazer os negativos
(então vidros emulsionados na hora de se fazer a foto), revelar e copiar
as imagens.
Eram franceses, alemães, italianos, dinamarqueses,
portugueses e, com o tempo, brasileiros que aprenderam o ofício com
estrangeiros ou lendo manuais sobre o assunto. Eles viajavam pelo país,
estabeleciam-se nas localidades maiores e buscavam trabalho nos
arredores. Alguns publicavam anúncios, em que informavam aos moradores
de uma cidade a data de sua chegada e da partida.
O primeiro
anúncio de um ateliê de fotografia em Minas Gerais foi publicado em 1845
na revista Recreador mineiro, da antiga Vila Rica. “Ouro Preto, por ser
a capital da província e, a partir de 1889, do estado de Minas Gerais,
tinha uma elite política, intelectual, de funcionários da administração
pública, que podia pagar os fotógrafos. Isso permite que eles
estabeleçam ateliês na cidade”, explica o historiador Rogério Arruda,
autor do livro O ofício da fotografia no século 19.
A
fotografia, segundo diz Arruda, embora fosse menos dispendiosa do que a
pintura, também era cara. Para garantir seu sustento, o fotógrafo
precisava se dedicar também a outras atividades. José Faustino de
Magalhães, por exemplo, era fotógrafo, dentista e ourives.
Os
primórdios da fotografia no Brasil mostrados por meio de imagens feitas
em Minas Gerais estão na exposição A fotografia em Ouro Preto no século
19, que tem curadoria de Arruda e do também historiador Rodrigo Vivas. A
mostra será aberta amanhã, às 20h30, na Sala Manoel da Costa Athaíde,
anexo do Museu da Inconfidência.
Estão reunidas na exposição 20
fotografias (retratos e vistas urbanas ou rurais) realizadas entre 1845 e
1900, produtos de pesquisa de Rogério Arruda e de Margarete Monteiro.
“Não são fotos clássicas. Mostramos a atividade fotográfica como
produtora de imagens e que imagens são essas”, avisa. A mostra é um
recorte de um projeto mais amplo sobre as perambulações dos fotógrafos
por Minas Gerais no século 19 chamadoItinerâncias.
Ouro Preto,
segundo afirma Arruda, tem papel importante na difusão da fotografia em
território mineiro. Os fotógrafos, depois de instalados na cidade,
começam a viajar por Minas Gerais, criando um acervo de registros ricos
em informação sobre a vida social, política, econômica, cultural e
familiar.
Pelos anúncios em jornal pode-se acompanhar as
perambulações de Francisco Manoel da Veiga por Ouro Preto e Diamantina,
cidades que, ao lado de Juiz de Fora, têm registros fotográficos ainda
no século 19. “O fotógrafo torna-se o elo entre os grandes centros e as
pequenas cidades do Brasil. Viajando, leva as ideias da modernidade para
o interior de Minas Gerais”, acrescenta o historiador.
O
interesse que a fotografia despertou fez com que houvesse uma intensa
movimentação de fotógrafos por Minas Gerais, observa o historiador. “As
imagens existentes são uma pequena parte do que foi realizado, pois
muita coisa se perdeu”, acrescenta, lembrando que a guarda correta do
material é recente. “Precisamos trabalhar para que os museus tenham
condições de receber essas coleções e cuidar delas de forma adequada.”
Arruda,
cujo livro venceu o prêmio Marc Ferrez em 2012, afirma que “ainda há
muito a conhecer sobre a fotografia no século 19 em Minas Gerais”, mesmo
que a situação da pesquisa e dos estudos sobre os primórdios da
fotografia no Brasil tenha avançado nas últimas duas décadas.
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Anúncio do fotógrafo Guilherme Liebernau em A actualidade, de Ouro Preto, em 29 de abril de 1880 |
“Temos
curadores, historiadores, bibliotecários e instituições que sabem
trabalhar com material fotográfico. O que falta é mais incentivo à
catalogação, à pesquisa, além de criar melhor infraestrutura nas
instituições para receber o material, assim como incrementar sua
divulgação”, defende. Tudo isso é necessário, na opinião do curador,
para “dar à fotografia antiga a importância que ela tem. Se não
valorizarmos, não há como preservar”. Ele observa que “as imagens trazem
a memória das cidades, da família, do Brasil. Nossa identidade e
sentido de pertencimento vêm muito desses vínculos”.
Comparando o
uso contemporâneo com o antigo da fotografia, Arruda se incomoda com o
que percebe como uma banalização da foto e seu uso muito centrado no
indivíduo. Ele identifica, junto com essa tendência, o ocaso do álbum de
família. “Apesar disso, considero positiva a democratização do acesso à
fotografia”, argumenta, lembrando que, no século 19, até pelo fato de o
Brasil ter sito até 1880 uma sociedade escravocrata, a fotografia foi
praticada por poucos.
A fotografia em Ouro Preto no século 19curadoria
de Rogério Arruda e Rodrigo Vivas. Abertura amanhã, às 20h30. Sala
Manoel da Costa Athaide, Anexo I do Museu da Inconfidência (Rua Vereador
Antônio Pereira, 33, Centro Histórico de Ouro Preto). Informações: (31)
3551-1121 ou 5233. De terça a domingo, das 10h às 18h. Até 3/5. Entrada
franca.
DOM PEDRO
A
primeira fotografia reconhecida remonta ao ano de 1826 e é atribuída ao
francês Joseph Nicéphore Niépce. Não se atribui o invento a apenas um
autor, mas a um processo de acúmulo de avanços por parte de muitas
pessoas, trabalhando, juntas ou em paralelo, ao longo de muitos anos.
Entre elas, o franco-brasileiro Antoine Hercule Romuald Florence
(1804-1833). O primeiro registro da prática da fotografia no Brasil é de
1840 e alude à chegada ao Rio de Janeiro de Louis Compte, capelão de um
navio, que faz demonstrações da daguerreotipia, processo que registrava
imagens sobre placas de cobre ou outros metais. Mostrou a novidade
inclusive para dom Pedro II, então um garoto de 15 anos, que se tornou
fã do assunto e fotógrafo.